Categoria: Historia religião teologia filosofia

  • mijar no penico

    Views: 0

    (Copiado do Rodrigo AC)
    Pensando e relatando a vida há sessenta anos
    Nasci em 1955, na aldeia onde não havia, água corrente, electricidade e muitas vezes pouca lenha para o lume.
    Tudo se poupava, os fósforos, o petróleo e as velas de estiarina.
    As casas eram pequenas e os móvéis escassos, assim como as roupas e calçado que passava de uns irmãos para os outros, assim como os livros.
    As maçãs, as peras, toda a fruta e verdura era a da estação, mas não havia carne e peixe, à parte de sardinhas, algum frango nas festas e a carne da salgadeira não se comia porque não se podia comprar.
    As pessoas compravam meio quilo de massa ou arroz, um quarteirão de azeite e dez tostões de cevada.
    Não havia, na maior parte das casas, quarto de banho, as fraldas tal como as de hoje não existiam e muita gente da minha geração foi criada com farrapos velhos até começar a andar.
    A escola era uma casa velha, para onde mais de noventa por cento dos alunos iam descalços, com roupas pouco recomendadas e muitas vezes o cabelo sem pentear e a cara cheia de moncos, a casa de banho era debaixo da vinha e das laranjeiras do Manel Pessegueiro.
    Muitas meninas não usavam cuecas (calcinhas), quando o frio era muito urinavam pelas pernas abaixo para aquecer os pés.
    Os medicamentos eram escassos, inexistentes, diria eu, por estes lados.
    Médicos? Os médico eram poucos, e a pagar, mas por aqui havia uma santa mulher, a Olivinha, que era a enfermeira, a parteira e aquela que nos curava as feridas e nos punha as injecções.
    Férias? Nada disso existia, os poucos que tinham direito a elas aproveitavam para trabalhar e fazer pequenas obras em casa para não pagar a um jornaleiro.
    Nós, desde tenra idade, eramos ensinados a trabalhar, pastar o gado, acarretar água e lenha, ir á “benda” e fazer tudo que os pais ou avós mandavam, a palavra “não”, não existia e o respeito e obediência aos mais velhos era obrigatório.
    Os professores eram venerados, mesmo que depois de umas quantas reguadas o tema não fosse interessante.
    A roupa era dividida, a do domingo e a da semana, não havia transgressões e a canalha não tinha prendas, no máximo um arroz de frango e um leite creme no dia do aniversário.
    Carro? Carros eram os dos bois para ajudarem no transporte de tudo que uma casa de lavoura necessitava e todos da familia colaboravam nos trabalhos sazonais, a vindima, a desfolhada, malhar o centeio e o feijão ou ripar a azeitona.
    Quem fazia os recados eram as crianças que como já disse eram ensinados a trabalhar desde bem pequenos.
    A gente andava a pé e ía de umas freguesias para as outras fazer as coisas necessárias.
    As mulheres, essas, ficavam prenhas e pariam quando chegava a hora, sozinhas ou com a ajuda da parteira, e neste tempo as familias tinham por norma um rancho de filhos.
    Reformas? Ai reformas! Quem conhecia esta palavra, a reforma era trabalhar até cair, não havia subsídios de parto, de malandros nem de coisa nenhuma, era trabalhar até morrer.
    Ah! E agora, agora que tudo mostra indícios de riqueza e de grandeza, em festas e banquetes, em casarios e carrões, a luxos e desperdicios obscenos, agora está tudo mal.
    Nunca o mundo viveu como agora, com direitos, bem viver, desperdiçando e gritando que não se pode viver.
    Mas fazem ideia o que é viver há 60 anos?
    Afinal só quem vem lá de trás pode avaliar a sorte de nascer neste tempo.
    (Manoella de Calheiros)
    P. S.
    Seria pedagógico ensinar às novas gerações a saber e conhecer estes caminhos, embora alguns da minha geração se neguem a admitir que mijavam no penico.
    (Via Carlos Sousa)
    Roubado a Tita Alvarez
  • Curiosidades fronteiriças: Estrada da Petisqueira

