Há Cem Anos: Como Foi 1919? Porto FOI CAPITAL

O Porto foi capital, reinstaurou-se a República, a gripe espanhola dizimava o país… como foi o ano de 1919? Voltamos cem anos ao passado.

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Há Cem Anos: Como Foi 1919?

O Porto foi capital, reinstaurou-se a República, a gripe espanhola dizimava o país… como foi o ano de 1919? Voltamos cem anos ao passado.sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Por National Geographic
Vista aérea de Lisboa em 1919.

Vista aérea de Lisboa em 1919.
FOTOGRAFIA DE SERRA RIBEIRO, HEMEROTECA MUNICIPAL DE LISBOA

Há cem anos atrás, no início de 1919, Portugal vivia uma situação complicada. O país recuperava da morte de Sidónio Pais, assassinado a 14 de dezembro do ano anterior, e lutava com a devastadora gripe pneumónica. O início do ano foi conturbado, mas ao longo dos meses, a situação melhorou.

A MONARQUIA DO NORTE

Um dos acontecimentos mais marcantes do ano de 1919 foi, sem dúvida, a Monarquia do Norte. Esta contrarrevolução, ocorrida no Porto a 19 de janeiro, foi levada a cabo pelas forças opositoras da República, apoiantes da Monarquia e lideradas por Paiva Couceiro.

A um mês do assassinato de Sidónio Pais, Paiva Couceiro liderou um golpe militar que visava instaurar a monarquia em todo o país. Contudo, conseguiu-o apenas no Norte, sendo o seu centro no Porto – que foi capital por 25 dias.

A Monarquia do Norte foi curta, mas dramática: a população dava vivas e estava em êxtase – depois de dois regimes falhados, o regresso da monarquia parecia uma salvação – no Porto colocavam-se bandeiras no chão para que as pessoas pisassem, e os monárquicos juravam servência ao ex-Rei D. Manuel II.

SOL DE POUCA DURA

A Junta Governativa, com sede no Porto, começou logo a legislar, tentando por tudo apagar a República. Foi substituído o hino, a moeda – voltando-se ao real – e a bandeira. O Porto passou então a ser a capital de Portugal. Os republicanos atacaram a Monarquia do Norte: começaram a 27 de janeiro por Águeda, tomando Lamego a 10 de fevereiro, Estarreja a 11, e Oliveira de Azeméis e Ovar a 12.

A guerra civil entre monárquicos e republicanos terminou com a vitória destes a 13 de fevereiro, no Porto. Diz-se que o Sargento Pimentel estava doente com gripe, mas mesmo assim se levantou para restaurar a República. Acabava, assim, a monarquia de 25 dias, e a capital voltava a ser Lisboa.

Um hospital nos Estados Unidos, em 1918, lotado de vítimas da gripe espanhola.

Um hospital nos Estados Unidos, em 1918, lotado de vítimas da gripe espanhola.
FOTOGRAFIA DE NATIONAL MUSEUM OF HEALTH AND MEDICINE

A TRAGÉDIA DA GRIPE PNEUMÓNICA

No fim da Grande Guerra, a gripe pneumónica – também chamada de Gripe Espanhola – matou milhares de pessoas. Esta foi mais fatal que a Peste Negra, sendo a maior pandemia mundial. Em Portugal a gripe chegou em maio do ano anterior, mas já dizimara centenas a meio de fevereiro. Certas zonas do país perderam 10% da população.

A tragédia era tão grande que faltava madeira para caixões, pelo que as famílias compravam os ataúdes de antemão e deixavam-nos debaixo da cama dos seus familiares convalescentes. Estima-se que desde as primeiras vítimas mortais em Vila Viçosa – trabalhadores sazonais que provavelmente trouxeram a gripe de Espanha – e até à contenção do vírus em agosto de 1919, esta pandemia tenha levado mais de 60 mil pessoas em Portugal.

GREVES, DEMISSÕES E REFORMULAÇÕES

Durante os meses seguintes à reinstituição da República, o governo sofreu muitas alterações. Ministros demitiam-se, outros tomavam posse, as greves multiplicavam-se de Norte a Sul do país. A situação era instável, e Portugal ainda sofria com a morte de Sidónio Pais. Além disso, o clima era de revolução: houve vários incêndios em instituições públicas, um deles no Terreiro do Paço, e que muitos atribuíam a mão criminosa.

Deu-se ainda o Terramoto Legislativo, em maio. Até à abertura do Parlamento, em junho, o governo legislava em “ditadura”, isto é, com as Câmaras paralisadas e através da publicação de suplementos ao Diário do Governo.

Porém, muitas mudanças aconteceram pelo verão de 1919. Assinou-se o Tratado de Paz com a Alemanha, foi reconhecida a República Portuguesa pelo Papa Bento XV, e aprovou-se o Princípio de Dissolução – faculdade conferida ao Presidente da República de dissolver o Parlamento.

António José de Almeida, sexto Presidente da República de Portugal, entre 1919 e 1923.

António José de Almeida, sexto Presidente da República de Portugal, entre 1919 e 1923.
FOTOGRAFIA DE FUNDAÇÃO MÁRIO SOARES

NOVO PRESIDENTE, ESQUECIDA A MONARQUIA

Em outubro, já depois dos tumultos das greves, António José de Almeida toma posse como Presidente da República de Portugal, a dia 5, 10 anos depois da Implantação da República. Seria o sexto Presidente da República de Portugal, entre 1919 e 1923 – o único a cumprir integralmente o seu mandato até então. Dias mais tarde, os monárquicos integralistas anunciavam que se afastavam da obediência a D. Manuel II.

O ano começou de forma bem diferente de como terminou, mas a paz aparente que se sentia não duraria muito mais. Nos anos seguintes deu-se a revolução radical que viria a ser conhecida por Noite Sangrenta e, mais tarde, o início de uma ditadura que duraria quase cinquenta anos.