Autor: CHRYS CHRYSTELLO

  • evanildo bechara FONTES DA REFORMA ORTOGRÁFICA,

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    JORNAL O DIA: FONTES DA REFORMA ORTOGRÁFICA,
    Rio domingo, 24 de julho de 2011– Temos recebido de vários leitores uma pergunta muito oportuna neste período em que se intensificam entre portugueses críticas ao novo Acordo Ortográfico: por que os portugueses rejeitam tão veementemente aquilo que seu representante legal se comprometeu a adotar?
    As críticas dos portugueses chegam a apelar, nos sucessivos abaixo-assinados às autoridades governamentais competentes, para que se revogue o compromisso de implantação do sistema ortográfico aprovado pelos sete países de língua oficial portuguesa.
    A indagação é oportuna nesta coluna, porque, no meio da gritaria, quase sempre não aparecem razões de ordem técnica que invalidem as Bases em que se assentam as normas do novo sistema. Já em 1911, depois de aprovada a reforma ortográfica elaborada pelos melhores filólogos que Portugal tinha à época, confessava D. Carolina Michaëlis de Vasconcelos:
    ‘O público! Qual foi o acolhimento que fez à Reforma? Naturalmente as opiniões estão divididas. Houve e há entusiastas, críticos, indiferentes e adversários. Reacionários rombos, avessos a todo e qualquer progresso, aos quais as quarenta e tantas regras mostraram, pela primeira vez, quantas e quais são as dificuldades da ortografia nacional, entendem que fomos nós que as inventamos, baralhando e complicando tudo. Constou mesmo que esses descontentes iam angariar assinaturas a fim de reclamar a revogação da portaria de 1 de setembro [DE 1911].
    Podemos começar a dizer que as novas normas não são tão novas para os portugueses, porque em geral ratificam usos que já vêm praticados desde 1945, ou antes, portanto há mais de meio século. Os pontos de que se afasta a nova proposta de 1990 praticamente dizem respeito a questões mal resolvidas pelo sistema de 1945, e que também se tornam mal resolvidas pelo sistema vigente no Brasil desde 1943. Dentre essas questões cumpre ressaltar o emprego do hífen. Bem ou mal, os redatores do texto oficial, sem se afastar muito das normas de 1945 na sua redação, nos seus exemplos e até nas suas exceções, procuraram sistematizar melhor o que foi possível, numa área da ortografia que se mostra muito sutil quando os fundamentos se baseiam no desvanecimento da noção da composição, na evolução semântica, na aderência de sentido, no sentimento do falante ou na perda em certa medida da noção de composição. O espaço limitado desta coluna não nos permite aprofundar nossa pesquisa para demonstrar os íntimos laços que aproximam as Bases do Acordo de 1990 ao Formulário Ortográfico de 1945.
    Vamos nos limitar a apontar as principais alterações gráficas nas regras de acentuação a serem adotadas pelos brasileiros, regras que já vinham do sistema ortográfico de 1945, com as alterações levadas a efeito por lá em 1975, praticadas, portanto, pelos portugueses e africanos:
    1) desaparece o circunflexo de ‘voo, enjoo, perdoo’, etc.;
    2) desaparece o circunflexo de ‘creem, leem, deem, veem’;
    3) desaparece o acento gráfico agudo dos ditongos abertos ‘oi’ e ‘ei’ dos paroxítonos (‘heroico’, sem acento, mas ‘herói’ com acento; ‘ideia’, sem acento, mas ‘réis’ com acento);
    4) desaparece o acento gráfico agudo das vogais ‘i’ e ‘u’ da sílaba tônica de paroxítonos quando procedidas de ditongo decrescente (‘feiura’, ‘baiuca’);
    5) desaparece o acento gráfico tônico do hiato ‘ii’ dos paroxítonos (‘xiita’, ‘tapiira’);
    6) desaparece o uso do trema;
    7) desaparece o acento diferencial, exceto em ‘pôde’ e ‘pôr’.
    Neste particular, a única cedência do lado português relativa ao sistema de 1945 será o desaparecimento das consoantes não pronunciadas ‘c’ e ‘p’ para indicar o timbre aberto da vogal anterior, ou por força da etimologia, ou ainda por força da tradição ortográfica: ‘diretor’, ‘Egito’. Reforma que haverá de agradar às criancinhas portuguesas que começam a escrever.
    Cremos que estas cedências brasileiras de seus hábitos ortográficos bem demonstram o desejo firme de colaborar para a unificação tão almejada por todos os que sonham que nossa escrita reflita a maturidade cultural e política tão necessária à divulgação e ilustração do idioma compartilhado por tantos países soberanos.
  • Germano de Almeida

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    in diálogos lusófonos

    NOS KU NOS Diáspora A SEMANA : Primeiro diário caboverdiano em linha
    “Para o escritor e advogado Germano  de  Almeida, a questão de cada país ter uma forma diferente de falar o português não é o mais importante desde que se consiga manter uma escrita comum, para facilitar a comunicação. “
    Germano  de  Almeida defende ensino do português como língua estrangeira
     
    O escritor caboverdeano Germano de Almeida defende o ensino do português como língua estrangeira, uma vez que entende que a língua corre perigo, ao contrário do crioulo. O escritor cabo-verdiano considera que a língua oficial não é falada correctamente, apesar de ser o instrumento que mantém o povo cabo-verdiano em contacto com outros países. Germano de Almeida, em entrevista à Lusa, afirmou que no arquipélago há a ideia de que a população é bilingue, “o que não corresponde a verdade”. “O que vejo em Cabo Verde é uma defesa desmesurada do crioulo, quando o crioulo não está em risco e o crioulo limita-nos, fecha-nos sobre nós próprios”.
    “Portugal, Brasil, Angola não precisam de contactar connosco, nós é que precisamos de contactar com eles, então o português para os cabo-verdianos é essencial. Os cabo-verdianos não são bilingues e por isso precisamos começar a ensinar o português como língua estrangeira”, prosseguiu.
    O escritor recordou que já foi feito no arquipélago uma experiência piloto de ensino do português como língua estrangeira “com excelentes resultados”. Por isso, defende que esta experiência devia ser alargada a todo o ensino, porque, apesar de os cabo-verdianos se fazerem entender em português, “não o falam correctamente”.
    “Não podemos pensar que o cabo-verdiano fala o português desde criança, porque não fala. Vemos alunos que terminam o décimo segundo ano e falam mal o português. Há professores que também não sabem falar português, portanto, só podemos concluir que o ensino está a falhar”, declarou.
    Para o escritor e advogado, a questão de cada país ter uma forma diferente de falar o português não é o mais importante desde que se consiga manter uma escrita comum, para facilitar a comunicação. “Eu prefiro saber que os oito países que usam o português como língua oficial escrevem mais ou menos da mesma maneira, temos a mesma ortografia. Neste sentido estou de acordo com o acordo ortográfico”, finalizou.
    O futuro da língua portuguesa esteve em debate numa conferência internacional em Brasília , 2010.
    http://www.asemana.publ.cv/spip.php?article51333&var_recherche=Germano%20Almeida&ak=1
  • DEBATE DO MANIFESTO AICL 2012)

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    TEMAS 17º COLÓQUIO ABRIL 2012 LAGOA

    1. LUSOFONIA, LITERATURA, ENSINO, FORMAÇÃO, GEOGRAFIA HUMANA E A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO.

    Subtemas
    1.1. A (defesa e preservação da) LÍNGUA PORTUGUESA EM TEMPO DE CRISE qualquer que seja o país ou região onde haja LUSOFALANTES (DEBATE DO MANIFESTO AICL 2012)
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    DEBATE DO MANIFESTO AICL 2012

     