    Views: 0

    Curiosidades fronteiriças: Estrada da Petisqueira
    A Raia está cheia de pequenas curiosidades fronteiriças que costumam passar desapercebidas para quem não liga a estas coisas ou quem não repara em pequenos pormenores a não ser que seja uma pessoa viciada em fronteiras, é claro!
    É o caso da EM1039 que liga a Petisqueira à EN308 e daí a Deilão, sede da junta de freguesia, e a Bragança, capital do concelho. Esta estrada não é mais do que uma pequena estrada municipal que parece mesmo um caminho a nenhures, em uma região de lombas (não é por acaso que esta região recebe o nome de Lombada), com um pequeno planalto que em esta parte do território entra em um declive suave mas contínuo que faz com que a altitude, que no entroncamento com a EN308 é de 900 m., desça até os 690 m. já na Petisqueira.
    Segundo a antropóloga Paula Godinho, Professora na Universidade Nova de Lisboa e talvez a melhor especialista em contrabando e fronteiras da Península Ibérica, esta estrada era conhecida por «estrada das forças armadas» e foi construída no PREC (Processo Revolucionário em Curso, que decorreu entre Abril de 1974 e Novembro de 1975), já que até esse momento o único elo de ligação com o território português era um caminho que só dava para a passagem de burros. Daí a forte interacção entre esta aldeia e as aldeias vizinhas de Riomanzanas e Villarino de Manzanas, na região alistana, muito mais próximas, o que se reflecte nas tradições populares, muito semelhantes, como tem posto em relevo o estudioso das tradições transmontanas António Tiza. Um exemplo disso é a celebração conjunta da festa em honra de Nossa Senhora de Fátima com Villarino nas margens do rio Maçãs, ou os falares raianos (ou o que resta deles) da Petisqueira, dentro do chamado dialecto maçaneiro, de origem asturo-leonesa.
    Mas tem uma particularidade: uma boa parte da estrada está limitada pela fronteira de forma que podemos observar vários marcos fronteiriços ao longo da mesma e, ao lado, uns sinais de reserva de caça da Junta de Castela e Leão, já que estamos mesmo no limite com a província de Zamora, na região de Aliste. Parar nesta estrada, desligar o carro e ficar em silêncio faz com que, de repente, sintamos uma estranha solidão, uma sensação de sermos insignificantes, de estarmos mesmo sós, no meio daquelas lombas cheias de urzes, giestas e tojos, absolutamente sem árvores nenhumas, sem vermos aldeias por perto (ficam escondidinhas no fundo dos vales) e onde não há vivalma. Imaginem isso em uma manhã de Inverno, com um vento frio de rachar a passar pelo meu rosto. Eis que foi assim que eu me senti, mas em paz comigo mesmo. Afinal estava mesmo numa terra de ninguém e era possível usufruir de uma certa aura de liberdade, mesmo que fosse apenas uma ilusão, abstraindo-me do resto do mundo. Se puderem, experimentem no vosso local favorito. Vale a pena!

    in:historiasdaraia.blogspot.pt

    May be an image of road, horizon, fog and grass
    Like

    Comment
    Share

  • uma fronteira esquecida que era apenas portugal

    Views: 1

    Fronteiras: Moimenta da Raia/S. Cibrão de Hermisende
    Entrando de novo no terreno do esquecimento, lá vai uma fronteira muito pouco conhecida. Trata-se da fronteira existente entre Moimenta da Raia, freguesia e aldeia do concelho de Vinhais, e São Cibrão de Hermisende (San Ciprián, na toponímia oficial). É pouco conhecida porque de Moimenta sai apenas um caminho rural de terra batida, enquanto de S. Cibrão há um desvio pavimentado de apenas uns 200 m. até ao mesmo limite fronteiriço que parte da estrada ZA-L 2698, que liga Hermisende com Castromil, aldeia que está partida em duas partes porque uma pertence ainda à província de Zamora e a outra faz parte já da Galiza, mais exactamente da província de Ourense e do concelho de A Mezquita.

    Partindo de Hermisende, temos de atravessar a ponte da Veiga, ponte medieval situada sobre o rio Tuela, um dos dois rios, que junto com o Rabaçal formam o Tua pouco antes de chegar a Mirandela. Daí há uma subida íngreme na que S. Cibrão fica de lado, visto que temos de passar de pouco mais de 790 m. no fundo do vale até quase os 1 000 m. passando a meia encosta da Serra do Marabón, serra que separa a província de Zamora da Galiza. Daí chegamos a um planalto granítico que desce em suave declive entre os 1 100 e os 900 m., flanqueado pela Serra do Marabón e a Serra da Coroa, situando-se Moimenta da Raia a uma altitude algo inferior aos 900 m., na parte mais baixa do planalto pouco antes de chegarmos às íngremes encostas quase em arribas do vale do Tuela.

