Aquivos por Autor: CHRYS CHRYSTELLO

Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL

A FESTA DO AVANTE E AS VÉNIAS DO ESTADO AO PCP

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A FESTA DO AVANTE E AS VÉNIAS DO ESTADO AO PCP

Seu Efeito de Sinalização contra as medidas anti Corona do governo

Por António Justo

O Partido Comunista Português (PCP) esfrega as mãos de contentamento, com tanto a favor e tanto contra a Festa do Avante. O que importa é estar nas bocas do mundo, o resto é apagamento!

A festa do avante é o maior evento político-cultural português (três dias) e na sua organização faz lembrar o evento da Igreja (Kirchentag), na Alemanha! A Festa do Avante, como evento político-cultural, expressa a relevância da Esquerda em Portugal e a importância de um voluntariado criativo e idealista na organização do festival.

Desde 1990 o evento realiza-se na Quinta da Atalaia (Amora, Seixal) que o PCP comprou. Este ano o festival é realizado a 4, 5 e 6 de setembro.

A festa, é uma característica muito querida dos portugueses; já que não temos Fátima nem futebol nem arraiais, haja, pelo menos, festa para a esquerda; caso contrário, em tempo de pandemia, até nos esqueceríamos que vivemos num Estado partidário de crença secular que se empenha pelo cultivo do seu credo! Doutro forma seria legítima a pergunta: Que tem a festa do avante a ver com o beneplácito do PM e do Presidente da República e por que terá este de promulgar um decreto que não questione a festa do avante, apesar das massas de gente que congrega?(1) Ou será que num meio político imune e descarado se torna irrelevante o andar ou não com máscara!

Também gosto da festa e da liberdade. Se é permitido festejar que seja admitido para toda a gente! Regras, quando muito, sejam iguais para todos.

A festa do Avante (em média 100.000 participantes) rendeu em 2019 mais de dois milhões de euros ao PC.

Apesar da pandemia, numa lógica antigovernamental, o Avante leva a sua avante, o que vem confirmar a ideia dos que defendem que a conversa do governo em torno do Coronavírus não é mais que um exercício para o confinamento da vontade popular.

No fim da festa só haverá contentamento: os comunistas com os lucros da festa e os adversários com a esperança que o vírus também infeste os camaradas da festa!

Os Privilégios do PCP são os Garantes de uma Sociedade alinhada à Esquerda

A ação do PCP em Portugal pode resumir-se na seguinte frase do Tenente Coronel João José Brandão: “o PCP não manda, no sentido em que não ocupa, nominalmente, as cadeiras do Poder. Mas manda, no sentido em que condiciona tudo o que se passa” (2).

Ele condiciona tudo porque se encontra instalado na administração estatal e em corporações nacionais de maneira indelével e impercetível (3), possuindo ao mesmo tempo uma aura de mártir fomentada na consciência popular pelo regime de abril.

Embora derrotado em 25 de novembro de 1975 afirmou-se por simulação e infiltração no aparelho do Estado (constituição, imprensa ideologicamente saneada, instituições sociais, até na Caritas …). O regime de abril sem a ideologia comunista seria, na praça pública, como um galão feito com café de cevada! Por obra e graça da nova classe política toda a informação social tem um sabor característico de abril (Se o aroma social anterior tinha um cheirinho a Salazar o novo regime substituiu-o pelo cheirinho a comunismo; mas em questão de cheiros não se discutem gostos!).

A direita que não conseguiu sarar-se do complexo de culpa assumido no Regime de Salazar vindo-se aniquilada também pela demonização de tudo o que era do antigo regime; isto aliado à inteligência e experiência partidária do PCP e ao oportunismo de radicais de esquerda favoreceu a estruturação da corrupção dos partidos a nível estatal. O PCP foi açamado pela URSS que não queria que se estatuísse em Portugal um mau exemplo (PC) comunista a nível internacional.