    Os colóquios da lusofonia criados em 2001 passaram a associação cultural e cientifica sem fins lucrativos em 1 de janeiro de 2011, pretendemos continuar a aproximar povos e culturas no seio da grande nação dos lusofalantes, independentemente da sua nacionalidade, naturalidade ou ponto de residência, todos unidos pela mesma língua.
    Em poucos anos os Colóquios já se afirmaram (sem custos para o Ministério da Cultura, Instituto Camões e outras entidades) como a única realização regular, concreta e relevante em Portugal sobre esta temática, sendo totalmente independentes de quaisquer forças políticas ou institucionais. Asseguram essa sua “independência” e sobrevivência através do pagamento das inscrições dos participantes e apoios protocolados especificamente para cada evento que é concebido e levado a cabo por uma rede organizativa de voluntários. Esta independência permite a participação de um leque alargado de oradores, sem temores nem medo de represálias dos patrocinadores institucionais sejam eles governos, universidades ou meros agentes económicos. Ao nível logístico, temos o apoio das autarquias locais que decidem apostar na divulgação e realização deste importante evento. Debatem-se as problemáticas da língua portuguesa, em articulação com outras comunidades como agentes fundamentais de mudança. Apesar do caráter vincadamente independente dos Colóquios, temos estabelecido parcerias e protocolos que nos permitam embarcar em projetos mais ambiciosos e com a necessária validação científica.
    Em Portugal não há uma política de língua. Enquanto as Letras se mantiverem subalternas como mera Secção da Academia das Ciências é imperioso que esta seja mais atuante na defesa da língua e das suas variantes face aos desafios que os políticos não conseguem afrontar. A vetusta Academia tem de ser pró-ativa em vez de reativa. O futuro e a preservação da língua não se compadecem com esperas nem vivem de glórias passadas. Portugal está irremediavelmente atrasado. Não pode esperar mais. Por isso sonhámos ainda hoje com a criação de uma Academia das Letras, uma Academia da Língua, independente, sem sujeições a projetos estatais ou outros.
    Desde 2009 que temos a nossa Homenagem Contra O Esquecimento, que começou então, entre outros, com Carolina Michaёllis, Leite De Vasconcellos, Euclides Da Cunha, Agostinho Da Silva, Rosália De Castro. Em 2010 criámos um Caderno de Estudos e Literatura de matriz açoriana estando já disponíveis 14 edições, vários suplementos e vídeo-homenagens a autores açorianos que servem não apenas de iniciação para aqueles que querem ler autores açorianos mas também de suporte ao curso AÇORIANIDADES E INSULARIDADES que temos na Universidade do Minho.
    Apoiamos os Seminários de Lexicologia da AGLP para mostrar o nosso continuado apoio à novel academia numa época conturbada relativamente à situação da língua portuguesa na Galiza. É de extrema importância manter estes vínculos ativos entre as organizações. Em 2010 e 2011 mantivemos a homenagem contra o Esquecimento que incluiu nomes como Vasco Pereira da Costa, Cristóvão de Aguiar, Dias de Melo, e Daniel de Sá. Igualmente começámos a fazer Sessões de Esclarecimento em liceus e universidades e Sessões de Poesia sendo a mais memorável aquela onde se declamaram poemas de Vasco Pereira da Costa incluindo uma vídeo homenagem ao autor e a declamação ao vivo do seu poema “Ode ao Boeing 747”, lida em 11 das 14 línguas para que foi traduzido pelos Colóquios (Alemão, Árabe, Búlgaro, Catalão, Castelhano, Chinês, Flamengo, Francês, Inglês, Italiano, Neerlandês, Polaco, Romeno, Russo). Estamos a traduzir autores em sete línguas (Búlgaro, Romeno, Italiano, Russo, Francês, Polaco e Esloveno) e continuamos a lutar pela imediata inclusão da ACADEMIA GALEGA DA LÍNGUA PORTUGUESA na CPLP com o estatuto de observador. Trabalhamos na compilação de uma Lexicopédia Contrastiva da língua Portuguesa e disponibilizámos em linha as publicações de trabalhos das Atas/Anais, na nossa página. Depois de irmos a Santa Catarina, Brasil em 2010 em 2011 fomos a Macau e à ilha de Santa Maria, onde se lançou a Antologia (Bilingue) de Autores Açorianos Contemporâneos enquanto a AGLP disponibilizava os seus meios técnicos para a página oficial da AICL, numa nova plataforma. Iniciaram-se contactos para a edição no Brasil dos autores açorianos apoiados pelos Colóquios (Daniel de Sá, Eduardo Bettencourt Pinto e Vasco Pereira da Costa, entre outros). e fez-se uma proposta ao município de Vila do Porto (mas que se pretende extensivo a todas as nove ilhas) para a criação de ROTEIROS CULTURAIS como aquele que experimentalmente ali fizemos no ano passado, antes de regressarmos como filhos pródigos a esta casa paterna da Lagoa.
    Gostava de vos dizer que, em minha opinião, a crise do país é mais do que tudo uma crise de ideias, de líderes, de pensadores e intelectuais, aliada ao capitalismo selvagem, dito neoliberalismo, que desde os anos 90 vem tomando dos meios de produção globais e manipulando os governos do mundo ocidental.
    O país precisa de mais de se servir dos seus “sages” para usar um termo francês em vez do mais habitual pensadores ou filósofos que não incluiria todos os que pretendo incluir. Um conselho de sábios, por assim dizer seria aquilo que o país necessita para vencer a crise e sairmos da podridão da partidarite viciada em cunhas, nepotismo e esquemas. Teríamos depois, de estabelecer consensos alargados e um plano de mudança e ação a muito longo prazo e buscar a força e iniciativa dos mais jovens para as levar a cabo.
    Não devemos deixar que Portugal se perca na sua atual insignificância quando grande parte da sua história foi feita de grandes homens que se sobrepuseram, pela sua visão, a gerações de séculos de Velhos do Restelo. São estes que hoje guiam os nossos filhos e netos para uma subserviência e dependência total ao grande capital internacional sem esperanças de uma vida melhor. Trata-se de um retrocesso ao pior da Grande Revolução Industrial ou rumo a uma criação de novos servos da gleba, automatizados, controlados e vigiados, mas sobretudo intelectualmente deficientes.
    A receita universalmente seguida é a da ignorância, em que quase todos hoje vivem, aliviada com um voyeurismo exacerbado em Big Brother e quejandos, e outras telenovelas da vida real que a TV projeta incessantemente nas horas poucas de lazer. Acrescentemos a esta fórmula mágica o entorpecimento futebolístico que ajuda a exacerbar paixões e ventilar frustrações recalcadas e temos o caldo mágico para as gerações futuras.
    Um sistema educacional e cultural forte seria a base para partirmos para o futuro em que ainda acreditamos. Temos alguns exemplos de gente excecional, mas infelizmente a grande maioria emigrou e faz carreira no estrangeiro porque este país só apoia a mediocridade. Tratou-se de alunos que se não contentaram com a mediocridade do ensino e brilharam sem se deixarem enredar na modorra anquilosante dos que os governam. É esta situação de exceção que nos traz algumas esperanças. A minha geração e, antes dela, a dos nossos patronos foi criada na certeza de que nada era fácil nem havia almoços grátis. Havia trabalho, muito e mal pago, e a réstia de esperança de que este fosse reconhecido pois todas as promoções eram a pulso na longa escalada que encetámos. Assim, essa geração subiu a novos patamares à custa de trabalho, esforço, estudo e aprendizagem contínua. Tínhamos coisas sagradas a que chamávamos princípios e ética. Líamos, debatíamos, estudávamos e continuávamos a aprender toda a vida. Nada era fácil. Hoje constata-se o que foi feito nas últimas duas décadas para destruir o tecido escolar, com a facilitação extrema apenas para falsificar estatísticas, programas especialmente elaborados para ninguém ficar para trás, uma redução substancial da quantidade e conteúdo de matérias a aprender, o lento esquecimento a que a História foi votada porque os nossos antepassados eram politicamente incorretos, a marginalização da Filosofia porque poderia levar os jovens a pensar e os maus tratos dados à Língua Portuguesa. Temos hoje uma vasta gama de professores incultos, e a maioria dos alunos analfabetos funcionais incapazes de compreender ou debater o que leem. Os autores que estudamos foram substituídos para que hoje fosse quase impossível criar uma geração filológica-linguística como a do Cenáculo ou até mesmo compreender esse fenomenal, extraordinária e inexplicável centro de espírito e de estudo, de fantasia, de ideias numa sociedade banal como era a de Lisboa naquela época. O Cenáculo era uma reunião permanente de jovens em casa de Antero, dia e noite, todos tinham ali os seus melhores livros, notas, provisões de princípios e de tabaco. Cada um deles possuía conhecimentos profundos sobre, pelo menos, uma das ciências base que são a matriz do conhecimento: física, química, matemáticas, filosofia, direito, história e linguística. Quando Antero regressa do estrangeiro pleno de ideias e leituras novas é como que a vinda do Rei Artur à Corte de Camelot e daí nasceram as Conferências do Casino, cheias de cultura europeia, de fervor revolucionário, da romanesca efervescência intelectual e sentimental. Essa geração de jovens tentou trazer algo de novo e bom à nossa cultura, debatendo o Estado da Nação. As Conferências do Casino podem considerar-se um manifesto de geração. Perdoem esta curta digressão para vos explicar o que pretendo. Denominam-se assim por terem tido lugar numa sala alugada do Casino Lisbonense e foram uma série de cinco palestras realizadas em Lisboa no ano de 1871 pelo grupo do Cenáculo formado, por sua vez, pelas mesmas pessoas, que constituem a Geração de 70. Antero é o grande impulsionador desde 1868, iniciando os outros membros do grupo em Proudhon. A 18 de maio 1871 foi divulgado o manifesto, já anteriormente distribuído em prospetos, e que foi assinado pelos doze nomes que tinham intenções organizadoras destas Conferências Democráticas.
    22 de maio[Lince1] de 1871
