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Cristina Fraga presidente do conselho de administração do Hospital Divino Espírito Santo (HDES), afirma que, quando assumiu o cargo no início do ano, num contexto pandémico, o hospital não parecia estar centrado no utente, e diz que a prioridade é recuperar a lista cirúrgica e para consulta.
Está há cerca de 10 meses a presidir ao conselho de administração do HDES. Que ações definiu como prioritárias para este mandato?
Este conselho de administração já disse, por várias vezes, que a nossa prioridade é aumentar a atividade assistencial. A recuperação da lista de espera é o nosso foco, onde estamos concentrados e empenhados.
Quando diz lista de espera refere-se à cirúrgica?
Lista de espera cirúrgica e também lista de espera ao nível das consultas das especialidades não cirúrgicas.
Que hospital encontrou ao assumir o cargo?
Um hospital muito sensível que, no contexto de pandemia, não parecia estar centrado no utente. Não nos podemos esquecer que, em conflitos de egos, os doentes não podem ser prejudicados.
Situações como a das cirurgias oncológicas estarem há seis meses pendentes são inaceitáveis, e logo a seguir à nossa tomada de posse, começamos a retomar as cirurgias oncológicas na área da Urologia. Termos utentes com consultas de Dermatologia Oncológica pendentes sem remarcação, sem vigilância por mais de um ano, também não é aceitável.
E não é só a questão da pandemia… Nós ainda estamos em pandemia e conseguimos manter a atividade assistencial e até melhorá-la – os números são públicos. Isso significa que havia necessidade de mudar uma rota. Nós fizemos isso. E, como é lógico, o conselho de administração não faz isso sozinho, foi com o empenho de todos os colaboradores. E, mesmo aquando do incidente informático, conseguimos manter toda a atividade.
Para além disso, verificámos que em termos de infraestruturas há necessidade de melhorar, por isso pedimos uma avaliação do LREC que ainda aguardamos o resultado. É necessária, num hospital desta dimensão, uma manutenção anual, e até diária.
Verifiquei também uma necessidade extrema de recursos humanos, de aumentarmos o número de enfermeiros, médicos, para conseguirmos garantir toda a atividade assistencial.
Um das primeiras medidas foi a criação da Comissão de Emergência de Combate ao Covid-19, porque não queríamos repetir situações do passado. E podemo-nos orgulhar de sermos das poucas instituições nacionais que não tem tido nenhum surto – a comissão está disponível 24 sobre 24 horas, para serem tomadas de imediato medidas em função dos resultados dos testes, pois quanto mais rápido forem tomadas medidas, melhores os resultados.
Concluindo, vi que era um longo caminho, um caminho que não pode ser feito sozinha, mas sim com todos. E, que era necessário alterar a cultura, e delinear planos a curto prazo, a médio prazo, e a longo prazo.
Disse que o hospital não estava centrado no utente, estava centrado em quê?
Estava centrado apenas nas situações da pandemia, e, todas as necessidades não Covid-19 tinham sido canceladas. E temos de garantir equidade de acesso aos doentes de Covid-19, mas também aos doentes não Covid-19.
Perante este diagnóstico, que balanço faz destes primeiros meses no conselho de administração? O que foi possível concretizar e o que não foi?
No que se refere às cirurgias, conseguimos cumprir o Plano Cirurge, de recuperação de lista de espera cirúrgica – vamos chegar aos 100%, e até já adicionámos, após o despacho do senhor secretário, mais cirurgias. Verificámos que é necessário aumentar o número de salas e de recobro, na área de ambulatório, para aumentar o número de cirurgias e conseguirmos prestar mais cuidados aos utentes e conseguir reduzir a lista de espera.
Em relação à contratação, a burocracia levava a que os internos, após a conclusão da especialidade, ficassem um ano ou mais sem serem contratados. E, nós conseguimos que os internos, que acabaram a especialidade no início do nosso mandato, fossem contratados em sete meses, com o apoio da tutela. É necessário reter os talentos que nós temos.
Os jovens é que trazem muitas vezes uma dinâmica que o hospital precisa.
Que necessidades de recursos humanos identificou?
Vamos abrir concursos para várias especialidades: três vagas de medicina física, duas de anatomia patológica, quatro de medicina intensiva, seis de medicina interna, uma de gastroenterologia, uma de cirurgia vascular, quatro de pediatria, uma de radiologia, um de infecciologia… Ainda este ano. Isto reflete quais as necessidades.