De facto, o PCP português talvez seja o verdadeiro herdeiro de um socialismo que se queria também afirmar como crença; tornar-se na nova religião, o que em grande parte conseguiu. Na europa os partidos comunistas, no sentido tradicional, deixaram de existir, porque ao perderem a fé nele já não são verdadeiramente comunistas – por isso preferem optar pelo desvio socialista enquanto a recordação do bloco de leste durar; na Europa só o PCP original se mantem.

A subsistência do PCP original na sociedade portuguesa também tem certamente a ver com um certo sentido místico-poético português e com a consistência ideológica conseguida pelos obreiros da República portuguesa onde um corporativismo medievalista de elites cúmplices entre si ainda hoje politicamente fomentada por uma prática de sigilo dos homens do avental a atuar nos labirintos da República.

Para ver a sua capacidade de usar a crença do povo para os seus objetivos lembro aqui um caso que se deu nos primeiros tempos da revolução em que um militante delegado sindical de Lisboa, deslocado ao norte, (certamente em missão de catequização) trazia nas mãos um Terço como meio de propaganda, quando o Terço não era chamado, também no Norte, a comícios sindicais. (Tal era a ideia que se tinha do Norte!).

O PCP tem a vantagem, em contraposição a outros partidos da extrema esquerda, o facto de possuir uma certa racionalidade e uma boa infraestrutura na estratégia de organização enquanto outros só lhes resta a palavra e o oportunismo de que também muita da esquerda moderada se serve.

O PCP, como opositor sistémico convencido conseguiu, também a nível de opinião pública, um estatuto de consciência nacional que dá expressão ao protesto popular de quase tudo o que vai mal! Favorece-o ainda o facto de ser a ponta de lança da doutrina socialista que, a nível de partidos moderados, cultiva um socialismo envergonhado por terem de manter oculto o seu verdadeiro objetivo!

É triste a situação política e económica portuguesa por temos a pouca sorte de termos uma direita complexada e uma esquerda oportunista; uns e outros fechados em si mesmos e, como tal, não atentos aos verdadeiros problemas nacionais. O medo e o oportunismo revelam-se como garantes de um sistema partidário conivente ao serviço de corporações, mas à custa do bem comum! Outra não será a razão pela qual os partidos em vez de exercerem controlo efetivo sobre o Estado e o Governo com ações concretas (denúncia das irregularidades à justiça, etc.) apenas se interessam em comentar, na praça pública, os males do adversário político. Homens do jeito de Sã Carneiro e Ramalho Eanes não são bem vistos nas elites de Portugal.

António da Cunha Duarte Justo

Com notas em “Pegadas do Tempo” https://antonio-justo.eu/?p=6046

Coronavírus em esgoto de 4 países antes de surto

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Yvette Centeno
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The BBC website

Pesquisadores de pelo menos 4 países, entre eles Espanha e Brasil, apontaram presença de Sars-Cov-2 em amostras de esgoto coletadas antes de 1º caso oficial em Wuhan.

Pesquisadores de pelo menos 4 países, entre eles Espanha e Brasil, apontaram presença de Sars-Cov-2 em amostras de esgoto coletadas antes de 1º caso oficial em Wuhan.
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  • Ana Maria d’Orey Slewinski Ae continuam a dar esta notícia haverá muito gente confinada e contaminada pelo medo que nunca mais usa o wc.

ISABEL REI MAIS GUITARRA DA GALIZA

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Naqueles muros, ora sob as águas,
Perduram vozes doutras gerações:
São cantos, preces, áis de fundas máguas,
Murmúrios de secretas confissões.

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-1:53

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Líbano

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As réplicas também destroem

Edição por António Moura dos Santos

É coisa que se aprende novo, em simulacros de emergência e quejandos: quando há um tremor de terra, uma pessoa nunca pode assumir que o pior já passou e sair do seu abrigo achando-se em segurança, porque existe sempre o risco de réplicas.

A explosão ocorrida em Beirute há seis dias teve um impacto semelhante ao de um terramoto — a sua força foi avaliada em 3.3 de magnitude na escala de Richter —, mas as suas réplicas não foram físicas.