    A 1ª Conferência: “O Espírito das Conferências”, proferida por Antero de Quental consistiu num desenvolvimento do programa previamente apresentado. Antero referiu-se à ignorância e indiferença que caracterizava a sociedade portuguesa, falando da repulsa do povo português pelas ideias novas e na missão de que eram incumbidos os “grandes espíritos” e que consistia na preparação das consciências e inteligências para o progresso das sociedades e resultados da ciência. Para Antero o ponto fulcral seria a Revolução, o seu conceito, que define como um conceito nobre e elevado. A conclusão da palestra termina com o apelo às “almas de boa vontade” para meditarem nos problemas que iriam ser apresentados e para as suas possíveis soluções.
    27 de maio de 1871
    2ª Conferência: “Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos últimos três séculos” também proferida por Antero. Em primeiro lugar Antero julga a História, como uma entidade, o juízo moral, social e político. Em seguida enumera e discute as causas da decadência. Aponta o Absolutismo, a Monarquia Absoluta que constituía a “ruína das liberdades sociais”, o centralismo imperialista que coartara as liberdades nacionais, rumo a uma cega submissão; por fim, o desenvolvimento de hábitos prejudiciais de grandeza e ociosidade que conduziram ao esvaziamento de população de uma nação pequena, substituindo o trabalho agrícola pela procura incerta de riqueza, a disciplina pelo risco, o trabalho pela aventura. Para Antero a solução destes problemas seria:
    ” (…) a ardente afirmação da alma nova, a consciência livre, (…), a filosofia, a ciência, e a crença no progresso, na renovação incessante da humanidade pelos recursos inesgotáveis do seu pensamento, sempre inspirado. (…) a federação republicana de todos os grupos autonómicos, de todas as vontades soberanas, alargando e renovando a vida municipal (…) à inércia industrial oponhamos a iniciativa do trabalho livre, a indústria do povo, pelo povo, e para o povo, não dirigida e protegida pelo Estado, mas espontânea (…), organizada de uma maneira solidária e equitativa…”[1] A conclusão insere uma dimensão progressista, a instauração de uma revolução, a ação pacífica, a crença no progresso inspirado na moralização social (Proudhon), num tom idealista e retórico.
    5 de junho de 1871
    3ª Conferência: “A Literatura Portuguesa” proferida por Augusto Soromenho, professor do Curso Superior de Letras que faz uma crítica aos valores da literatura nacional. Cita a negação sistemática dos valores literários nacionais, excetuando escritores como Luís de Camões, Gil Vicente e poucos mais. Tem a sua vertente revolucionária ao inculcar a ideia de que a literatura portuguesa deverá ter caráter nacional mas pautada por valores universais. O modelo e guia desta renovação salvadora da literatura nacional seria Chateaubriand, com o conceito de Belo absoluto como ideal da literatura, constituindo esta um retrato da Humanidade na sua totalidade.
    12 de junho de 1871[2]
    4ª Conferência: “A Literatura Nova ou o Realismo como Nova Expressão de Arte” por Eça de Queirós salientou a necessidade de se operar uma revolução na literatura. A revolução é um facto permanente, porque manifestação concreta da lei natural de transformação constante, e uma teoria jurídica, pois obedece a um ideal, a uma ideia. É uma influência proudhoniana. O espírito revolucionário tem tendência a invadir todas as sociedades modernas, afirmando-se nas áreas científica, política e social. A revolução constitui uma forma, um mecanismo, um sistema, que também se preocupa com o princípio estético. O espírito da revolução procura o verdadeiro na ciência, o justo na consciência e o belo na arte. A arte, nas sociedades, encontra-se ligada ao seu progresso e decadência e o artista sob a influência do meio, dos costumes do tempo, do estado dos espíritos, do movimento geral… Foca ainda as relações da literatura, da moral e da sociedade. A arte deve visar um fim moral, auxiliando o desenvolvimento da ideia de justiça nas sociedades. Fazendo a crítica dos temperamentos e dos costumes, a arte auxilia a ciência e a consciência.
    19 de junho de 1871
    5ª Conferência: “A Questão do Ensino” proferida por Adolfo Coelho traça o quadro desolador do ensino em Portugal, mesmo o superior, através da História. A solução proposta passa por uma mais ampla liberdade de consciência. Para Adolfo Coelho do Estado nada havia a esperar. Tomando isto em consideração, o remédio seria apelar para a iniciativa privada, para que esta difundisse o verdadeiro espírito científico, o único que beneficiaria o ensino.
    26 de junho de 1871
    Quando Salomão Saragga se preparava para realizar a sua Conferência “História Crítica de Jesus”, o Governo, mandou encerrar a sala do Casino Lisbonense e proibir as Conferências. No mesmo dia Antero redige um protesto no café Central, hoje Livraria Sá da Costa.
    Vivemos hoje uma encruzilhada como a da Geração de 1870 e das Conferências do Casino, sendo a enumeração de problemas bem semelhante à de então. Embora maioritariamente preocupados com os aspetos mais vastos da Língua Portuguesa, linguística, literatura, história, também nós constituímos um grupo heterogéneo unidos apenas naquilo que nos é comum, a língua de todos nós. A nossa língua configura o mundo, sem esquecer porém que Wittgenstein disse que o limite da nossa nacionalidade é o limite do nosso alcance linguístico.
    Os Colóquios são uma prova insofismável de que tudo é possível com custos mínimos desde que se dê liberdade às pessoas para criarem no seio da nossa associação projetos com os quais se identifiquem e que se destinam a pensar e debater amplamente, de forma científica, a nossa fala comum: a Língua Portuguesa de forma conducente ao reforço dos laços entre os lusofalantes – no plano linguístico, cultural, social, económico e político – na defesa, preservação, ensino e divulgação da língua portuguesa e todas as suas variantes. Em defesa da Lusofonia, defendemos a nossa identidade como pessoas e povos, e em prol da variada língua comum com todas as suas variantes e idiossincrasias, impedindo que outras culturas e outros povos nos dominem cultural, económica ou politicamente, como alguns, ostensiva e claramente, defendem.
    É aqui no nosso seio de oradores, patronos e patronos especiais como os que aqui temos hoje, que nos podemos afirmar como plataforma de arranque de uma congregação de um Conselho de Sábios e de jovens cultos e dinâmicos para pensar e agir rumo ao futuro sem nos deixarmos abater pelo negativismo da crise que visa embotar a nossa capacidade de realização.
    Resumidamente foi isto que os colóquios fizeram ao longo de uma década, numa prova da vitalidade que a sociedade civil atuante pode ter quando se congregam vontades e esforços de tantos académicos e investigadores como aqueles que hoje dão vida aos nossos projetos.
    Resta apenas que todos os que aqui estão se juntem à AICL – Colóquios da Lusofonia para fazermos chegar o nosso MANIFESTO a toda a gente e aos governos dos países de expressão portuguesa e que este sirva de ponto de partida para o futuro que ambicionamos e sonhamos. Com a vossa ajuda e dedicação muito mais podemos conseguir como motor pensante da sociedade civil.
    A diferença entre os países pobres e os ricos não é a idade do país. Isto está demonstrado por países como o Egito, que têm mais de 5.000 anos, e são pobres. Por outro lado, o Canadá, a Austrália e a Nova Zelândia, que há 200 anos eram inexpressivos, hoje são países desenvolvidos e ricos. A diferença entre países pobres e ricos também não reside nos recursos naturais disponíveis. O Japão, possui um território limitado, 80% montanhoso, inadequado para a agricultura e para a criação de gado, mas é a segunda economia mundial. O Japão é uma imensa fábrica flutuante, que importa matéria-prima do mundo inteiro e exporta produtos manufaturados. Outro exemplo é a Suíça, que não planta cacau, mas tem o melhor chocolate do mundo. No seu pequeno território, cria animais, e cultiva o solo apenas durante quatro meses ao ano. No entanto, fabrica laticínios da melhor qualidade. É um país pequeno que passa uma imagem de segurança, ordem e trabalho, pelo que se transformou no cofre-forte do mundo. No relacionamento entre gestores dos países ricos e os seus homólogos dos países pobres, fica demonstrado que não há qualquer diferença intelectual. A raça, ou a cor da pele, também não são importantes: os imigrantes rotulados como preguiçosos nos seus países de origem, são a força produtiva dos países europeus ricos. Onde está então a diferença? Está no nível de consciência do povo, no seu espírito. A evolução da consciência deve constituir o objetivo primordial do Estado, em todos os níveis do poder. Os bens e os serviços, são apenas meios… A educação (para a vida) e a cultura ao longo dos anos, deve plasmar consciências coletivas, estruturadas nos valores eternos da sociedade: moralidade, espiritualidade, e ética. Solução-síntese: transformar a consciência do Português. O processo deve começar na comunidade onde vive e convive o cidadão. A comunidade, quando está politicamente organizada em Associação de Moradores,Clube de Mães, Clube de Idosos, etc., torna-se um micro-estado. As transformações desejadas pela Nação para Portugal, serão efetuadas nesses micro-estados, que são os átomos do organismo nacional – confirma a Física Quântica. Ao analisarmos a conduta das pessoas nos países ricos e desenvolvidos, constatamos que a grande maioria segue o paradigma quântico, isto é, a prevalência do espírito sobre a matéria, ao adotarem os seguintes princípios de vida:
    1. A ética, como base;
    2. A integridade;
    3. A responsabilidade
    4. O respeito às leis e aos regulamentos;
    5. O respeito pelos direitos dos outros cidadãos;
    6. O amor ao trabalho;
    7. O esforço pela poupança e pelo investimento;
    8. O desejo de superação;
    9. A pontualidade;
    Somos como somos, porque vemos os erros e só encolhemos os ombros e dizemos: “não interessa!…” A preocupação de todos, deve ser com a sociedade, que A preocupação de todos deve ser com a sociedade, que é a causa, e não com a classe política, que é o triste efeito. Só assim conseguiremos mudar o Portugal de hoje. Vamos agir! Reflitamos sobre o que disse Martin Luther King: ” O que é mais preocupante, não é o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, ou dos sem ética. O que é mais preocupante, é o silêncio dos que são bons…”
    Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico – convertido pelo Lince.