Foi aberto este ano um concurso para cerca de 60 enfermeiros. Entrarão no quadro?
Serão para o quadro. O nosso investimento será introduzir mais capital humano dentro da própria estrutura do hospital, principalmente nas equipas de enfermagem e médicos. E, em relação aos enfermeiros, temos candidaturas espontâneas que muitas vezes são aceites.
Que investimentos estão previstos e quais os que já foram feitos?
O nosso plano estratégico para 2022 – 2024 contempla a área da informática. Este ano, fizemos investimentos em várias áreas desde a pneumologia, ginecologia, anestesia, laboratórios, cirurgia vascular, microscópio cirúrgico de otorrinolaringologia, para o serviço de Urgência, estomatologia (substituímos as cadeiras que estavam desde o início da abertura, com 22 anos), e procedemos à renovação de vários equipamentos do bloco operatório. Na área da imagem, na cardiologia, na área da gastroenterologia, com a aquisição de eco-endoscópios lineares. E iremos fazer ainda mais investimentos para o ano. Porque verificámos que o parque de equipamentos da nossa instituição estava, em muitas áreas, com necessidade de renovação imediata. E não é possível fazer tudo num único momento – tem de haver cabimento orçamental e ver as prioridades. E é uma renovação para dar um salto tecnológico.
E ao nível das infraestruturas?
Haverá a ampliação do recobro e das salas operatórias; a ampliação da Urgência é uma das prioridades; e, a médio ou longo prazo, pretendemos ter a Unidade de Cuidados Intensivos por cima da Urgência, agregando tanto a parte de cuidados intensivos polivalente adultos, incluindo a de intermédios, e a Neonatologia que estão ambas dispersas no hospital, e ser criada a Unidade de Cuidados Intermédios Pediátrica. (…) Estamos a trabalhar no projeto da Urgência.
Nestes poucos meses, têm existido sucessivas polémicas públicas envolvendo a administração do hospital. Aceita a crítica de falta diálogo, nomeadamente com os profissionais de saúde?
As nossas portas estão sempre abertas. Quem trabalhou comigo na Hematologia sabe que eu sou aberta a críticas e este conselho de administração também, mas a críticas construtivas que levem a propostas de solução para os problemas. Agora, não considero críticas algumas questões menores. Quem é que não fala com este conselho?
Uma das situações foi o facto do conselho de administração ter decidido contratar uma equipa cirúrgica para fazer cirurgias de Otorrinolaringologia, sem passar pelo Serviço. E mais recentemente a situação da contratação da radioncologista sem a concordância da Unidade de Oncologia…
Volto à sua primeira questão… A nossa missão, o nosso objetivo é aumentar a atividade assistencial, principalmente na área cirúrgica. Isto foi transparente e foi divulgado. Na especialidade de Otorrinolaringologia, não havia atividade adicional. Houve diálogo – certamente o nosso diretor clínico tem toda a documentação sobre o número de reuniões que houve. Mas quando houve essa recusa, o que espera o povo açoriano deste conselho de administração? Que fique de braços cruzados? Não ficamos de braços cruzados. Se não há resposta interna, iremos procurar resposta externa. Aconteceu o mesmo com Oftalmologia – vêm colegas de fora fazer prestação de serviços, Cirurgia Plástica, Urologia, Neurocirurgia.
Mas essa decisão resultou de não ter havido disponibilidade dos profissionais de saúde?
Houve recusa… Nós temos estrutura, bloco, sala, tempo, equipa de enfermagem, assistentes operacionais e, principalmente uma lista de espera… Nós temos emails de pais de crianças que têm de estar na terapia da fala porque têm amígdalas aumentadas… Qual é a nossa função? A minha é essa. É fazer com que haja otimização dos recursos existentes. Esgotar primeiro na instituição, na Região Autónoma dos Açores, e procurar outras soluções. E foi isso que foi feito.
No caso da Unidade de Oncologia, que está há alguns meses a funcionar com constrangimentos por falta de médicos, devido a baixas, e, como foi tornado público, os médicos estão em situação de ‘burnout’, por que razão não houve, nesta situação, disponibilidade para resolver mais rápido esse problema que levou a que haja centenas de utentes sem consultas de vigilância?