Enquanto ainda se vão contabilizando vítimas mortais — o balanço oficial é de 160 mortos, o não oficial é de 165 —, o impacto fez agora desabar o próprio edifício político do país, tendo o primeiro-ministro do Líbano, Hassan Diab, anunciado a demissão do seu Governo.

Depois de ter sugerido eleições antecipadas, a decisão de Diab pareceu tão inevitável como o tombo de um dominó colocado numa sequência de peças irremediavelmente em queda, dado que já tinham sido registadas mais duas demissões no seu executivo, quatro ao todo, desta feita da ministra da Justiça e do ministra das Finanças. Ontem, tinham sido a ministra da Informação e o ministro do Ambiente e do Desenvolvimento Administrativo.

As razões para as demissões casam com a motivação para a queda do Governo no seu todo. Diab, um independente, admitiu a incapacidade do seu executivo de lidar com a “corrupção endémica na política, na administração e no Estado”, a mesma que, a seu ver, levou à explosão que provocou um “terramoto que atingiu o país, com todas as suas consequências humanitárias, sociais e económicas”.

Recorde-se que a causa apontada como a mais provável para a explosão foi o armazenamento de 2.750 toneladas de nitrato de amónio no porto de Beirute, abandonadas num barco aí fundeado desde 2013 e que, defende-se Diab, foram aí deixadas por manifesta incompetência e corrupção da classe política que governou o Líbano.

Por isso mesmo, apesar de ele próprio ter sido eleito a partir do mesmo sistema que critica — o seu governo foi eleito pelo movimento xiita Hezbollah e os seus aliados — o primeiro-ministro disse estar a “dar seguimento à exigência do povo por verdadeiras mudanças”, querendo “dar um passo para trás para estar com o povo”.

O anúncio de Diab foi feito numa fase em que se mantém a tensão em Beirute, com protestos entre manifestantes e polícia a acontecerem há três dias consecutivos. A decisão era esperada, mas nem por isso satisfez os libaneses que protestam contra, mais do que um executivo em específico, a própria arquitetura do poder libanês.

Como recorda o Guardian, depois do Líbano sair dos escombros da guerra civil que devastou o país entre 1975 e 1990, estabeleceu-se uma rede de clientelas entre políticos, líderes militares e oligarcas que tomaram conta dos serviços essenciais do país, tornando a classe política libanesa dependente da sua patronagem. Tudo isto, assentando num equilíbrio ténue de sectarismo entre forças pró e os anti sírias, já que o país esteve sob a tutela síria dos anos 1990 até à retirada dos militares em 2005.

Como acontece em muitos outros países do Médio Oriente, o povo libanês tem sofrido com o facto do seu país ser utilizado como uma arma de arremesso entre potências locais e mundiais, com Israel, Irão, EUA e Arábia Saudita à cabeça.

Por isso mesmo, quem se manifesta não quer apenas um novo Governo, quer uma nova forma de governar. O mesmo parece exigir Emmanuel Macron. O presidente da França assumiu-se como a grande figura ocidental a apoiar o Líbano — o que é natural, dado o passado colonial francês no país —, viajando para Beirute em solidariedade e encabeçando um grupo de doadores que reuniram quase 253 milhões de euros para ajudar o país.

O valor é pouco face aos estragos — avaliados entre 2,5 a 4,2 mil milhões de euros —, ainda para mais para um país que já se encontrava em bancarrota, mas é essencial para que o Líbano não se torne num estado falhado.

No entanto apesar da ajuda de emergência ser, segundo a Presidência francesa, oferecida sem condições, os participantes na conferência declararam-se preparados para apoiar a posterior recuperação económica e financeira do país, mas exigiram que as autoridades do Líbano se comprometam a realizar as reformas exigidas pela sua população.

Nenhuma solução parece satisfazer por completo. Esta ajuda francesa pode tanto ser encarada como um abnegada forma de ajuda como mais exemplo de interferência externa. O contrário, porém, pode significar que, se não forem os franceses a gerir o processo de recuperação, poderão ser outros países, mais ou menos aconselháveis, dependendo do posicionamento político de cada um.

