Views: 0
Aqui vai, AMIGOS, a crónica deste sábado:
Acerca das palavras XLI – por excesso ou por e defeito
Caríssimos leitores, já notaram que a nossa língua, qual tudo o que existe sob e sobre a terra, é feita de pormenores? Já li algures, ou inventei, que o pormenor é o dedo de Deus – nisso creio, pelo menos se aplicado à língua e ao seu uso. Quando eu era menina, tempos idos, faziam-se jogos de palavras em que, dependendo da pontuação, o valor das frases mudava. Era uma forma lúdica de nos ensinar que pequenos, para alguns irrisórios, elementos linguísticos têm muitíssimo relevo na comunicação e que a tudo devemos estar atentos, a fim de não fazermos passar mensagens defeituosas.
Ocorreu-me, por estes dias, que, por entre os inúmeros pecados cometidos contra o nosso belo idioma, há aqueles que são pecados por excesso e aqueles que o são por defeito – isto é, há quem acrescente elementos completamente desnecessários ao discurso, e esses configuram erros, e há outros que sonegam elementos às frases, e isso também configura erro. Parece(-me) que o justo equilíbrio no falar e no escrever, ou seja, a correção do discurso é muito difícil de encontrar – a razão não a sei exatamente, mas, como já escrevi em crónica, isso deve-se, muito provavelmente, a erróneas aprendizagens, vindas dos mais tenros anos, as quais conformam a chamada gramática implícita, esta que tem a força do uso e que só muito dificilmente é transformável pelo ensino formal.
Ora, entre os pormenores que são usados por excesso e também por defeito, destacarei, primeiramente, os respeitantes às preposições. As preposições são – ou não – requeridas em determinadas situações discursivas, coisa que está a ser difícil de compreender por muito utentes da nossa língua. Assim, há muito quem acrescente preposições desnecessárias e erradas às freses, surgindo algumas como estas: “Eu costumo a ver televisão.”, “Tu devias de comer menos.” Credo, digo eu, que faz aquele “a” na primeira frase? Que faz aquele “de” na segunda? A preposição por excesso, vinda sei lá de onde, é medonha, erro crasso e, pelo que fui notando, irremediável, ai. Por outro lado, há também muito quem se “esqueça” das preposições exigidas, como se pode notar nas frases que se seguem: “Esta é a praia que eu tenho saudades.”, “Este é a terra que eu gosto” Jesus, digo eu. É que “saudades” exige a preposição “de” (ter saudades de alguém ou de alguma coisa) e “gostar” também (gostar de alguém ou de alguma coisa), portanto a exclusão da preposição configura erro, sendo as frases corretas as seguintes: “Esta é a praia de que tenho saudades.”, “Esta é a terra de que eu gosto.”
Outro pormenor que surge por excesso e por defeito é a vírgula, sinal de pontuação tão necessário e tão subtil e tão maltratado. Vejo escritas frase como esta: “A casa, que eu vi, era linda.” Parece correta, não parece? Mas não está, e isso porque as vírgulas, aqui, não deviam ter sido usadas, e isso dado a segunda oração (que eu vi) não ser subordinada adjetiva relativa explicativa, mas subordinada adjetiva relativa restritiva, pequena diferença que indica ser a dita oração um modificador restritivo de “casa”, pois, de facto, restringe-a, diz que a pessoa viu aquela casa, não outra. Nos antípodas, surgem imensíssimas frases onde as necessárias vírgulas estão ausentes. Neste caso, o pior dos erros por defeito é a falta de vírgula a delimitar o vocativo, tal se vê, a cada passo, na rede social Facebook. E, então, é um tal de escrever coisas assim: “Beijinhos amiga.”, “Amigos
parabéns
.” Ai, digo eu, então a vírgula? O vocativo? Como já, certamente, sabeis, caríssimos leitores, as frases acima escritas carecem de vírgula: “Beijinhos, amiga.”, “Amigos,
parabéns
.”
Tentemos, leitores, leitores, não pecar contra a língua por excesso nem por defeito, usá-la no meio termo exigido, isto é, com correção.
6 comments
1 share
Like
Comment
Share