    [1] QUENTAL, Antero de, 2ª Conferência: Causas da Decadência dos Povos Peninsulares, Casino Lisbonense, 27 de maio de 1871 in MEDINA, João, Eça de Queiroz e a Geração de 70, Lisboa, Ed. Moraes, 1980, 1ª ed., pp. 157-158.


  • DANIEL DE SÁ E OS ERROS SOBRE OS AÇORES

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    Quase humor e povoamento
    Apesar de ser lastimável que se saiba tão pouco e se tenha inventado tanto acerca do povoamento dos Açores, há hipóteses de tal maneira estranhas que chegam a dar vontade de sorrir. Tanto em pequenos ensaios sem pretensões académicas como em sisudos livros de capa e lombada, pode encontrar-se surpresas divertidas. Outras há que não têm graça nenhuma. Procurando nos arquivos da memória, recordo algumas delas.
    Houve uma vez em que dei com uma informação intrigante. Dizia-se que Santa Maria fora povoada por degredados e velhos. Levei algum tempo a entender que velhos eram aqueles. Tratava-se, sem dúvida, de confusão com o apelido Velho, dos vários familiares de Gonçalo Velho Cabral que o capitão chamou para iniciar o povoamento da ilha.
    Quanto aos degredados, não foram eles tão frequentes quanto alguns pensam, nem se tratou nunca de perigosos facínoras. E parece ter havido uma certa resistência em receber ladrões, traidores e pessoas de religião não católica. Pelo que se conclui que a generalidade dos exilados não passaria de autores de faltas menores. Era preciso povoar as ilhas, pelo que qualquer pretexto servia para obrigar a vir gente para cá, sobretudo mulheres, já que os homens menos dificilmente se aventuravam ao desconhecido. Por isso aconteceu o triste caso de Catarina Fernandes. A rapariga não fez mais do que ter testemunhado a respeito de um assassínio a que assistira. Mas o infante D. Pedro, regente do Reino, mandou-a para o exílio aqui. Tinha apenas dez anos! Ela cumpriu outros dez de degredo, “nas ilhas de São Miguel”, até que foi perdoada (não se percebe de quê…) por D. Afonso V.
    Aparece também com frequência a alusão a escravos e negros entre os povoadores. Com algum exagero. Para São Miguel terão vindo doze casais de mouriscos, sob o mando de Jorge Velho, mas para provarem que e ilha era habitável. Também o Corvo foi primeiramente habitado por escravos, que o seu senhor, e dono da ilha, a ela enviava para a cultivarem. Outra referência habitual é a da vinda de judeus. Sobre este tema escreveu Eduardo Mayone Dias, no jornal Portuguese Times de New Bedford: “É bem provável que se houvessem fixado judeus nos Açores desde os primeiros tempos do povoamento. /…/ No entanto, como afirma o Professor Francisco dos Reis Maduro Dias, não existe qualquer documentação sobre esta presença.”
    A própria geografia dos Açores pode reservar-nos surpresas desconcertantes. Como aquela que considera Santa Maria dividida em duas partes. Uma, montanhosa; a outra, plana, que é… o Barreiro da Faneca. (A grande publicidade dada a esta magnífica paisagem talvez explique a confusão, bem como o facto de haver quem pense que dali saía o famoso barro de Santa Maria. Os púcaros da água sempre fresca ou os alguidares dos apetitosos chouriços eram feitos com argila da Flor da Rosa. A da Faneca não serve para olaria.)
    Ou então uma trapalhada que junta vários sítios num só, ao afirmar que no lugar da Praia, a que foi dado o nome de Lobo (sic), e que depois se chamou Vila do Porto, se construiu a primeira ermida de Santa Maria.
    Quanto à formação geológica das ilhas, há a preciosidade de um autor que, depois de dizer que a rocha foi formada por vulcões, revela o inimaginável – que a terra foi trazida pelo ar e pelo mar…
    A História feita por dedução nem sempre resulta… O erro mais generalizado, em que até historiadores credenciados têm incorrido, é o das famosas chaminés de Santa Maria, que alguém supôs terem resultado da influência de povoadores algarvios, que os não houve naquela ilha. Além disso, sendo as chaminés uma invenção do século XII, tardaram em fazer parte das casas dos pobres. Conforme escreveu André Brue (um alucinado que foi embaixador no Senegal, e que, apesar de ter estado uns meses na Terceira no início do século XVIII, teimava que os Açores pertenciam à África) a maioria das casas do Faial não tinha chaminé. As aparências (que neste caso entre Santa Maria e o Algarve nem sequer existem!) iludem. Mas facilmente se encontram outros exemplos que, embora não alterando tanto a verdade histórica, a distorcem consideravelmente. Foi o que aconteceu com o sotaque micaelense, que até os mais empenhados filólogos atribuíram a reminiscências de povoadores alentejanos da região de Nisa. Afinal, o que aconteceu foi uma viagem ao contrário. Em 1796 Pina Manique fez deslocar para o Alto Alentejo umas centenas de famílias de São Miguel, a fim de ocuparem herdades abandonadas. E o seu modo de falar terá permanecido naquela zona.
    Há um historiador que dá os topónimos Flor da Rosa e ponta do Marvão, em Santa Maria, também como provável herança alentejana. O primeiro talvez o seja, tanto mais que veio gente de Estremoz, que não fica longe daquela freguesia do concelho do Crato. Mas, segundo Gaspar Frutuoso, o nome da ponta do Marvão resulta de ter sido seu proprietário Francisco Marvão. Deste não regista Frutuoso a naturalidade, mas de João Marvão diz ser do Sabugal, pelo que o mais razoável é pensar que Francisco também o fosse. O mesmo historiador leu mal Frutuoso ao atribuir a origem do nome da Algarvia e o do Pico da Algarvia a duas mulheres e não a uma somente. Gaspar Frutuoso, ao falar do pico, diz que ele deve o nome a uma mulher do Algarve que ali viveu com o marido, e de quem herdou as propriedades quando enviuvou. E, para que não restem dúvidas de que se tratava da mesma pessoa, acrescenta “como tenho dito”.
    Ainda um outro equívoco, muito frequente sobretudo por parte de micaelenses mais bairristas, é o que respeita à criação da diocese. Ao contrário do que há quem pense, o Papa não se enganou. A haver engano, seria de D. João III ou do escrivão que fez a carta. E houve, porque nela falta a ilha de Santa Maria e se confunde São Miguel com a Terceira. No entanto, são sempre referidas Angra e a igreja do Salvador. Não podem subsistir dúvidas quanto à vontade de El-Rei. A vila de Angra era naquele tempo a mais notável dos Açores, com importância mundial na rota entre três mundos. O facto de D. João III a ter elevado à categoria de cidade, condição necessária para ser sede de uma diocese, e não Ponta Delgada, é prova segura da sua intenção.
    Daniel de Sá
  • judeus portugueses nas AMÉRICAS