O que é certo é que a explosão já cessou, mas as suas réplicas vão repercutir-se nos próximos tempos.

COVID-19: A Maior Farsa do Século XXI – Paradigma da Matrix

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Como se poderá comprovar pelos pontos seguintes, nenhum dos parâmetros da narrativa oficial da COVID-19 se consegue sustentar por evidências.

Source: COVID-19: A Maior Farsa do Século XXI – Paradigma da Matrix

CRÓNICA 354, FIQUEI OUTRA VEZ ÓRFÃO DE PAI, RIP PAI NENÉ BATALHA, 10.8.2020

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CRÓNICA 354, FIQUEI OUTRA VEZ ÓRFÃO DE PAI, RIP PAI NENÉ BATALHA, 10.8.2020

em 2016 escrevi uma prece para o Leonel A Jorge Batalha (19 maio 1927-10 ago 2020) a quem desde 1979 chamei sempre pai, mesmo depois do a separação e divórcio da sua filha em 1992, hoje foi a vez dele se libertar desta vida e subir lá, onde quer que seja. Continuarei a falar com ele, partilhando desaires e vitórias, preocupações e escritos, como faço com o meu pai biológico desde 1992, sabendo que ele e Mãe Lala sempre estarão a olhar e a cuidar de mim, dos filhos e netos.

687. PRECE DE ATEU, AO PAI NENÉ, 24 julho 2016

pedem-me hoje que ore

como se um ateu rezasse

pedem-me hoje as minhas preces

como se vozes de ateu chegassem aos céus

mas nem sei nem posso

tentarei enviar energias positivas

pensamentos sãos

lembrar os momentos bons

as discussões que nunca tivemos

o apoio e amor que recebi

a partilha de parte da minha vida

apesar de sogro

foi um pai sempre presente

confidente e amigo

cúmplice

não sei se isto serve de prece

quero crer que sim

apesar dos continentes que nos separam

estivemos sempre perto

na china, na europa e na austrália

e nunca deixou de ser pai

desde que me aceitou há 37 anos

seremos sempre família

estará sempre comigo

nas preces que não sei

nas memórias que evoco

nos sorrisos que recordo

na sua bondade e tolerância

na sua ingenuidade sem malícia

para ti pai nené batalha

para onde quer que vás

estarei sempre contigo

É difícil quando se perde uma pessoa amiga, a quem se chama pai e que fez parte da nossa vida ao longo de 41 anos, desde que em 1979 me meti num avião de Macau a Perth para raptar a filha e dela fazer minha mulher em 1980. Sinto-me como se nesta fase da vida , eu fosse uma construção Lego e me começassem a retirar peças do puzzle que sempre fui para ficar apenas um desenho incompleto de tudo o que ainda sou. Quando essa peça sempre esteve comigo nos momentos bons e nos maus a dor é maior, e daí o título deste escrito. Quando casei em junho 1980 não podia ausentar-se (sob pena de perder o emprego) e ir a Macau e apenas foi a Lala.

Quando definitivamente fui para a Austrália em janeiro 1983 por não poder atrasar mais a minha efetiva residência, sob pena de perder o meu visto de residente, acabamos por ir viver numa “unit” em Macherson St. Waverley mesmo por cima da deles. Era uma casa geminada em quatro, com duas garagens e um quintal relvado. Ajudou-me a pintar a casa, a fazer trabalhos de marcenaria e carpintaria (que nisso tinha uma habilidade e uma paciência extremas). Tiramos camada após camada de papel de parede, retiramos as carpetes octogenárias da casa, e tornamo-la habitável em menos de um mês. Pouco depois tive de lhe dar a noticia das preferências alternativas de uma filha (que continua ser a cunhada com quem mais contacto ainda mantenho hoje), preparei-lhe um gin tónico duplo e dei a notícia de chofre e ele nem pestanejou, enquanto a Lala aceitava com a sua naturalidade possível. Depois mudaram para uma vivenda em Maroubra e eu mudei para Centennial Park e depois, para Randwick, mantendo sempre a nossa tradição de Yum Cha ao domingo em Chinatown ou então um barbecue com amigos nossos e deles, sempre muita gente num convívio dominical que jamais esquecerei de camarões tigre, bacalhau assado ou bifes, em que toda a família ajudava.