Tenho de agradecer à equipa de médicos, enfermeiros e assistentes operacionais que conseguiram garantir todos os tratamentos de doença ativa que eram necessários. Agora, falar mais sobre este assunto quando o senhor secretário nos solicitou um processo de averiguações e que está a decorrer, não me cumpre a mim falar sobre esse processo.
Mas o que está a ser feito para resolver este problema?
A direção clínica contactou, na Região, o Hospital Santo Espírito da Ilha Terceira e esgotou os recursos da Região. Em dezembro, virá outro colega e estamos a aguardar resposta de outros médicos do IPO de Lisboa. Não ficamos de braços cruzados. É necessário, com alguma serenidade, dar tranquilidade aos doentes oncológicos que terão a sua consulta – que é para isso que nós estamos aqui.
Estão previstas contratações para a Unidade de Oncologia?
Terei todo o gosto a responder a isso, mas neste momento, apenas e só porque está a decorrer o processo de averiguações, eu tenho de me remeter ao silêncio sobre esse assunto.
O que levou à decisão de contratar uma radioncologista, quando a Unidade de Oncologia mostrou-se desfavorável a esta contratação? E que funções está a desempenhar?
A Radioncologia é uma especialidade como Hematologia, como Oncologia, ou Cirurgia Vascular. O hospital não tinha esta valência, mas o HSEIT tem uma radioncologista, e o IPO de Lisboa tem uma radioncologista e quem presta o serviço é a Joaquim Chaves. Nós nunca hesitaremos em contratar quem seja uma mais-valia para esta instituição.
E trabalha com a Unidade de Oncologia?
Ela trabalha com várias especialidades: desde a Urologia, Otorrinolaringologia, Cirurgia Geral, Oncologia, Hematologia, Ginecologia. São consultas multidisciplinares. A radioterapia não é só para a área da Oncologia.
No que se refere ao problema do ‘burnout’ dos profissionais de saúde. Sendo esta uma instituição de saúde, o que é feito para prevenir este problema, nomeadamente na atenção às circunstâncias de cada serviço?
Eu também tenho a especialidade de Medicina do Trabalho, e esta é uma área a que estamos atentos. Temos um serviço de saúde ocupacional que está sempre disponível, sempre aberto, e temos lá uma psicóloga. Sempre que é detetada alguma necessidade pelo diretor de serviço, enfermeira-chefe, ou o próprio colaborador, têm sempre a possibilidade de serem avaliados pela equipa. É lógico que, num ano de pandemia, não só a responsabilidade e o empenho necessários por parte dos profissionais de saúde levam a algumas situações mais extremas. Mas têm de ser detetadas precocemente e trabalhadas.
Há uma postura preventiva dos serviços, em situações em que, por razões diversas, se verifica a sobrecarga de trabalho para os profissionais de saúde, prevendo recursos adicionais?
Um dos pilares de uma instituição é a alegria no trabalho. Não conseguimos fazer tudo no imediato, mas temos feito. Nós criamos o hashtag #serhdes. O conselho de administração quer que os nossos colaboradores tenham orgulho nesta instituição. Queremos devolver esse orgulho a muitas pessoas que tiveram desânimo ao longo dos anos e que perderam a esperança nesta instituição. E, muito importante, queremos cativar e conquistar quem nunca sentiu o que é “ser HDES” e tenha esse sentimento. É essa mudança de cultura desta organização que nos vai fazer manter a rota necessária.
Em relação à cooperação entre os hospitais da Região e a Unidade de Saúde de Ilha, o que é que ainda é preciso fazer para que haja uma maior integração e articulação de cada um, de modo a melhorar os cuidados?
O senhor secretário fez uma reunião com os conselhos de administração, para otimizarmos os recursos humanos. Isso é importante, porque é necessário haver uma coesão, como um puzzle.
Mas quem já fez puzzles sabe que, muitas vezes, se se levantar as peças, a coesão deixa de existir e é preciso colar. Os hospitais precisam de ter essa coesão e só pode ser feita com a interoperabilidade dos vários sistemas, tanto dos cuidados primários de saúde, e ao nível hospitalar. Penso que, no próximo ano, com o PRR e a transformação digital…
Este é um projeto com décadas. É desta vez que será concretizado?
