ANTÓNIO BULCÃO UMA CRÓNICA

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Anda c’o Costa ver os aviões
No Faial dos anos 60, não havia grandes espectáculos para se assistir. Filmes de fraca qualidade, um ou outro concerto de filarmónicas, mas faziam parte do que era costume, nada de extraordinário.
Diferente já era quando o circo chegava à ilha. Sem animais, sem cenas de grande êxtase, mas com umas senhoras que subiam por cordas e se atiravam pelos ares para serem apanhadas pelas mãos de um macho com as pernas presas noutro baloiço, palhaços a fazerem tolices, pouco mais. O máximo era o poço da morte, com motas a andarem em enorme velocidade, de lado em relação ao chão, e eu a rezar para ninguém cair lá em baixo, quando as rodas quase me roçavam o queixo, no topo do túnel.
Mas o show que mais me intrigava era o do Ruben de Oliveira, ilusionista e hipnotista. Aquilo de pôr gajos a dormir com um estralar de dedos fazia-me uma confusão dos diabos. Sobretudo porque conseguia hipnotizar do palco para a segunda plateia. Que poder enorme aquele, dominar um gajo a bastantes metros de distância, mandá-lo subir ao palco e obrigá-lo a fazer as coisas mais estranhas, para toda a gente rir do desgraçado.
“Estás cheio de comichão”, e o pobre coçava-se até fazer sangue. Tinha muito medo de o Ruben se lembrar de mim, encolhia-me na cadeira a ponto de me tornar invisível. E pensava que, se alguma vez fosse escolhido, iria tentar resistir muito e não me deixaria hipnotizar. Havia até quem dissesse que os que se levantavam da cadeira e pairavam até ao palco, como zombies, eram contratados para se fingirem hipnotizados e obedecerem às ordens mais bizarras. Não queria saber. Fugia do Ruben como o diabo da cruz.
Lembrei-me deste período da minha adolescência para tentar encontrar uma explicação lógica para o que se está a passar em Portugal. Talvez estejamos todos hipnotizados pelo Costa, sem sabermos…
De facto, o 1º ministro tem poderes acima do normal. Só essa capacidade terá tornado possível enganar o Seguro e convencer o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda a alinharem numa geringonça que estava na cara iria destruir aquelas forças políticas. Só com tal arte de nos pôr todos a dormir foi possível desculpar Pedrógão Grande, assim como todos os seguintes incêndios e as vidas que se queimaram pelas negligências então detectadas. E depois aceitarmos todas as compreensões de Costa com ministros que falharam sucessivamente, com Cabrita à cabeça. E a teimosia com o Orçamento, que levou à antecipação de eleições.
Quando se esperava, em tais eleições legislativas, uma reprimenda forte nas urnas, Costa consegue… maioria absoluta. Está este povo, certamente, hipnotizado.
Aliás, António Costa deve ter aprendido tais truques com o seu mentor, José Sócrates, que andou a gozar connosco anos e anos e ainda anda a fazer-nos de tolos, cada vez que abre a boca. E o que muita gente aponta como sucessor de Costa, Pedro Nuno Santos também já começou a ler tratados de feitiçaria e artes hipnóticas.
Várias teses se construíram sobre o que designaremos Despacho de Alcochetijo (junção de Alcochete e Montijo) e toda a bronca que suscitou.
Para uns, foi Pedro Nuno Santos que tentou o seu primeiro grande exercício de palco. O que quereria era, realmente, ser exonerado por Costa. Desejando suceder-lhe, não pretenderia ficar preso a uma governação que se antevê muito difícil, com a guerra e seus efeitos, com a inflação que não para de subir, com as greves que se seguirão semana após semana… Assim sendo, teria feito de propósito uma asneira enorme, na esperança de ser exonerado do cargo de ministro, indo para a Assembleia da República, onde ficaria na reserva, não podendo ser acusado de ter responsabilidades de governação e colhendo futuramente os frutos do descontentamento que cairá sobre Costa.
Para outros, é impossível António Costa não saber da posição que o ministro iria tomar, ainda por cima com o chefe do governo ausente em Madrid. A matéria é demasiado importante, já dura há décadas e impõe-se uma solução com o estrangulamento a que está sujeito o aeroporto da Portela. Teria, então, o 1º ministro deixado o seu ministro espalhar-se ao comprido, para forçar a que se humilhasse e seguisse no cargo, mas fragilizado.
Para mim, a explicação é muito mais simples: Costa hipnotizou Pedro Santos para este fazer uma asneira monumental, e depois hipnotizou Marcelo, para o Presidente da República vir falar ao País dizendo… nada.
Assim, fez o ministro pedir público perdão, não o exonerou, manteve-o perto mas diminuído, logo constituindo perigo menor. Se tinha dado certo a hipnose com Jerónimo e Catarina, como falhar com Pedro Nuno Santos? Do mesmo modo, pôs Rebelo de Sousa a fazer o que Costa pretende: falar sem dizer nada.
Cá por mim, que não votei em Costa nem nos seus pares regionais, continuarei a pensar que consigo resistir às suas artes hipnóticas. Mesmo que tenha de me beliscar com alguma intensidade, sempre que os vejo na televisão. O que eles querem, sei eu…
Post Scriptum: Dedico esta crónica ao Ruben de Oliveira, do qual acabei por me tornar amigo. Se tivesse o poder de hipnose que eu temia quando muito novo, ter-me-ia ganho ao king num campeonato que disputámos e no qual fui campeão. Mas um dia terá de me explicar como consegue conduzir um carro de olhos vendados. Eu, por vezes, quase bato mesmo com os olhos arregalados…
António Bulcão
(publicada hoje no Diário Insular)
Luís Filipe Borges and 15 others
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