Views: 1
̧̃ ̧:
̀ ̃ ́
A crise da habitação que se vive nos Açores, com especial gravidade em ilhas como São Miguel, tornou-se um dos principais entraves ao desenvolvimento harmonioso e à fixação de população jovem e ativa no arquipélago. A dificuldade de acesso a uma habitação condigna, a preços acessíveis, não é hoje apenas um problema social. É, cada vez mais, um problema económico, demográfico e político.
Apesar de existir uma consciência generalizada da gravidade da situação, a verdade é que pouco ou nada se tem conseguido traduzir em ações concretas que possam fazer a diferença. A razão não está apenas na falta de recursos. Pelo contrário, há terrenos disponíveis, projetos de loteamento aprovados, iniciativas privadas com vontade de colaborar e até zonas urbanas com potencial de crescimento. O problema está na estrutura pesada e descoordenada do próprio sistema.
As entidades públicas, nomeadamente o Governo Regional e os municípios, vivem presas a uma teia legislativa e procedimental que herdaram do pós-25 de Abril. Este quadro legal, concebido com a intenção de garantir transparência e igualdade, tornou-se hoje num autêntico emaranhado que inibe a acção. Governos e câmaras reconhecem a urgência, mas sentem-se amarrados por normas que dificultam qualquer parceria direta com empresas privadas. A construção de habitação social, por exemplo, exige processos longos, concursos complexos e uma burocracia que frequentemente desincentiva os próprios investidores.
Curiosamente, sempre que a iniciativa parte de cooperativas de habitação, os entraves parecem desaparecer como por magia. Este desequilíbrio revela uma falha de fundo: o sistema beneficia modelos formais e rígidos, mas penaliza propostas inovadoras e diretas. Quando uma empresa detentora de terrenos e com projeto pronto pretende avançar com um plano de habitação acessível, os obstáculos são tantos que o mais provável é o projeto morrer na gaveta.
Ainda mais contraditório é o facto de continuarem a ser canalizados apoios públicos para setores como o alojamento local, onde o mercado já se encontra maduro e, em muitos casos, saturado. Em vez de reorientar esses apoios para o setor habitacional de longo prazo, que é onde reside a verdadeira necessidade, o Estado continua a alimentar dinâmicas que agravam o problema.
O que falta, portanto, não são meios nem vontade. Falta um enquadramento legal que permita ao Governo Regional e às autarquias trabalhar lado a lado com promotores sérios e qualificados, estabelecendo contratos de desenvolvimento para habitação que combinem celeridade com escrutínio público. O atual sistema, pensado para outra época, já não serve a realidade presente. A mudança legislativa é essencial e urgente.
Importa ainda reconhecer que este é um problema transversal e não apenas técnico. Trata-se de uma escolha política. A falta de habitação acessível compromete o futuro da Região Autónoma dos Açores. Impede o regresso de emigrantes, bloqueia a fixação de jovens, agrava desigualdades sociais e dificulta o crescimento sustentável da economia local.
A mensagem é clara. Se queremos resolver o problema da habitação nos Açores, temos de começar por libertar quem está disposto a construir. Isso implica confiar mais, rever as leis, simplificar procedimentos e, sobretudo, tomar decisões que permitam ao poder público agir com a agilidade que esta crise exige.
Num momento em que tantos querem contribuir para a solução, não podemos continuar a ser reféns de um sistema que transforma cada boa ideia numa causa perdida.
Boa noite e uma abraços do amigo,
Deixe um comentário