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    DE DIÁLOGOS LUSÓFONOS
    Os judeus portugueses nas Américas
    [Este post integra-se num “blogburst” promovido por Jonathan Edelstein, destinado a celebrar Arrival Day, o Dia da Chegada, que assinala o aniversário do desembarque dos primeiros judeus em Nova Iorque, a 7 de Setembro de 1654]

    Nova Amsterdão. Gravura da autoria do cartógrafo Peter Schenk.
    Atlas Hecatompolis.

    Os nomes de família dos primeiros judeus americanos soam estranhamente familiares: Dias, Costa, Cardozo, Faro, Ferreira, Fonseca, Gomes, Lucena, Navarro, Nunes, Henriques, Machado, Maduro, Mendes, Mesquita, Pacheco, Peixotto, Pereira, Pinto, Penha, Seixas… Eram portugueses. Judeus portugueses do século XVII. Muitos deles “cristãos-novos”, que finalmente descartavam a capa que foram obrigados a envergar para escapar às fogueiras inquisitoriais; que ali procuravam abrigo, um refúgio da intolerância que mergulhava Portugal numa histeria de fanatismo sanguinário, que acabou por arrastar o país para um abismo do qual ainda hoje se sentem cicatrizes profundas. Os judeus portugueses chegaram a Nova Iorque a 7 de Setembro de 1654, quando a cidade era holandesa e ainda se chamava Nieuw Amsterdam. Faz hoje 351 anos.
    Os primeiros vieram do Brasil, alguns depois de emigrarem primeiro de Lisboa para a Holanda. E tal como já acontecia na Holanda, estes emigrantes judeus de Nova Iorque eram conhecidos como “gente da Nação Portuguesa” (ver Hebrews of the Portuguese Nation). Mas para seguir a génese da comunidade judaica portuguesa em Nova Iorque é necessário primeiro viajar até ao Brasil colonial do século XVII, mais concretamente a Pernambuco, um território de extensão considerável capturado pelos holandeses em 1630.
    Os judeus tinham desempenhado o seu papel na descoberta e colonização do Brasil. Desde 1500, quando Pedro Alvares Cabral desembarcou nas Terras de Vera Cruz acompanhado por Gaspar da Gama, um “cristão-novo”, até 1654, altura em que os portugueses expulsaram os holandeses, navegadores, pioneiros e colonos judeus ajudaram a moldar a história do Brasil. A Inquisição não tinha ainda atravessado o Atlântico e a distância emprestava uma ilusão de segurança. Muitos dos que ali chegavam eram deportados, condenados ao degredo por suspeita de judaísmo, transformando o território virtualmente numa colónia penal. Mesmo assim, o espectro inquisitorial pairava ainda na penumbra e sobre os judeus pesava o receio de poderem ser repatriados para Portugal a mando dos tribunais da Inquisição.
    Num contraste extremo com o obscurantismo inquisitorial que dominava a península Ibérica, em Pernambuco a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais – responsável pela administração dos territórios da coroa dos Países Baixos nas Américas – proclamara logo de início, de forma inquestionável, a liberdade de consciência e de culto entre as populações das suas colónias:
    “A liberdade dos espanhóis, portugueses e nativos, quer sejam [católicos] romanos ou judeus, será respeitada. A ninguém será permitido que os moleste ou os sujeite a inquirições em matéria de consciência ou nas suas casas privadas; e ninguém os ouse inquietar ou perturbar ou causar-lhes dano – sob pena de punição arbitrária ou, dependendo das circunstâncias, de severa e exemplar reprovação.”
    in “Leis e Regimentos das Índias Ocidentais”, citada por Arnold Wiznitzer, “The Records of the Earliest Jewish Community in New York” (1957).
    Apesar de algumas tentativas por parte de clérigos para restringir estas liberdades (especialmente contra os católicos, tidos como inimigos naturais dos calvinistas), a Companhia Holandesa das índias Ocidentais reafirmaria por várias vezes os princípios de tolerância. Perseguidos pela Inquisição em Portugal, este pedaço de “Brasil Holandês” aparecia aos olhos dos judeus portugueses como um oásis de tolerância, que lhes permitia praticar a sua religião livremente, libertando-os do receio, constante e real, das torturas inquisitoriais ou da morte nas fogueiras dos “autos-de-fé”. E assim foi durante 24 anos. No Pernambuco holandês, sob a administração de João Maurício de Nassau, a comunidade de emigrantes judeus de Portugal floresceu, fundando a primeira sinagoga das Américas, a Kahal Tzur Israel (Comunidade Rochedo de Israel), em 1637.
    A 26 de Janeiro de 1654 as tropas portuguesas reconquistam o Recife com um ataque de proporções épicas, comandadas pelo general luso-brasileiro Francisco Barreto de Menezes – que a partir de então ficaria conhecido como “o restaurador de Pernambuco” –, pondo fim ao domínio holandês naquela região do Brasil.