Jamais esquecerei que, depois de se ter mudado para a China onde fixou residência há mais de dez anos depois da morte da Lala, com 84 anos guiou duas horas até Macau para estar na Livraria Portuguesa a partilhar o lançamento do meu segundo volume de ChrónicAçores em pleno 15º colóquio da lusófona, junto com duas filhas e uma amiga de Macau dos meus tempos.

Lembro o apoio que me deu quando me arranjou emprego supranumerário no Consulado Geral de Portugal em Sydney entre março ou abril 1983 e janeiro 1984, no tempo do cônsul Dr Sarmento (a quem ajudamos a montar uma exposição de pintura). Fiquei encarregue de várias funções, oficiosamente, pois não podia ser contratado oficialmente, e o vice-cônsul V. Farinha pagava-me diretamente das suas ajudas de custo para eu desempenhar as funções de Adido Comercial, de Imprensa e das Comunidades. Isto antes de o meu amigo Eduardo Guedes de Oliveira ser nomeado pela Secretaria de Estado da Emigração como cônsul dos assuntos da emigração.

Foram meses intensos a tratar dos livros que enchiam uma arrecadação do 1º andar do consulado em Edgecliff e que nunca tinham sido distribuídos às escolas nem às bibliotecas. Fui a escolas, representei o Consulado em assuntos comunitários, de emigração, atuei como adido de imprensa, mantive contactos com a comunidade emigrada fugida de Timor sob ocupação indonésia. Todos os dias o pessoal almoçava junto, com o Viana macaense, que era secretário do consulado, a Modesta (que agora vive no seu Timor natal), e os restantes e havia sempre pitéus macaenses a degustar nesses almoços. Nunca havia horário de serviço e as horas do dia nunca chegavam e todos trazíamos serviço para completar em casa fora das horas de expediente.

Antes disso e depois de emigrar em 1977 para Perth passaram tempos difíceis em Perth com dificuldades económicas e a adaptação a meio da vida num país estranho onde estavam já os dois filhos mais velhos, a Angie e o Lito. Ele, que sempre foi de trabalhos manuais (como se chamava na época) trabalhou num supermercado, tomou conta da manutenção de um barco, até fazer o “overland” épico Perth – Sydney com a mulher e a sogra, a saudosa avó Maria (que, sem saber ler ou escrever foi sozinha de Sepins, Mealhada a Perth).

O Nené era a pessoa com menos sentido de orientação que já conheci e em Perth perdia-se sempre que se deslocava da cidade para o arrabalde afastado onde viviam, mas conseguiu chegar a Sydney ao fim de cinco dias na sua carripana Ford Station Wagon atulhada de móveis. Mais tarde, com a vida mais orientada trocou-a por um Mazda 626 que sempre teve essa mania macaense de trocar de carro como eu troco de camisa. Perdia-se tantas vezes que nós gozávamos dizendo que até era capaz de se perder numa aldeia só com duas ruas.

Não esqueço a alegria que tinha sempre que lhe pedi para me ir buscar a pequena Vanessa Ingrid à creche em Bondi Junction, por eu não poder chegar a horas cumulava-a de mimos, pois sempre teve um fraquinho especial por essa neta que está hoje prestes a completar 34 anos.

Quando fui casar a Sydney com a minha mulher em abril 1996, ainda fomos convidados a ir lá jantar a casa (então ainda em Maroubra) e fomos recebidos como se fossemos da dinastia Qing.

