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A história vai repetir-se? Casamento entre PS e CDS nos Açores só durou um ano
O PS agarra o leme da governação açoriana há 24 anos graças a um acordo de incidência parlamentar com o CDS-PP, firmado depois das regionais de 1996. Depois do rendilhado eleitoral do passado domingo, à esquerda e à direita, o mar de possibilidades governativas continua em aberto.
A resposta: uma grande gargalhada. A pergunta do Expresso: como foi o acordo de 1996 com o PS? José António Monjardino tinha 34 anos quando deu a mão a Carlos César. O socialista tinha acabado de conquistar mais votos, mas não mais mandatos que o PSD, à data, com 20 anos de poder na governação dos Açores. O PS tinha rompido o ciclo laranja em número de votos mas com um empate técnico no número de mandatos: PS conseguira eleger 24 deputados, PSD outros 24, o CDS-PP conquistara três lugares e PCP/PEV apenas um. “Na noite eleitoral desse ano [1996], na sede do partido em Ponta Delgada, ficámos logo com a noção clara de que qualquer solução de governação que se arranjasse tinha de passar por uma conversa connosco”, conta o antigo presidente do CDS-PP/Açores.
Mas ao contrário do que seria ideologicamente expectável, ou não, o CDS vira costas ao PSD e abraça o PS. “O Carlos César e eu falámos logo e não tínhamos nada para dizer um ao outro por razões óbvias. Estávamos ideologicamente muito longe mas, na altura, o PSD governava os Açores há duas décadas. As pessoas estavam fartas, já ninguém tolerava aquilo”, conta José António Monjardino.
O gestor de empresas, natural da ilha Terceira mas atualmente a viver no Porto, diz que os sociais democratas se auto-excluíram de um entendimento com os centristas. “Não havia vontade, a única pessoa que nos falou no assunto foi o Reis Leite três dias depois. O PSD na altura era muito diferente”, recorda.
DESENTENDIMENTO DEIXA CAIR ACORDO
Sobre a conversa que teve com o líder socialista, que desbloqueou o acordo parlamentar entre socialistas e centristas, António Monjardino descose-se pouco. A condição do CDS-PP era clara: viabilizar orçamento a orçamento, com cedências do lado dos socialistas. “O governo era muito mais pequeno, combinamos determinados aspetos que tinham de ser aprovados. Respeitavam-se os poderes e contrariavam-se as intervenções do Governo, sobretudo nas obras públicas, como forma de angariar votos, um clássico que ainda hoje se mantém”, sublinha o antigo presidente do CDS-PP/Açores.
O entendimento entre os dois partidos, em espectros opostos não foi fácil, mas só se revelou impossível no segundo orçamento, quando caiu por terra o acordo parlamentar que teve apenas um ano de vida. “O PS deixou de precisar de nós porque o PSD resolveu abster-se e o PS governou o resto da legislatura com essa condição. Passámos a irrelevantes”, sublinha Monjardino sem explicar o que esteve na base do divórcio. O centrista, ainda militante do partido, mas fora do cenário político ativo, diz que há apenas um aspecto que lhe enche os olhos: “Se há diferenças de IRC e IRS nas regiões autónomas, tivemos alguma coisa a ver com o assunto e é das poucas coisas de que me orgulho do tempo em que estive na política, pelo menos devolvi a quem me elegeu o custo que nós tínhamos.”
REPRESENTANTE DA REPÚBLICA VAI OUVIR PARTIDOS
Sobre os possíveis caminhos de governação abertos pelos resultados das regionais do passado domingo, José António Monjardino volta a nova gargalhada e não arrisca casamentos. Quanto mais não seja porque também a ele foram propostos várias possibilidades. “Tive a possibilidade de ir para o Governo ou para a presidência de uma empresa pública mas nunca entrei nisso”, recorda.
Quem também não o faz, do alto dos seus 93 anos, é Alberto Sampaio da Nóvoa. Ao Expresso, o antigo ministro da República, cargo que corresponde atualmente ao de representante da República, entre 1997 e 1993, diz que “os cenários estão todos em aberto e agora é muito mais complicado, naquela altura eram só quatro partidos”.
Sampaio da Nóvoa não apanhou por pouco o PS e o CDS juntos no parlamento mas teve de gerir, em 98, a crise do primeiro governo de Carlos César. Escreveu sobre isso no seu primeiro livro, “Açores, uma íntima ligação”, lançado no mês passado. “O que escrevo no livro não chegou a concretizar-se efetivamente, que era o CDS, que tinha sido apoiante do PS, passar a ser apoiante do PSD que ficava com maioria parlamentar”, conta o antigo ministro da República. A crise começou em fevereiro de 98 e durou até novembro, “tive várias reuniões com os partidos e tudo foi amplamente discutido nos jornais”, lembra.
24 anos depois está nas mãos do representante da República, Pedro Catarino, nomear o próximo presidente do Governo regional depois de ouvir os oito partidos com assento parlamentar na região.
O PS perdeu a maioria absoluta pela primeira vez em 20 anos. Em termos absolutos, a direita ocupa mais de metade dos lugares no parlamento. Com quem vai contar o próximo presidente do executivo dos Açores? Ninguém sabe.
O Expresso contactou o PS Açores para falar sobre o acordo de 96 com o CDS. Fonte do partido declinou qualquer entrevista até estar concluído o processo de negociação que os socialistas mantêm em curso.
(Sara Sousa Oliveira – Expresso de 27/10/2020)

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