    Fólio do manuscrito de “Regras Benéficas e Restrições” para o governo da Sinagoga Shearith Israel, escrito em português e inglês, lavrado em Nova Iorque, em 1728. (clique na imagem para ampliar)
    Os termos da rendição, assinados em Taborda, perto do Recife, são generosos para com os derrotados, dando aos holandeses um prazo de três meses (que seria prorrogado por mais três) para se retirarem do território recém conquistado, período durante o qual, segundo os mesmos termos, “não serão molestados ou vexados e serão tratados com respeito e cortesia.” Surpreendentemente, o general Barreto de Menezes mostra uma tolerância muito pouco habitual ao permitir igualmente (ajudando até) a saída dos judeus portugueses, apesar destes terem passado a ficar sob a alçada da Inquisição, o que lhe teria à partida vedado qualquer possibilidade de clemência. A lei exigia a deportação imediata dos judeus para Portugal.
    A 20 de Fevereiro de 1654 os funcionários do tesouro real efectuaram um inventário de todas as casas no Recife e Maurícia anotando os seguintes nomes como “judeus proprietários de casas e lojas”: Jacob Valverde, Moisés Netto, Moisés Zacutto, Jacob Fundão, Moisés Navarro, David Atias, Benjamin de Pina, Abraão de Azevedo, João de Lafaia; Gil Correa, Gabriel Castanha, Gaspar Francisco da Costa, Fernão Martins, Duarte Saraiva e David Brandão. Outras aparecem mencionadas no inventário como “casa de judeus”, mas o nome dos seus proprietários não consta do documento.
    Devido à escassez de embarcações holandesas que possibilitassem uma evacuação total, o general Barreto de Menezes ofereceu navios portugueses para transportar os judeus e assim os ajudar a escapar à Inquisição. Este gesto não seria esquecido, e os anais da história judaica portuguesa registam ainda hoje o nome de Francisco Barreto de Menezes, católico e “cristão-velho”, como um homem de nobre carácter – um hassid umot ha’olam (gentio justo e íntegro do mundo.)
    Ao todo, 16 navios portugueses foram colocados à disposição dos seus compatriotas judeus pelo general Barreto de Menezes e a esmagadora maioria das cerca de 150 famílias judias do Brasil Holandês partiu em direcção à Holanda. Alguns optaram por ficar nas colónias holandeses nas Caraíbas onde, ainda hoje, a predominância de nomes de família portugueses (e a linguagem litúrgica) entre os judeus sefarditas do Suriname e de Curaçao prova essa ligação ancestral (ver também bloGUSblog: A estrela oculta do sertão, sobre os descendentes dos judeus portugueses que ainda restam no sertão brasileiro.)
    Corsários, piratas e a intolerância religiosa ibérica tornariam ainda mais complicada a já difícil viagem de alguns deste judeus. Em Amsterdão, o rabino português Saul Levi Morteira – professor de Baruch Spinoza e mais tarde seu “excomungador” – deu conta dos percalços sofridos por uma destas embarcações no livro Providência de Deus com Israel, um manuscrito não publicado do qual apenas restam seis cópias:
    “O navio foi capturado pelos espanhóis, que queriam entregar os pobres judeus à Inquisição. Ainda assim, antes de poderem cumprir os seus ímpios desígnios, o Senhor fez aparecer um navio francês que libertou os judeus dos espanhóis, levando-os depois para África, posto o que chegaram salvos e em paz à Holanda.”
    Um outro navio, atacado por piratas ao largo do cabo de Santo António, em Cuba, seria também resgatado por um barco francês – o Sainte Cetherine, comandado pelo capitão Jacques de la Motthe. A 7 de Setembro de 1654, com 23 judeus portugueses a bordo, o Sainte Cetherine aporta a Nieuw Amsterdam, na ilha holandesa de Manhattan, a cidade que mais tarde passaria a ser conhecida como Nova Iorque. Era o primeiro grupo de judeus a chegar a América do Norte. Faz hoje precisamente 351 anos.
    Destas vinte e três pessoas – homens, mulheres e crianças – sabe-se hoje muito pouco. São seis famílias, encabeçadas por quatro homens e duas viúvas. Só os seus nomes são mencionados nos registos oficiais. Mesmo assim é fácil adivinhar-lhes a proveniência: Abraão Israel Dias, Moisés Lumbroso, David Israel Faro, Asher Levy, Enrica Nunes e Judite Mercado.
    A princípio, reticente, o governador holandês Peter Stuyvesant opôs-se à permanência dos judeus, escrevendo aos seus superiores argumentando que “se deixamos vir os judeus não tardam a vir os papistas.” O desespero de Stuyvesant aumentaria ainda mais quando os judeus apresentaram uma petição à Companhia Holandesa das Índias Ocidentais para poder fazer na Nova Amsterdão o que faziam em Pernambuco – viver livremente. A resposta da companhia foi favorável :
    “Após muita deliberação, resolvemos dar provimento à petição apresentada por certos mercadores [judeus] da Nação Portuguesa, julgando-a favorável, para que eles possam viajar e comerciar com e na Nova Holanda e viver dentro dos seus limites.”
    Em 1664, Nieuw Amsterdam passa para a coroa britânica e muda de nome. Dai para a frente será New York. Por volta de 1695, apesar de algumas restrições, os judeus tinham a sua primeira sinagoga improvisada, e a 8 de Abril de 1730 era dedicada a primeira sinagoga de raiz da comunidade que, logo à chegada, em 1654, escolhera o nome de Shearith Israel (Remanescente de Israel). Até ao final do século XIX tiveram duas línguas “sagradas”, ditadas pelos genes, pela fé e pelo apelo da memória. Faziam-se as orações em hebraico. Em português escreviam-se os documentos.

    Dois rabinos da Sinagoga Portuguesa de Nova Iorque: H. Pereira Mendes (séc. XIX) e David de Sola Pool (séc. XX).
  • sotaques dos açores victor rui dores

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    os sotaques dos Açores estudados e reproduzidos por VICTOR RUI DORES
    http://videos.sapo.pt/dWfT2qv7Pev7OmhfDZzr
  • ALEXANDRE BANHOS “Os povos sem memória acabam sendo vegetais sem futuro”

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    “Os povos sem memória acabam sendo vegetais sem futuro”

     

    Intervenção de Alexandre Banhos na celebração em Montalegre dos aniversários do Gallaeciorum Regnum e de Afonso Henriques primeiro rei de Portugal

     