    Esta situação entre a Galiza, Leão e Portugal deu lugar a pontos como o chamado Penedo dos Três Reinos, não muito longe deste ponto fronteiriço, se bem na realidade o reino da Galiza tinha o seu limite oriental na Portela do Padornelo e as províncias do Antigo Regime mantiveram esta situação até 1833, com a reforma provincial de Javier de Burgos, que deu o território entre esta portela e a Portela da Canda, à província de Zamora. Os penedos graníticos fazem, pois, parte da paisagem deste planalto porque a sua elevada altitude faz com que abundem afloramentos rochosos e uma paisagem quase desoladora de estevas, urzes, giestas ou tojos, ou seja, grandes extensões de mato açoitados por um vento geado no Inverno e pelo calor intenso no Verão.

    Daí a importância do fumeiro na região, aquém e além fronteiras, que beneficia destas temperaturas baixas que resultam ideais para o fabrico de enchidos e, no concelho de Vinhais, da cria do porco bísaro, verdadeira iguaria e marca identificadora da região. Como muitas aldeias, esta região sofreu com intensidade a emigração, mas manteve certos usos comunitários hoje em declínio e que, infelizmente, decerto morrerão com a extinção das gerações mais velhas, dedicadas à agricultura e à pecuária, numa economia típica de subsistência.

    Do ponto de vista cultural importa salientar o facto de as relações transfronteiriças terem sido muito intensas, o que se traduziu numa mistura de traços do ponto de vista etnográfico e linguístico. As fronteiras na região realmente não foram bem delimitadas até ao Tratado de Limites de 1864. Já as Inquirições de D. Afonso III de 1258 mostravam que Portugal estava na posse da aldeia de Manzalvos e metade da aldeia de Cádavos, actualmente do concelho de A Mezquita, na Galiza. Relativamente à S. Cibrão é comummente aceite que esta aldeia junto com Hermisende e Teixeira pertenceram à coroa portuguesa até 1640, se bem Francisco Manuel Alves, Abade de Baçal e grande estudioso do distrito de Bragança, mostra que a documentação histórica não nos permite afirmar tal hipótese, sendo que talvez tenham sido perdidas ao longo do século XVI.

    Seja como for, a dominação portuguesa deixou a sua marca na língua falada na região. A mal chamada Alta Sanábria ou Sanábria galega é na realidade a região das Portelas e o galego é a língua principal de uso, para além do castelhano oficial. No entanto, nestas três aldeias de S. Cibrão, Hermisende e Teixeira há quem afirme que é falado um galego com traços portugueses ou um português em descomposição, com traços galegos. Do ponto de vista filológico, S. Cibrão pertencerá ao grupo do chamado «portelego central», tendo perdido o uso do esse sibilante sonoro, que ainda se mantém nas aldeias de Hermisende e Teixeira, do grupo do «portelego oriental». Os seus habitantes não se consideram sanabreses, mas antes porteixos.

    Em resumo, uma região de confluência de culturas que vale a pena visitar quanto mais não seja que pelas suas paisagens, o contacto com a Natureza ou o património cultural e humano. Embora o Verão seja a melhor estação para visitar, quer pelas suas melhores condições meteorológicas, quer pelo facto de haver uma vida mais animada com os emigrantes que voltam de férias e as romarias, eu gosto particularmente no Inverno, quando esse vento frio acaricia o meu rosto e sinto algo de purificador nisso, no meio do cheiro do mato e o fumo da lenha das casas lentamente queimada na lareira para aquecê-la ou até mesmo cozinhar pratos fortes e consistentes. Vai um bom cozido ou umas fatiazinhas de salpicão de porco bísaro?

    in:historiasdaraia.blogspot.pt

    May be an image of grass
    All reactions:

    27

    2 comments
    4 shares
    Like

    Comment
    Share
    View more comments
    Via Estreita

    Follow

    Nota muito importante: até à Restauração de 1640, São Cibrão, Ermisende e Teixeira ERAM parte do Reino de Portugal.
    Aconteceu que, tal como em outra medida à cidade de Ceuta, permaneceram unidas à coroa de Espanha.
    Daí o seu dialecto único com raiz portuguesa.
  • para sufocar revoltas

