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CRÓNICA 404 AQUI JAZ A CULTURA AÇORIANA 11.7.2021
(esta e anteriores em https://www.lusofonias.net/mais/as-ana-chronicas-acorianas.html
O meu pai sempre me disse que era feio pedir ou pedinchar, mas é o que tenho andado a fazer há vinte anos em nome dos Colóquios da Lusofonia, porque vivo num país de ladrões, corruptos e pessoas para quem a bola é quase o único interesse nacional.
Quando se fala de leitura, de cultura, de literatura todos torcem o nariz dizendo umas patacoadas, na maior parte das vezes, pinoquiadas, pois nunca se editaram tantos livros e nunca houve tão poucos leitores, mesmo entre a classe dos professores que tem uma aversão generalizada à leitura, quiçá por traumas educacionais antigos.
Nos Açores a Direção Regional da Cultura e a Secretaria desses assuntos debatem-se há anos neste paradi-gma de falar imenso sobre os apoios que dão sem mencionarem que não têm verbas para apoiar decente-mente seja o que for, se o quisessem fazer, e mesmo isso é matéria de debate.
Dos escassos meios de que dispõem têm de satisfazer clientelas várias entre os votantes e – sem dúvida – a das filarmónicas é a que tem mais votos. Livros, cinema, teatro, artes em geral ou em particular, congressos, colóquios, simpósios só mesmo os estrangeiros com nomes sonantes que para os outros são umas migalhas de centenas de euros ou pouco mais pois devem ser atividades elitistas com poucos votos a ganhar na distribuição eleitoral.
Apesar de termos editado livros, antologias, coletâneas, traduzido em 15 línguas autores açorianos, andar-mos com eles pelas ilhas e pela Ibéria, Brasil, Galiza e Macau, musicado as suas obras, declamado os seus poemas, a direção regional da cultura só não nos ignora totalmente por parecer mal.
Este ano porém, ignorou os pedidos de apoio formulados regulamentarmente em 2020 nas normas então vigentes. Quando pedi uma audiência aos novos responsáveis tive-a após meses de insistência em que falei, em solilóquio, e apenas me disseram para reenviar os projetos pendentes. Passados dias recebi a resposta INDEFERIDA POR SE REALIZAREM ESTE ANO. Quando disse, “claro que se realizam este ano, eles são os pedidos do ano passado”, fiquei sem resposta e sem apoios. Ainda pensei em fazer uma tourada com poesia declamada na arena, que parece ser mais do gosto dos dirigentes que andam a ferrar touros, mas não havia praça de touros disponível na ilha de São Miguel. Podia aqui citar dezenas de pensadores como Edward B. Tylor segundo a qual cultura é “todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade”. Num estudo mais aprofundado, Alfred Kroeber e Clyde Kluckhohn encontraram, 167 definições diferentes. Clifford Geertz, discutia nega-tivamente a quantidade de definições, e definiu cultura como sendo um “padrão de significados transmitidos historicamente, incorporado em símbolos, um sistema de conceções herdadas expressas em formas simbó-licas por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem o seu conhecimento e as suas atividades em relação à vida.” Há uma relevante distinção entre cultura e entretenimento. Segundo Mario Vargas Lhosa o objetivo do entretenimento é divertir e dar prazer, sem referenciais culturais concretos.