Mais tarde, depois de 1995 e durante alguns anos, passavam seis meses em Portugal, com a sogra dele em Sepins, e sempre tratou o meu filho João nascido em 1996 como se fosse outro neto, cumulando-o de prendas e mimos como tinha coma Vanessa na mesma idade. Íamos sempre almoçar e passar tempo com eles nesses meses de estadia expatriada em Portugal. Algumas vezes vinham duas das filhas, depois, a avó Maria morreu e desfizeram-se do casarão que foi comprado pelos rendeiros, quebrando seu vínculo a Portugal onde havia ainda irmãos e irmãs dele a viver no Porto, Lisboa e Algarve.

É difícil tentar em meia dúzia de linhas recordar tantos momentos compartilhados, que apensa sofreram um pequeno hiato aquando da separação e divórcio em 1992. O que aqui deixo são os que evoco neste momento e que mais profundamente ficaram gravados na memória, entre tantos e tantos ao longo de 41 anos. Pude sempre contar com ele, senti-me sempre tanto filho dele como os restantes, ou mais até.

Nesta data triste de hoje, as palavras-poema que acima escrevi em 2016 sumariam o que sempre senti. RIP, PAI NENÉ BATALHA

MARCELO VETA LEI DO MAR E EU VOLTO A SONHAR COM A ILHA ..DA AUTONOMIA

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14.11.1. ILHA DA AUTONOMIA, 6 JUNHO 2012 CRÓNICA 116

No outro dia escrevi que mal se vislumbra a costa da Bretanha em frente à janela do meu “castelo” na Lomba da Maia onde habito. O grande Mar Oceano confunde-se com o azuláceo ou acinzentado céu, depende da cor das lentes com que se acorda. Como disse Mariano Larra, escritor e jornalista espanhol do início do séc. XIX:

Um povo emudecido é um povo de atordoados e medrosos, a quem um prolongado costume de calar entorpeceu a própria língua.

Da “falsa” a janela do meu “castelo” desabrochava sobre o mundo. Enxergo mares. Lobrigo montes. Diviso nevoeiros que desaparecem sem rasto. Entrevejo vacas fiéis ao destino ruminante sem desfraldarem queixumes. Fantasio que a verdadeira autonomia se abaterá sobre o arquipélago criado a ferro e fogo. Aí se vislumbrará a tal ínsula nova que só surge com os nevoeiros de São João.. Com ela devaneio. Se a antecipo encoberta componho os óculos, arregalo a íris, foco o invisível. As ondas e as nuvens também conspiram para a ocultarem. Careço de um cartógrafo da Escola de Sagres devidamente acreditado, para a mapear. Descortino os contornos como se a visse em Braille.

Ia jurar tê-la avistado, mais do que uma vez (mas também há quem jure ter visto D. Sebastião no meio das brumas). A minha mulher disse que alucinava e, de repente, já não a descortino, o mar confunde-se com o céu. O horizonte indistinto, em constante mutação, ora cinzento ou azuláceo. Perde-se no alcance da visão. Quando fito o grande mar oceano, estou expetante para vislumbrar a ilha nova a delinear-se no firmamento. Todos os dias fantasio e divago com ela, ora encoberta ora invisível. Acredito piamente que exista além da linha impercetível do horizonte. Por vezes, as próprias formas e cores das nuvens afiançam esse mistério que os mapas não cartografaram. Confio devotamente. Sei que virá ao meu encontro. Tal como a ilha Sabrina de antanho. Ou as que surgiam e desapareciam das cartas de marear na época de S. João. Esta é especial. Sempre que posso, perscruto o futuro em busca dela. Esta a realidade que me escapa e, no entanto, está lá. Quando a vir, clamarei o direito a dar-lhe denominação. Designá-la-ei Autonomia. Ia jurar tê-la visto já por entre um belo arco-íris que ia da Lomba da Maia à semiencoberta Bretanha, mas o arco da velha sumiu.

