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Aqui vai este relato do carnaval de 1909. Como o artigo era demasiado grande para o enviar no formato original resolvi copiá-lo mas a versão é integral. É interessante notar-se que há referência às modinhas do continente (as chamadas modas novas) o que põe de lado a teoria de estas terem sido introduzidas pelos deportados políticos.
CARNAVAL I
( “O Graciosense” – nº 249 – 28 de Fevereiro de 1909 )
Correu desanimado este ano o carnaval na rua, especialmente nesta vila, onde não houve jogo de entrudo nem se viu uma única máscara durante os dias. As soirées animadíssimas, acabando quase sempre de manhã, deram conta das entrudadas a farinha e água, das cavalhadas, das alegorias, etc.
Na Praia organizou-se uma grande mascarada em que entraram umas 14 meninas vestidas com muito gosto. O cortejo que se compunha de 7 carros e alguns cavaleiros, percorreu na tarde de 3ª feira as freguesias da Praia e Luz.
No Sul houve grande entusiasmo em mascaradas e bailes populares.
OS BAILES
O Club 1º de Dezembro, deu 5 bailes, sendo todos muito concorridos e animados, mas com especialidade o da terça feira foi um verdadeiro encanto.
As danças variadas e animadíssimas eram apenas interrompidas de hora a hora para serem servidos doces, chá, porto e licores.
Com especialidade das 2 horas às 7 da manhã, a animação e alegria foram extraordinárias, feéricas, enchendo toda a assistência de um bom humor e bem estar que vivificava.
Nalgumas das modinhas populares do continente, muito em voga entre nós, e que entremeavam as quadrilhas, lanceiros, polcas, mazurcas, valsas, etc., chegaram a entrar 30 senhoras, das quais algumas cantavam com graça, boa voz e muito gosto.
As gentis meninas Guadalupe, Esmeralda e Ester, respectivamente filhas dos nossos amigos senhores António da Cunha Silveira e Manuel da Silva Barbosa, recitaram poesias.
Mr. Philippe Lappeman, distinto cavalheiro Belga, de visita nesta ilha, cantou muitíssimo bem alguns trechos de óperas.
Na 4ª feira às 7 horas da manhã um grande número de senhoras e cavalheiros fizeram-se fotografar em grupo no jardim do Club.
Depois disto dançou-se com grande entrain a última quadrilha que terminou às 8 horas.
No 1º baile tocou quase sempre ao piano a exmª senhora D. Matilde Magalhães que gentilmente a isso se prestou, por o pianista contratado, um originalíssimo ratão que por aí apareceu há meses, dizendo vir de Lisboa e ser aluno laureado do conservatório, se fingir doente para não dar a perceber que pode muito bem saber fazer barbas ou bater sola, mas que de piano e música nada percebe.
É um triste Gato de Botas que por aí anda, tornando-se divertido com as suas inofensivas intrujices a ver se apanha alguns patacos para passar a vidinha.
No 2º dia de baile ainda ele se apresentou, e não houve remédio se não sentar-se ao piano, mas com a declaração de que só tocaria quadrilhas carnavalescas à moda de Lisboa!!!
E realmente assim foi. Os gritos desordenados do pobre piano foi tudo o que se deu de mais carnavalesco, como as caretas horríveis que fazia o pateta enquanto batia desordenada e estupidamente no teclado.
Foi tal a risota provocada por aquela música diabólica, que o homem, percebendo-se apanhado, fugiu sem capa nem chapéu, e até hoje ninguém mais o viu!
Nas outras soirées tocou ao piano a distinta pianista D. Rosália Ramalho, sendo alvo de grandes manifestações de simpatia, como bem as merece.
No salão da sociedade Filarmónica Liberdade houve também 5 soirées muito concorridas e animadas. Tocou a orquestra da sociedade.
O Club Progressista deu os bailes do costume, tocando ao piano o simpático jorgense sr. José Moniz de Lacerda.
Os salões de baile foram durante as noites constantemente visitados por grupos de mascarados, alguns muito bem vestidos e espirituosos, cumprindo-nos especializar o nosso amigo sr. Manuel Inácio de Barcelos, na 2ª feira, que apresentou um originalíssimo tipo de fidalga antiga, natural de Faiões e Senhora de Odivelas…uma magnífica D. Zelia Zarapata de Arraiolos.
5 comments
- Carlos T C BettencourtMuito interessante, verdadeira festa, com nível e animação, mesmo sem as máscaras !Já nesse tempo apareciam os arrivistas, uns sérios e com nível, outros os charlatões habituais. Abraço
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- 31 m
- Ondina DuarteMuito interessante.Gosto muito de saber coisas do passado.A minha Avo Materna contava-me muitas coisas sobre as dancas antigas.Obrigada
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- 16 m
- Andrea MeloMuito bom!
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- 16 m
- Marisa PereiraIsto é espantoso! Onde se situavam os clubes mencionados?
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- 4 m
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- Alcinda LealEsses clubes aqui referidos são os de hoje, com nomes diferentes? Ou extinguiram-se e os actuais surgiram mais tarde?É um relato muito interessante que nos dá a conhecer um Carnaval com festejos diferentes. Obrigada por nos informar. Beijinho
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