Marcel Francois Raphael Homet (Rochefort-sur-Mer, 23 março 1897 – 1982) foi um incansável arqueólogo, autêntico trota-mundos que tentou desvendar mitos universais de todas as latitudes e culturas, do Brasil à África, das Américas à Índia. Participou de expedições científicas durante 30 anos em nome da École d’Anthropologie da Universidade de Paris. Conheceu e mediu os vestígios culturais da Ilha de Páscoa, dos povos andinos, das pirâmides mexicanas, dos assentamentos de pedra da Noruega à Espanha, de Malta, das pedras gigantes de Baalbek e Marib, das pirâmides de Gizé. Egito, os templos do Japão e os segredos do Pacífico Sul. As suas espetaculares viagens de investigação rapidamente o tornaram conhecido, assim como o seu compromisso social contra a exploração e a opressão dos povos ameaçados. Nos seus mais de 20 livros, publicados entre 1934 e 1978, este investigador e cosmopolita tentou desde o início “ver e apresentar todas as principais culturas globais a partir da perspetiva de um parentesco intelectual abrangente”. As suas obras, entre as quais “Os Filhos do Sol” (1958/1972), “Umbigo do Mundo – Berço da Humanidade” (1976), “Nas Pegadas dos Deuses Sol” (1978). ) e “Deserto – Selva – Gente Azul (1974/92), apareceram em todas as principais línguas e países do mundo.
Este homem, incansável prospetor do nosso passado comum, esteve também na então Guiné Portuguesa, mais concretamente no arquipélago dos Bijagós, entre 1937 e 1938. Numa das suas ilhas, a de Orango, hoje transformada em parque nacional que tenta preservar a cultura, funa, flora e costumes locais. Então, nessa época, dealbar da Segunda Grande Guerra Mundial, arqueólogo encontrou traços materiais de um templo e inerentes elementos cultuais que ele identificou com uma herança mediterrânica – egípcio/fenícia. Demos-lhe a palavra – ou melhor do texto que Marcel Homet publicou no # 100, do ano de 1942, da revista O Instituto, de Coimbra, austera e supina publicação da Cultura portuguesa dominante da época:
“Esta civilização corrompeu-se, porque noite e dia sobre a pedra central, as vestais vigiam a chama sagrada, se os assentos que se vêem no desenho de um deles ( Quadro#7) são de uma feitura extraordinária, os reis entretanto enterrados nesta necrópole foram, ao que parece, cuidadosamente deitados sobre os joelhos de crianças vivas, enterradas com eles, sendo estes derradeiros ritos de facto negróides.
Tudo isto é muito curioso mas teria sido essencial abrir esses túmulos para verificar a realidade dos factos, para descobrir aí, eventualmente, armas ou objetos de culto, porquanto não temos nada a aprender da voz dos feiticeiros que se recusaram a dizer o que quer que fosse. Facto extremamente curioso, estes mesmos desenhos decoram igualmente as paredes de algumas caixas sagradas dos Bijagós. Trata-se (Quadro#4) de um desenho de uma galera egípcia e (Quadro#9) deste enterramento que pudemos estudar no Alto Egito e que reencontrámos ativo nos Floups (guerreiros da Guiné Portuguesa (Quadro#).
Além do mais o dançarino atual (Quadro#5), o perfil de uma menina (Quadro#6) confirmam que nesta ilha e em todas as outras do Bijagós, existem estas memórias de uma velha civilização, mas que danças como as do touro (5) e dos funerais como as do #9, assemelham-se muito às cerimónias de origem grega que remontam ao III século antes da nossa era e indo até ao III século d. C. que podemos encontrar no Egito e em particular no túmulo do sacerdote Petosiris perto da povoação de Dalga. Ora, nessa época, a Esfinge à grega bem como o sacrifício com os chifres do touro eram nitidamente um ritual helénico.
Por um lado, tanto a civilização helénica da época, como a dos fenícios e egeus utilizavam ritos sangrentos onde o touro e os seus cornos tinham um papel destacado. Ora, a sexta das sete etapas que Hannon, o libiofenício, teve de percorrer antes de terminar a sua expedição, parou na ilha de Harang onde Vivien de Saint Martin e André Berthelot, entre outros, viam Orango, a ilha mais a oeste do arquipélago dos Bijagós.
Ora, havia sido acordado pelos Cartagineses que Hannon navegasse para além das colunas de Hércules e fundasse cidades líbio-fenícias. Ele navegou com 60 navios de 50 remos, com uma multidão de 30 mil homens e mulheres, e muitas bagagens. Foi assim que o Périplo de Hannon, rei dos Cartagineses foi comentado pelo seu editor Muller ( Geographi Greci i Paris 1853 p. xviii à xxxiii dos Prolegómena, p. 1 a 14 do texto e tradução latina). Porque o chamado “Sufoco do Mar” tinha deixado Cartago com a intenção bem determinada de fundar nas costas do Oceano Atlântico entrepostos comerciais que dessem vantagens ao seu país. Foi no século V antes de Cristo e o mundo mediterrânico encontrava-se ainda sob a paz humilhante imposta por Roma e assinada em 509 entre a metrópole da África do Norte e a da Itália. Dois mil anos antes dos portugueses instaurarem em definitivo a sua enaltecida talassocracia marítima….
As vicissitudes da política europeia impediram Marcel Homet de proceder a escavações no local da descoberta, mau grado o seu pedido ao governo português. Mas os tempos (turbulentos) eram outros e a arqueologia não era a principal preocupação dos políticos de então.
Questão: restará hoje algum traço, uma pista material ou memória etnográfica que possa levar à redescoberta do alegado templo reivindicado por Homet? O Parque Nacional de Orango terá recenseado algo que possa documentar este passado fantástico das populações da atual Guiné-Bissau?
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