    Views: 0

    • 1956, o filósofo judeu alemão Günther Anders escreveu esta reflexão: ′′Para sufocar antecipadamente qualquer revolta, não deve ser feito de forma violenta. Métodos arcaicos como os de Hitler estão claramente ultrapassados. Basta criar um condicionamento coletivo tão poderoso que a própria ideia de revolta já nem virá à mente dos homens. O ideal seria formatar os indivíduos desde o nascimento limitando suas habilidades biológicas inatas… Em seguida, o acondicionamento continuará reduzindo drasticamente o nível e a qualidade da educação, reduzindo-a para uma forma de inserção profissional. Um indivíduo inculto tem apenas um horizonte de pensamento limitado e quanto mais seu pensamento está limitado a preocupações materiais, medíocres, menos ele pode se revoltar. É necessário que o acesso ao conhecimento se torne cada vez mais difícil e elitista….. que o fosso se cave entre o povo e a ciência, que a informação dirigida ao público em geral seja anestesiada de conteúdo subversivo. Especialmente sem filosofia. Mais uma vez, há que usar persuasão e não violência direta: transmitir-se-á maciçamente, através da televisão, entretenimento imbecil, bajulando sempre o emocional, o instintivo. Vamos ocupar as mentes com o que é fútil e lúdico. É bom com conversa fiada e música incessante, evitar que a mente se interrogue, pense, reflita. Vamos colocar a sexualidade na primeira fila dos interesses humanos. Como anestesia social, não há nada melhor. Geralmente, vamos banir a seriedade da existência, virar escárnio tudo o que tem um valor elevado, manter uma constante apologia à leveza; de modo que a euforia da publicidade, do consumo se tornem o padrão da felicidade humana e o modelo da liberdade. Assim, o condicionamento produzirá tal integração, que o único medo (que será necessário manter) será o de ser excluído do sistema e, portanto, de não poder mais acessar as condições materiais necessárias para a felicidade. O homem em massa, assim produzido, deve ser tratado como o que é: um produto, um bezerro, e deve ser vigiado como deve ser um rebanho. Tudo o que permite adormecer sua lucidez, sua mente crítica é socialmente boa, o que arriscaria despertá-la deve ser combatido, ridicularizado, sufocado… Qualquer doutrina que ponha em causa o sistema deve ser designada como subversiva e terrorista e, em seguida, aqueles que a apoiam devem ser tratados como tal ′′ Günther Anders – ′′ A obsolescência do homem ′′ 1956″. Creio que isto responde ao problema

      Visualizado por Lucia Simas: 10:40.
  • meu favorito na década de 1960(?) MICHEL VALLIANT

    Views: 0

    sa+ia ao domingo no primeiro de janeior, suplemento creio qiue nos anos 60 ou ainda antes..

    A TAP em grande destaque no livro “Michel Vaillant, Rali em Portugal”, de Jean Graton.
    O Boeing 727 da primeira imagem sobrevoa o Castelo de São Jorge no que parece ser uma aproximação visual à “falecida” pista 36 do Aeroporto de Lisboa. Depois “pousa com grande suavidade”. Seria eu? Vá lá, digam que sim. Finalmente vê-se também um Caravelle a ser abastecido por um carro de serviço da também já “falecida” SACOR.
    No final da década de 60 e princípios de 70 o Grupo Cultural e Desportivo da TAP organizava o Rali Internacional TAP que mais tarde viria a ganhar por cinco vezes o título de Melhor Rali do Mundo embora com o nome alterado para Rali de Portugal após o 25 de Abril de 1974.
    Neste número Michel Vaillant vai participar no Rali TAP e viver mais algumas emocionantes aventuras.
    A série Michel Vaillant era editada em Portugal pela Livraria Bertrand. Pode ser que ainda lá encontrem este exemplar

    All reactions:

    Chrys Chrystello

  • Edição crítica de “Os Lusíadas” prova que original teve contrafação e esclarece dúvida com séculos – Expresso

    Views: 1

    Uma investigadora portuguesa está a realizar aquela que será a primeira edição critica completa da obra camoniana alguma vez feita. Algumas das primeiras conclusões são surpreendentes

    Source: Edição crítica de “Os Lusíadas” prova que original teve contrafação e esclarece dúvida com séculos – Expresso

  • PORTUGAL – TV EM 1954

    Views: 0

    May be an image of 3 people and text that says "Em 1954, em Portugal, só existia televisão na Terceira."
    • Like

    • Reply
    José Calçada

    Fisicamente, sim — mas nada mais do que isso. Era uma emissão do sector americano da Base das Lajes, com um alcance territorial muito limitado. Nunca se poderia afirmar que a Terceira tinha televisão… …
    Active
    João Silveira

    José Calçada É verdade. Morava (e moro) em S. Bento e não ouvíamos falar. Também elecricidade… era poer um canudo.