Tenho a certeza de que vai acontecer, porque é necessário. Estamos um pouco atrasados, mas é necessário dar este salto. Para este hospital, com as tecnologias, nós podemos ser uma hub central, não só para outros hospitais, no sentido da telemedicina e telemonitorização. Para outros hospitais, onde haja escassez de recursos humanos, na área dos cuidados intensivos, temos um projeto muito interessante da União Europeia que vai ser uma mais-valia… Para as unidades de saúde que não tenham médico, a telemonitorização permite em tempo real ter todos os parâmetros para tomar decisões, associadas a uma inteligência artificial que nos consegue projetar no futuro e sugerir algumas medidas. E, permite a hospitalização domiciliária.
Quando é que será possível a hospitalização domiciliária?
No próximo ano. Temos recursos humanos, está pensado um projeto onde queremos investir, vamos investir…
O hospital esteve sem sistema informático e internet durante cerca de dois meses e meio. Que ameaça é que foi? Justificou, de facto, esta paragem total?
O incidente informático não foi invenção. Ele existiu… Mas conseguimos manter a atividade assistencial. O hospital não parou e isso deveu-se aos colaboradores. O ‘blackout’ foi necessário e ainda bem que foi feito. Estamos a criar uma nova estrutura, rede, para criar robustez num dos pilares – a informática – para toda a inovação e tecnologias que sem um suporte forte não funcionam. E estou certa que daqui a um ano, já haverá mudanças.
Há um outro problema crónico do hospital que é a sobrecarga do internamento com casos sociais, criando por vezes dificuldades no internamento de doentes. Há alguma solução para este problema?
O hospital é para tratar situações agudas. E este é um problema que passa de administração em administração. Temos feito várias reuniões com o ISSA, e, numa das últimas que fizemos com o senhor secretário e com a USISM, conseguiu-se uma articulação. Uns são casos sociais, outros necessitam de cuidados continuados, e serão absorvidos pela USISM. No plano de outono/ inverno que discutimos a reunião, pretendemos funcionar em fole, ou seja, ter enfermarias para doentes agudos respiratórios, enfermaria para manter a recuperação da lista de espera, e, de acordo com as necessidades iremos abrindo ou fechando mais enfermarias. Temos todas as semanas cinco ou seis pessoas referenciadas, e da mesma forma ficam outros cinco ou seis. E este plano é essencial para evitarmos as imagens que vemos a nível nacional, com macas pelos corredores, Urgências em rutura.
Da mesma forma, estamos a terminar os pavilhões verde e azul, para as situações não graves e que poderiam ser solucionadas nos SAU, de forma ao hospital ficar com as situações prioritárias (laranja e amarela).
Nós detetamos os problemas e procuramos soluções que podem não ser as situações ideais, mas somos um conselho de administração de ação.
(Texto: Paula Gouveia – Foto: Eduardo Resendes – Açoriano Oriental de 07/11/2021)
May be an image of one or more people, people standing and text that says "Entrevista Cristina Fraga PRESIDENTE DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO 0HOSPITAL DO DIVINO ESPÍRITO SANTO "A nossa prioridade é aumentar a atividade assistencial" PÁGINAS6,7E8"
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    Pierre Sousa Lima

    Excelente entrevista da Dra. Cristina Fraga que, demonstrando conhecer bem os “cantos à casa”, propôs-se realizar uma gestão profissionalizada do HDES como há muitos anos se mostrava necessária e, naturalmente, agora incomóda uns quantos que já se julgavam os donos das suas “capelinhas” (leia-se serviços) naquela unidade de saúde, que se encontrava praticamente em auto-gestão.
    Por experiência própria conheço bem as consequências da mudança empresarial e os incómodos que inicialmente traz a alguns profissionais de topo, no caso médicos, que parecem esquecer serem pagos com o dinheiro dos contribuintes / utentes e que, como qualquer empresa, seja ela pública ou privada, tem por primeiro objectivo servir os seus “clientes” e os interesses da comunidade em que se insere.
    Sinceros votos dos maiores sucessos à Dra. Cristina Fraga e toda a sua equipa de gestão.
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      Fátima Silva

      Pierre Sousa Lima faço tuas as minhas palavras. Grande vontade da dra. Cristina Fraga e sua equipa de mudança sempre com a grande preocupação dos utentes. Somos nós os sofredores, somos nós que merecemos o melhor do nosso hospital.

      Parabéns

      Dr. Cristi…

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