Enquanto não advém, os vaqueiros prosseguem a sua lufa, levantam-se trevas cerradas, continuam a acamar-se na escuridão, cansados noite após noite. Rotinas entrecortadas pelas festas, romagem, procissão. Sem queixumes pela má sorte que lhes repete destinos ingratos. Resignação amargurada, lobrigada nas comissuras de peles rugosas, encarquilhadas e sequiosas, tragando um copo de três ou um abafado. Os campos continuam a ser arados. As vacas mungidas, chova ou faça sol, feriado, dia santo de obrigação ou fim de semana. A terra e as vacas são os únicos meios mensuráveis da riqueza. Estes vaqueiros só mourejam. Jamais ouviram falar da semana-inglesa. Quase todos andam nas vacas. Ou as têm ou trabalham-nas para terceiros, (todo os dias, meses, anos). De tantas em tantas horas estão a mungi-las, levá-las de um pasto para o outro que todo o inverno a ilha se mantém verde. Os rendimentos são inferiores aos ibéricos (a que muitos chamam o Continente) mas há sempre mais subsídios para rações, para produção de mais leite e sabe-se lá que mais que os burocratas de Bruxelas inventaram ou a que os de cá forçaram com a sua insistência inesgotável, e as suas queixas diárias de que vão todos falir[1]….

Hoje, as ilhas transformaram-se em vacaria, uma imensa leitaria. O quotidiano, fora das pequenas urbes, é similar à escravatura de antanho. Cuidar de vacas doutrem a troco dum soldo miserável, sem direito a férias, doenças, feriados é servidão. A gleba cumpre horários sagrados sem calendário (a não ser dos dias santos e das festas), religiosamente acatados por homens e mulheres. Apesar de poucas, também por aí andam nas vacas. Supõe-se que interrompam as lides aquando da gravidez. Para 2015 antecipa-se o fim das quotas leiteiras, um remate anunciado há muito para essa riqueza artificial[2]. Quem sabe se não poderiam converter[3] as vacas leiteiras em produtoras de carne da melhor qualidade para exportação? Podiam usar a tecnologia existente e a mão-de-obra local seria sujeita a uma apropriada componente de atualização de formação e desenvolvimento pessoal?

No século XVIII ninguém pudera prever a data exata do fim da exportação das laranjas. Nos últimos anos sabendo-se a data de fim das quotas, aumenta a produção anual de leite sem escoamento possível, sem que haja do Governo, das autarquias ou das gentes da pecuária (sempre tão lestas a pedirem apoios e subsídios) qualquer ação, individual ou coletiva, que comece a prevenir o futuro. Claro está que os pastos não se podem converter em terras de cultivo enquanto o Diabo esfrega um olho, e os trezentos mil animais não se desvanecem num ápice por mais subsídios ao abate que se inventem.

Nas zonas rurais os filhos, que já não vão abundando, usam a escola nos interregnos da labuta nos campos. Se faltam e não fazem os trabalhos de casa é porque foram às vacas. Se deixam de estudar é para irem para as vacas. O açoriano vive do imediatismo. Futuro nunca, mas presente sempre à vista, nada arrisca nem previne. Este açoriano é bem diferente do antepassado que no século XIX com menos estudos, sem universidade nem Novas Oportunidades criou a Sociedade da Agricultura Micaelense, quiçá o movimento mais importante da história dos Açores. O comércio da laranja extinguiu-se vitimado por doença quando a exportação estava numa fase de ampla expansão, tendo atingido o máximo três décadas depois de ter surgido a ideia dessa sociedade. O que esses antepassados anteviram foi que aquela riqueza não seria duradoura devido aos avanços da produção e do transporte na Europa e, em especial na Península Ibérica.

Mas desta vez todos avisaram a geração do séc. XXI de que também as vacas iriam acabar como o ciclo do pastel e o da laranja…mas ninguém os preparou para outra coisa, as vacas são a única profissão que conhecem e nem admitem existirem outras…Não é opção, mas obrigação. Solidariedade familiar. Queiram ou não, cumprem o destino boieiro e a vontade paterna, herdada de séculos, sem sombra de desfortuna. Fatalismo ou destino, nunca se interrogam, apenas o cumprem. Vá-se lá a saber. Os medidores de felicidade são pouco fiáveis.