    Segunda, 19 Dezembro 2011 00:00
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    PGL – Os 1.600 anos do reino da Gallaecia e os 900 do nascimento de D. Afonso Henriques foram tema dedebate no Ecomuseu de Barroso – Espaço Padre Fontes que decorreu o passado 26 de novembro. Orlando Alves, vice presidente da Câmara Municipal de Montalegre, impulsor do ato, no que colaborava aFundaçom Meendinho, presidiu a cerimônia, acompanhado por Barroso da Fonte e Alexandre Banhos, oradores da noite.
    Orlando Alves, também vereador de Cultura, formalizou a abertura da palestra justificando o ato por não terem os portugueses “a verdadeira noção da importância [de] Portugal” e porque só o conhecimento das fraquezas do passado possibilita “transformá-las em forças” de futuro.
    1600 aniversário do nascimento do Gallaeciorum Regnum
    Alexandre Banhos falou do 1600 aniversário do nascimento do Gallaeciorum Regnum em Braga, “capital histórica da Gallaecia”, no ano de 411, ponderando os factos de ser o primeiro reino que se constituiu como tal dentro das fronteiras do Império Romano, de acunhar moeda e de chamar-se com o nome do povo que morava no território (Reino dos galaicos).
    Enquanto nos países da Europa se celebram solenemente os aniversários de acontecimentos de menor relevância relativa, na Galiza e Portugal não foi difundido como é devido um acontecimento que marcou o nascimento como pleno sujeito histórico da nacionalidade comum. O Banhos lembrou que “os povos sem memória acabam sendo vegetais sem futuro, e para os que o seu passado lá fica esvaído nas trevas”. E encorajou aos assistentes a “[combater] o mal da desmemória no nosso povo com a única cura de rememorar, um bocado de abelência social e esclarecimento”.
    O estabelecimento do reino suevo foi recebida pelos galaicos como uma bênção ”por os libertarem da escravidão das dívidas e do fisco imperial”. Na Galiza, os germanos “misturaram-se de seguida com o povo que os acolheu, adotaram a religião da maioria e deixaram a deles, integraram os galaico-romanos na suas empresas e governação, impulsionaram novos modos de governança.”
    Os concílios, a organização do território no Parrochiale Suevum ou Divisio Teodomiri, o latim proto-galaico que viria dar na língua portuguesa, o arco de ferradura e igrejas como as de Bande e Viseu, a estabilidade dos limites fronteiriços, a rica toponímia, a antroponímia até há bem pouco ainda dominante e algumas palavras emblemáticas do nosso léxico foram alguns dos contributos do Reino dos Galaicos à nossa história e à civilização europeia que repassou o palestrador galego.
    Após quase 200 anos de vida independente, o reino dos suevos seguiu condicionando a história da nação, pois “na Ibéria visigótica a Gallaecia foi sempre um reino distinto e inconfundível com a Espanha, que permaneceu e continuou distinto na sua governação”, como mostram os concílios e sua condição de principado autônomo dentro do reino visigodo. Essa primitiva articulação da nação, cuja antiga condição talvez obrigara aos romanos a reconhecerem uma província chamada Gallaecia séculos depois de sua incorporação ao Império, fez possível que a Galiza se safara da invasão e a dominação muçulmana: ”Salvou-se com um penhor, uma coima que não teve longa duração. As dioceses da Galiza, com a própria Braga, são as únicas dioceses peninsulares que tiveram continuidade no tempo e nunca ficaram vagas”. E conclui: “Frente ao muçulmano, é a Galiza, o poder que o vai enfrentar. Só a Galiza aparece nos textos muçulmanos e dos demais reinos cristãos da Europa, francos, lombardos, anglo-saxões, normandos… E essa Galiza era já verdadeiro Portugal.”
    9º centenário do nascimento de Afonso Henriques
    Barroso da Fonte, autor do livro Afonso Henriques 900 anos, a obra de mais pormenor nas circunstâncias do nascimento do reino de Portugal, que remonta ao nascimento no Porto no ano de 868 do condado Portucalense, falou do 9º centenário do nascimento do primeiro rei de Portugal em 1109, em Guimarães. O historiador transmontano assinalou os fatores e interesses que se desenvolveram nas elites no sul da Galiza, que era quem impulsionava a reconquista e os avanços para o sul, contrapostos com o norte.
    Com o Rei Garcia desaparece o condado Portucalense ao deslocar a cabeça primaz do reino delegada em Lugo à restaurada Braga, que passa a ser o centro e cabeça do reino como em direito histórico correspondia. Isso foi contestado pela nova e ambiciosa sede compostelana, que pronto moverá todo para submeter a Braga a sua dependência. Deposto o rei galego, em Braga não gostam da política imperial e desconsiderada da recém chegada Compostela e começa a dar-se uma conjunção de interesses entre o bispo de Braga, verdadeiro fator do processo que virá, e as classes dominantes locais.
    A divisão do reino da Galiza por Afonso VI entre Raimundo de Borgonha, esposo de sua primogênita Urraca, e Henrique de Borgonha, que desposou a Teresa, filha ilegítima, e com que se restaura o condado de Portucale; o controle por Gelmirez e os Traba do filho daqueles, Afonso Reimundes, proclamado rei em Compostela com oito anos; o Pio latrocínio das relíquias dos santos de Braga pelo bispo compostelano; a discreta consolidação da governação de Henrique; o nascimento de seu filho Afonso Henriquez; a residência em Guimarães, e a oposição, morto o pai, do menino Afonso, sob o auspício de Paio Mendes, o bispo de Braga, à política de sua mãe, aliada dos Trava; o exílio em Tui acompanhando ao bispo bracarense, que o armou cavaleiro; a coroação em Leão de Afonso Reimundes; a decisiva batalha de São Mamede, que consagra a autoridade de Afonso Henriques no território portucalense, são os momentos fundamentais cujo estudo apresenta o historiador português, e que concluem com as negociações do Bispo Paio junto da Santa Sé para alcançar a plena autonomia da Igreja de Braga e obter o reconhecimento do condado de Portucale como um reino.
    Troca de ideias
    Após das intervenções houve um longo e muito participativo debate em volta destas importantes referências históricas da Galiza e Portugal. Nele, Alexandre Banhos exprimiu a alegria que como galego sente por existir Portugal, e afirmou “que não acreditava em que se se mantiver o velho território unificado naquela altura, vier a existir algures a maravilha que foi, e é, Portugal, (ou Galiza) arredada de Castela”.
    O sucesso de Afonso Henríquez e da Gallaecia bracarense, verdadeiro cerne da velha nação, que deu lugar a Portugal, graças ao maravilhoso milagre da sua separação e nascimento como Estado diferenciado, fez que a velha Gallaecia continuasse no mundo, –pois sendo tal já era sempre verdadeiro Portugal-, e que a nossa língua e cultura seja um referente internacional.
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  • POEMAS À MINHA GALIZA LUSÓFONA

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    ao celebrar 40 anos de vida literária criei um capítulo GALIZÓFONA

    501 partir ii (a uma galiza lusófona)

    partir!
    cortar amarras
    como se ficar fosse já um naufrágio
    ficar
    como quem parte nunca
    partir
    como quem fica nas asas do tempo
    partir!
    cortar grilhetas
    como se viver fosse uma morte adiada
    vencer ameias
    cortar amarras
    velas ao vento
    olhar o mundo
    descobrir liberdades
    esta a mensagem
    levar o desespero
    ao limiar
    até erguer a voz
    sem medos
    até rasgar as pedras
    e o ventre úbere
    semear desencanto
    sorrir
    à grande utopia
    nascer
    de novo
    dar o salto
    transpor a fronteira
    entre o ter e o ser
    imaginar
    como só os loucos sabem
    e então chegaste
    com primaveras nos dedos
    e liberdade por nome
    loucas promessas insinuavas
    despontaste
    como quem acorda horizontes perdidos
    demos as mãos
    sabor de início do mundo
    pendão das palavras por dizer
    esta a revolução
    minha bandeira por desfraldar
    s. martinho do porto, setembro, 5, 1976/lomba da maia, açores fev 13, 2011

    525. Galiza como Hiroshima mon amour

    acordaste e ouviste o teu hino
    bandeira desfraldada ao vento
    ao intrépido som
    das armas de breogán
    amor da terra verde,
    da verde terra nossa,
    à nobre lusitânia
    os braços estende amigos,
    desperta do teu sono
    pega nos irmãos
    caminha pelas estradas
    ergue bem alto a tua voz
    diz a quem te ouvir quem és
    orgulhosa, vetusta e altiva
    indomada criatura
    nenhum poder te subjugará
    nenhum exército te conquistará
    nenhuma lei te amiquilará
    és a Galiza mon amour

    528. ah como eu gostava 16/11/2011

    portugal lembra o filho ingrato
    que sai de casa levando as malas
    cresce como um sem-abrigo
    vivendo de expedientes
    sujo, maltrapilho e destituído
    mas orgulhosamente só e independente
    altivo olha a galiza do tempo dos aguadeiros
    da pobreza, fome e sofrimento
    e sente-se superior
    não reconhece pai ou mãe
    nem partilha um cobertor
    comporta-se como assaltante
    aliado ao invasor
    esqueceu a história e perdeu os genes
    ah como eu gostava de ser galego

     

    530. pesadelo zoológico 3 dezembro 2011 à concha rousia

    s castelhano
    onhei estar num circo
    era um leão amestrado
    o domador espanhol
    senti-me galego
    eles não sabem
    que não há leões domados
    vivem anestesiados
    um dia acordam
    sem ronronar em castrapo
    vou esperar pelo chicote
    desobediente
    aguardo que ele erga a cadeira
    estreleje o látego
    e me mande falar
    aí direi ao castelhano
    já chega de circo
    o palhaço és tu.
    acordei e não vi bandeiras de castela

     

