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- a mudança de hora, 20.10.2025
esta e as anteriores crónicas estão em https://www.lusofonias.net/mais/as-ana-chronicas-acorianas.html
No último fim de semana de outubro mudou a hora, pelas 01:00 passamos a estar na meia-noite o que me desagrada assim como a muita gente que preferia estar sempre na hora de verão, mas a proposta da EU é precisamente o oposto, passarmos a ter a hora de Inverno todo o ano – porque é o que está mais de acordo com a dinâmica da exposição solar terrestre.
Como escrevia Ana Oliveira (Letras Lavadas e Publiçor) nesta data: “Os jornalistas sabem que o povo só lê o título, e agora está na moda nem sequer pôr subtítulo para contextualizar – contribuindo ainda mais para a ignorância das pessoas. Tudo em favor do tão maravilhoso «click-bait». O problema é que ninguém clica e fica ignorante. E o facto de só trazerem à baila este tópico quando a mudança da hora é do Verão para o Inverno, infere-se que este tipo de iniciativas é para acabar com o horário de Inverno. Só que não é, é para acabar com ele. É por estas e por outras que tenho vergonha de ter tirado o curso de Jornalismo. O lixo em que se tornou esta profissão.”
Tudo começou em 1916, durante a I Guerra Mundial, quando obrigaram à mudança da hora com o intuito de poupar carvão (combustível) usado na iluminação. Os primeiros países foram a Alemanha e a Áustria, mas rapidamente outros, nomeadamente Portugal, fizeram o mesmo. Nessa época houve uma poupança de energia. Em língua inglesa a hora de verão é conhecida como “Daylight Savings Time”, que se pode traduzir como “tempo de poupança de luz do dia”.
Os efeitos de atrasar e adiantar a hora: no outono, no dia anterior à mudança, quem sai para trabalhar pelas 07:30 levanta-se de noite, com o Sol a pôr-se às 18:30. Em compensação, no dia seguinte, às 07:30 é dia, e o Sol põe-se às 17:30. Na primavera o efeito é oposto. Mas se o objetivo é aproveitar a iluminação do Sol, só funciona para países a latitudes médias. Como o eixo de rotação da Terra é inclinado, perto do equador, a duração do dia muda pouco ao longo do ano, pelo que não há necessidade de mudança. Em Svalbard, Noruega, latitude 80º N, desde abril até agosto, o Sol nunca se põe, e desde o novembro até fevereiro, o Sol nunca nasce! Adiantar ou atrasar a hora torna-se, assim, inútil. Por isso, só nas latitudes médias, nem demasiado perto do equador, nem dos polos é que a hora de verão significa uma “poupança de luz do dia”.
Em 1996, a União Europeia decidiu padronizar a hora de verão entre os Estados (exceções: Islândia e Rússia). A convenção é avançar os relógios 60 minutos do último domingo de março e voltar a atrasá-los 60 minutos do último domingo de outubro. Em 2018, o Parlamento Europeu lançou um inquérito para determinar se os cidadãos preferiam manter ou terminar com a mudança de hora. A maioria dos votos foi a favor de acabar com a mudança da hora, mas só 0,85% dos Europeus votaram, dos quais 70% eram alemães. O voto alemão é compreensível: no dia do solstício de verão, Berlim tem mais duas horas de luz do dia do que Lisboa, enquanto no solstício de inverno, o dia dura menos duas horas do que na capital portuguesa, com o Sol a nascer às 8h15 e a pôr-se antes das 16h00. Assim se explica que, na Alemanha, a mudança é irrelevante em termos de aproveitamento de luz solar.
Baseado nos resultados do inquérito, em 2019 o Parlamento Europeu votou para terminar a mudança da hora, em 2021. No entanto, o Conselho da UE exigiu um estudo do impacto detalhado que o fim da mudança acarretaria, ainda por elaborar. Há variadíssimos estudos que analisam o impacto no consumo de energia, número de acidentes rodoviários, perturbações do ciclo circadiano (o nosso relógio biológico), impacto na economia e o simples bem-estar da população. Destes, uns apontam para vantagens em manter a mudança (por exº, sair para a Escola de noite, no pico do inverno, aumenta a hipótese de atropelamento das crianças), outros mostram vantagens em manter a mesma hora todo o ano (o stress da mudança pode ser nocivo para a saúde de imunodeprimidos ou com doenças de sono) e outros afirmam não haver qualquer diferença entre manter ou não a mudança (como o relatório do Laboratório Nacional de Energia e Geologia, que analisa o impacto da mudança da hora na penetração da geração de energia renovável no consumo).