Em 2008, sete anos antes do fim das quotas leiteiras, abordei o Presidente da Junta da Lomba da Maia propondo uma reunião de esclarecimento onde os locais pudessem discutir ideias (se as tivessem) sobre a reconversão. Nem um se mostrou interessado, decerto pensaram que, um urbano como eu, nada teria para lhes comunicar sobre o ganha-pão deles. Daqui a pouco não existirão fundos europeus para a excessiva produção de leite que se regista nas ilhas (e no resto do mundo) e ficarão sem nada. Depois do fim da gesta heroica e brutal dos baleeiros, que Dias de Melo retratou, aproxima-se o fim da era do leite. Virão dias de fome e de aflição.

Nos EUA há quem aproveite o estrume do gado bovino para produzir energia ecológica…será que estes campos podem produzir biodiesel? Por outro lado, como a terra é fértil, quando se acabarem as vacas gordas leiteiras poderiam diversificar e manufaturar queijos, aproveitar os solos úberes para criarem outros produtos para mercados de nicho e exportar para o mundo.

Infelizmente, não vi nem ouvi nenhum dos técnicos agrários, vulgo engenheiros, propor ou estudar quais os mercados de nicho que as férteis terras poderiam fornecer. A única coisa que se vê, todos os dias no telejornal é o dono das vacas todas a pedir mais subsídios (porque choveu, porque está uma seca e não choveu, porque o furacão estragou isto, a tempestade tropical estragou aquilo, eu sei lá 1001 pedinchices algumas vezes ameaçadoras). Não fala em dar formação aos associados, nem a converter as vacarias noutra coisa, só lhe interessam subsídios de cá e da Europa. Não penaliza os que produzem leite a mais, pede mais dinheiro. Os tempos mudaram, cá e na Europa, mas ele – impérvio – permanece na sua, encravou naquela parte da gravação. Creio que a única coisa para que não pediu dinheiro foi para compensar quando está nevoeiro cerrado como hoje, mas, cuidado que posso estar a dar-lhe ideias. Falta visão como quando o chá sucedeu às laranjas. Os políticos insulares, por sua parte, como os congéneres, vivem em torres de marfim condicionados ao ritmo da reeleição e não parece que tenham visão para “imaginar” os Açores daqui a 10, 20 ou 30 anos, tudo é feito pelo imediatismo da próxima contagem de votos, nada fazem nem parece que haja quem o queira fazer.

Reservo-me sempre o direito de emitir opiniões e ser controverso quando afirmo que nos meios rurais, os açorianos seguem escravos, tal como os antepassados. Mesmo sem o saberem. Há quem alegue que esta servidão hodierna é mais humanizada e de matizes mais esbatidos (decerto nunca foram escravos …é como o país de brandos costumes). Seguem fados tradicionais sem os questionarem. O fatalismo insular pode ser explicado pela brutal aspereza dos elementos: o fogo e as manifestações telúricas.

A energia positiva dos vaqueiros é muitas vezes dirigida para ações cotejadas com o culto cristão eivado de paganismos, como as romarias. Existem alternativas, fugir, emigrar, ou então (e de forma mais simplista) mandar a escravidão às urtigas e viver do rendimento de inserção social. É o sistema da “Faixa de Gaza” da Ribeira Grande, lá para os lados de Rabo de Peixe. A maioria das famílias, com excelente taxa de natalidade, jamais empregadas nem empregáveis, vive do rendimento mínimo. Trabalhar é só para os inúteis. Opções que o sistema permite.

[1] (nota de 2020: aos anos que ouço a mesma ladainha, dia após dia na RTP Açores).

[2] Em 2020 constato que ainda nada ou muito pouco foi feito para a reconversão desses milhares de famílias que vivem do “leite” num ciclo vicioso de maiores produções para “sacar” maiores fundos europeus. Os mais pequenos foram comprados pelos grandes, dentro da evolução darwinista da economia de mercado.

[3] (houve há dias, em julho 2020, finalmente o anúncio da primeira criação de carne Wagyu[3] na ilha Terceira…. IN CHRONICAÇORES UMA CIRCUM-NAVEGAÇÃO…