    531. lendas da minha galiza 11 dez 2011

    Galiza és tão especial
    quando sorris
    por que não sorris sempre?
    és tão bela
    quando ris com gargalhadas cristalinas
    por que não ris sempre?
    és tão amorosa
    quando falas e cicias
    por que não falas sempre?
    no meu quintal tenho um poço
    sempre cheio de palavras
    onde vou buscar inspiração
    é lá que busco amores
    como se fora o monte das Ánimas
    na era dos Templários
    quando os cervos eram livres e não havia lobos
    foi lá que aprendi a tua história
    depois de Ith filho de Breogán
    ir à Torre de Hércules
    divisar Eirin a Verde
    morto Ith, perdidas as Cassitérides
    aprisionados os Ártabros
    resta visitar Santo Andrés de Teixido
    duas vezes de morto
    que não o visitei uma de vivo
    e esta história queda silente
    nos livros e na memória dos velhos
    por que não a aprendem os nenos?
    agora que o rio Minho passa caladinho
    para não despertar os meninos
    hoje quando fui ao poço
    encontrei-o seco e mirrado
    sem um fio de água sequer
    não havia pardais nas árvores
    nem flores no jardim
    senti o coração trespassado
    as lágrimas secaram-me
    aºao trespassado Castelaer
    caladinho
    fincado no chão
    pios e polinia fadas ou sereias
    atopei umas Meigas
    a dançar com o Dianho
    foi então que o vi, o Chupacabras
    estandarte de Castela
    não mais haveria fadas ou sereias
    cronópios e polinópios
    vou juntar ferraduras, alho e sal
    colares de conchas e tesouras abertas
    esconjuro-vos ó meigas castelhanas
    que me salve o burro farinheiro
    vou ao banho santo em Lanzada (sansenxo)
    hei de te encontrar minha moura encantada
    não tenho medo de travessuras de Trasgos
    nem Marimanta ou Dama de Castro
    sem temor da Santa Companhatravessuras de Trasgos
    a
    a Santa Companha
    nem do Nubeiro vagueando
    entre tempestades e tormentas
    hei de te encontrar minha moura encantada
    e brotará áuga do meu poço
    escreverei os versos e serão mágicos
    erguerei a tua flâmula
    no poste mais alto e cantarei
    Galiza livre sempre

     

    532. genevieve 13 dez 2011

    genevieve era nome de mulher
    um restaurante japonês
    no meio de chinatown
    sorrisos largos e astutos
    mansos como o rio minho
    olhos profundos amendoados
    como o canon do sil
    prometia ribeiras sacras
    seios amplos acolhedores
    como as rias baixas
    genoveva da galiza
    amazonaom saudades de arousamazona
    s
    amazonaaa em sidney
    um pai na argentina
    uma mãe em paris
    com saudades de arousa
    promovia sushi com saké
    loucas bebedeiras em galego

     

    533. concha é nome de guerra 13 dezembro 2011

    para ti não há música nem dança
    apenas as artes marciais
    guerrilheira de montes e vales
    urdidora de emboscadas
    sob a copa das amplas árvores
    brandes teu gládio de palavras suaves
    não usas as falas do inimigo
    vingas a dor de seres galega
    a montanha que herdaste sozinha
    prenhada de mar na ilha dos nossos
    o povo desaparecido da Rousia aldeia
    esse recanto insuspeito ao virar da raia
    onde fui a férias em 2005 sem te saber
    eu que nasci galego do sul
    sendo galego de Celanova
    apartado de meus irmãos e irmãs
    séculos de história ao desbarato
    distavam mares que nunca navegámos
    montes que nunca escalámos
    estrelas que jamais enxergámos
    até um dia em que surgiste
    vestias azul e branco orlada a ouro
    estandarte do nosso reino
    ciciavas liberdades por atingir
    sonhos por realizar
    brandias a tua utopia
    numa mesma lusofonia

     

    536. elegia à AGLP 16 dez 2011
    viver numa ilha é prisão
    sair dela é impossível
    nem com a velocidade da chita
    nem com a força do elefante
    nem com o mergulho do cachalote
    de nada servem passaportes
    nem vistos consulares
    só água nos rodeia
    preciso saber nadar
    viver na Galiza é prisão
    sair dela é possível
    mas não elimina os carcereiros
    não abate as grades do cárcere
    não liberta do cativeiro
    mas nas árvores de NottinGaliza
    há sempre uma Concha dos Bosques
    ou um Ângelo Merlim
    um Joám Pequeno Evans Pim
    um frei Tuck Montero Santalha
    e seu bando de lusofalantes
    manejando o arco
    invencível besta da lusofonia
  • Onésimo Almeida na antologia bilingue

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    interessante texto sobre Onésimo de Almeida e a antologia bilingue de autores açorianos contemporâneos na sua apresentação na universidade do minho (Braga) dia 6 de dezembro

    http://www.lusofonias.eu/cat_view/91-iniciativas-e-apoios/58-apoios/115-antologias.html?view=docman

    Almedina-Braga, 6 de Dezembro de 2011
    Apresentação do livro Antologia Bilingue de Autores Açorianos Contemporâneos
    Onésimo e a questão da Literatura Açoriana
    Em vez de oferecer uma visão geral sobre esta Antologia Bilingue de Autores Açorianos Contemporâneos, optei por destacar um autor que nela figura: o Professor Onésimo Teotónio de Almeida. Confesso, desde já, o meu gosto pessoal pela prosa de Onésimo, pela sua limpidez, pelo seu humor (vd. “Que nome é esse, ó Nézimo?”, integralmente nesta antologia). Porém, a minha escolha, hoje, recai sobre um trecho não ficcional que extraí de A questão da literatura açoriana e que também consta da presente antologia:
    Embora haja quem suponha estéril o debate sobre a existência ou não de uma literatura açoriana, pessoalmente vejo nele uma riquíssima mina de elementos – dados, ideias perspetivas, conceitos, especulações, interpretações, explicações, análises – que refletem mundividências, posições teóricas sobre estética, pontos de vista sobre uma realidade humana num espaço geográfico específico (os Açores) de muitos dos melhores nomes das letras dos Açores. […] os textos de intervenção n[esse] debate […] representam a consciencialização teórica, uma explicitação de pontos de vista, intenções, demarcação e distanciamento de posições da parte exatamente de quem se tem preocupado por conjugar os Açores como tema, ou utilizá-los como espaço ou pano de fundo dentro do qual se move a realidade por eles criada ou recriada nos seus textos.
    Com certeza não será este o local, nem esta a hora, de debater a existência ou não da Literatura Açoriana. Questão apriorística, paradoxal, porquanto a sua formulação já expressa a identidade que está a questionar. Da mesma forma, esta antologia também não pretende dar nenhuma resposta a esta questão. Por outro lado, de maneira bem eloquente, a seleção de textos antologiados apresentam-nos as tais conjugações (a que Onésimo se referia) dos Açores como tema, as tais utilizações dos Açores como espaço ou pano de fundo, enfim, a tal realidade de formatação açoriana. Pode, então, o leitor conhecer, ainda que de forma fragmentária, os temas, os motivos, as histórias, as particularidades da língua e os demais recursos retórico-literários que fornecem os argumentos àqueles que defendem a existência de uma Literatura Açoriana. Claro que não se dispensa a leitura integral das obras — De resto, uma antologia é sempre um convite à procura da obra integral – e só assim se poderá formular uma opinião informada. Pela minha parte, reconheço obras que falam da experiência humana. Sem dúvida, obras que resultam de vivências próprias e estilos pessoais. Mas obras que espelham o mundo, os homens e as mulheres que nele vivem. Utilizando palavras de Claudio Guillén obras “entre o Uno e o Diverso”.
    A presente antologia acentua a universalidade das obras antologiadas. Promove-as e facilita que elas cumpram um propósito supranacional, de certa forma, enunciado por Goethe quando anunciava a chegada de uma Weltliteratur: cada literatura local tem um papel a desempenhar na grande sinfonia da Literatura Mundial. E, não abandonando a metáfora, esta antologia desempenha este papel a dois instrumentos: a Língua Portuguesa e a Língua Inglesa.
    Diz Onésimo no fim do mesmo artigo que “quem lucrará com isso [o reconhecimento da Literatura Açoriana] será a Literatura Portuguesa. Ficará menos monocórdica. E monótona.”. Depois desta antologia bilingue, independentemente de reconhecermos ou não a existência de uma Literatura Açoriana, quem lucra é a Literatura do Mundo: fica ainda mais polifónica e acessível a um maior número de leitores.
    João Peixe
    Doutorando da Fundação para a Ciência e Tecnologia
    Centro de Estudos Humanísticos
    Instituto de Letras e Ciências Humanas
    Universidade do Minho