Em Portugal, a Comissão Permanente da Hora é o órgão consultivo da República, para “estudar, propor e fazer cumprir as medidas de natureza científica e regulamentar ligadas ao regime de hora legal e aos problemas da hora científica”. Em 2018, a comissão elaborou um parecer e concluiu que “nenhuma das hipóteses é boa solução, sendo a UTC+1 a pior delas”. Manter UTC+1 corresponderia a manter permanentemente a hora de verão, algo semelhante ao que aconteceu entre 1992 e 1996, durante o Governo de Cavaco Silva, quando Portugal adotou o fuso horário CET (Central European Time), o mesmo que o resto da Europa. Nessa altura, no pico do inverno, o Sol nascia por volta das 9h00. No entanto, em 2021, um conjunto de peritos assinou a Declaração de Barcelona sobre Políticas do Tempo, sustentando que se deve acabar com a mudança, pois “não tem efeitos significativos na poupança energética, nem melhora a saúde, economia, segurança e meio ambiente”.
Na Região, a mudança ocorre pelo Decreto Legislativo Regional 6/96/M. Como pessoa da quarta idade, cada vez simpatizo menos com a mudança de hora. Em novo gostava da mudança invernal para dormir mais uma hora, não sinto nenhuma vantagem, antes pelo contrário. A alteração no ritmo circadiano afeta-me, e demoro semanas infindas a ajustar-me. No inverno acordo à hora habitual e não me deito uma hora mais cedo como devia. Para mim, isto é um negócio que favorece as companhias de eletricidade, pois são menos as pessoas e as horas em que se liga a luz de manhã comparadas com mais pessoas e mais horas de luz ligada no fim do dia.
Resultado: maior consumo de energia e quem disser o contrário mente. Como país carneirento ninguém protesta, todos fazem o que mandam e mudam os relógios duas vezes ao ano, esqueceram-se de avisar os animais que são as maiores vítimas da mudança de hora para alterarem o relógio biológico.
O Governo espanhol vai propor à EU, ainda este ano de 2025, o fim definitivo da mudança da hora na Europa. No inverno de 1992 para 1993, o governo de Cavaco Silva decidiu não mudar a hora em outubro, mantendo o horário de verão durante todo o inverno. A ideia era alinhar Portugal com o horário da Europa Central (como França e Alemanha) e avaliar os efeitos na economia e na produtividade. No entanto, a medida foi muito impopular: os dias amanheciam demasiado tarde (em alguns sítios, só havia luz natural perto das 9h da manhã), o que causou muitas queixas, sobretudo no norte e interior do país.
Por isso, em 1993, Portugal voltou ao regime habitual de mudança de hora — GMT no inverno e GMT+1 no verão. A malta reclama do horário de inverno (pois o horário de inverno o ano todo é deprimente, é um facto sem controvérsia), mas obrigar os miúdos a acordar de noite e entrarem na escola de noite em dezembro pode ser puxado…claro que é melhor levar os miúdos de noite porque muitos vão com os pais e à saída muitos saem sozinhos, porque os pais estão a trabalhar e pelo menos ainda é de dia. Para quem diz que as crianças entram ou saem de noite da escola, que no horário de inverno, “fica de noite” ainda mais cedo, lembrem-se de que só os estamos a preparar para o futuro, quando tiverem de trabalhar, pois irão ter horários que os vão obrigar a tal situação. Mas não somos nós que decidimos.
Noutra área há quem se recorde afetiva e emocionalmente desta cena. Como eu nunca o fiz, nem achava qualquer piada na época, agora, em idade avançada, também me chateava profundamente quando a miudagem aqui da Lomba o fazia, em especial quando saía da catequese (aqui ao lado da casa). Irritava-me sem entender qual o gozo das crianças fazerem isso, mas deve ser defeito meu e da minha infância reprimida.