JOSÉ ANTº SALCEDO, A EDUCAÇÃO

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For my Portuguese friends: Aqui fica um punhado de ideias que irei apresentar amanhã nas Jornadas de Educação, no Europarque:

– A palavra “Educar” provém de duas expressões latinas que significam trazer à superfície ou fazer emergir algo de potencial ou latente (“ducere”; “e”, para fora), e alimentar ou fazer salientar (“ducare”; “e”, para fora). Assim, educar é fazer emergir a natureza das pessoas, identificando, aproveitando e desenvolvendo talentos, completando capacidades através de processos de aprendizagem e autonomizando-as intelectualmente. No final do processo de Educação, a pessoa terá de estar autónoma em termos intelectuais.

– Este processo de autonomização intelectual passa por três etapas principais, tendo como ponto de partida comum a aprendizagem de conjuntos de ferramentas [Toolsets] que permitam à pessoa (a) planear e executar processos de seleção, aquisição, análise, processamento e compreensão de informação, construindo assim conhecimento; (b) aplicar esse conhecimento para realizar atividades profissionais envolvendo ciências, humanidades, artes, ofícios, indústria ou serviços, que lhes potencie uma vida produtiva e motivadora; e (c) comunicar com clareza a essência dessas atividades e processos.

– Educar tem por objetivo formar pessoas intelectualmente autónomas, capazes de pensar e de criar valor.

– Na avaliação da eficácia de processos de Educação, podemos afirmar que o ensino é irrelevante; o que conta é a aprendizagem.

– O modelo centralizado de Educação que existe em Portugal é necessariamente um modelo que estimula a desresponsabilização no processo de Educação de todos os intervenientes que estejam fora do Ministério, com ênfase em autarquias, escolas, professores e os próprios alunos. Tal modelo não permite formar pessoas intelectualmente autónomas pois isso iria contra a própria natureza do sistema que o modelo criou: todos os processos constituiriam forças de bloqueio.

– O sistema de Educação implementado em Portugal, de momento, parece ter sido pensado para justificar a existência de um número absurdo de burocratas e pedagogos residentes no Ministério da Educação em Lisboa. Ele não serve de facto quem deveria servir – os alunos, autonomizando-os e libertando-os para uma vida plena. O sistema está orientado para a formação de funcionários bem-comportados; no entanto, ele deveria produzir jovens libertos dos seus formadores, equipados com as ferramentas que sejam necessárias para construir o seu futuro, capazes de pensar e de criar valor [creative critical thinkers].

– A dependência política e até partidária a que Educação está sujeita é inadmissível. Os cargos de nomeação política deveriam estar limitados à função de Diretor-Geral ou superior. Todos os demais cargos deveriam ser preenchidos por nomeação sob critérios estritamente técnicos e ser rigorosamente independentes e imunes em relação a partidos políticos e a eleições legislativas.

– Não podemos aceitar que Educação seja campo aberto para um qualquer Governo nomear milhares de pessoas para todo o tipo de funções no sistema, frequentemente pessoas incompetentes. Não podemos igualmente aceitar que sucessivos governos introduzam ideologias políticas nos processos e programas, como se pretendessem formatar intelectualmente gerações futuras.

– Para assegurar a dignificação da profissão de professor e a eficácia do seu exercício, apenas os candidatos manifestamente mais qualificados deverão ser admitidos. Para tal, sugiro os seguintes requisitos a cumprir por todas as pessoas que pretendam aceder à carreira de professor para trabalhar em qualquer nível do processo educativo obrigatório (1.º, 2.º e 3.º ciclos básico e secundário): (1) Licenciatura e Mestrado em áreas que vão determinar as matérias que poderá ministrar, com classificações finais que coloquem o candidato no topo 25% nacional do ano em que obteve os graus, (2) um mínimo de um ano de formação pós-mestrado cobrindo áreas como gestão escolar, processos e métodos educativos, de acordo com diretrizes nacionais a estabelecer pelo Ministério da Educação. A formação pós-mestrado deve ser ministrada por um Departamento de Ciências de Educação de uma universidade pública, não devendo existir mais do que 5 tais departamentos destes no país.

– A carreira de professor dos níveis básico e secundário deveria estar estruturada de forma similar à careira de um professor universitário, ou seja, deveria estar estruturada em alguns níveis de responsabilidade e autoridade, possivelmente 5. O primeiro nível seria de Professor Estagiário e duraria um mínimo de 2 anos. Neste nível, o vínculo laboral é temporário.

Durante o exercício das suas funções, o professor será avaliado anualmente, em termos formativos, pela escola onde trabalha. Decorridos 5 anos num determinado nível, cada professor terá de ser avaliado a nível nacional por entidade independente e de acordo com critérios estabelecidos pelo Ministério. Tendo recebido avaliações positivas a nível local e nacional, o professor poderá concorrer publicamente ao nível imediatamente superior.

– Para educar, ciências, humanidades e artes devem fazer parte integrante de todos os curricula durante todo o ensino obrigatório. Para se educar, os jovens têm igualmente de aprender a fazer, gerir e reportar projetos tal como referi no início deste texto. Pare se educar, os jovens têm de sentir a escola como essencial para a sua vida futura.

– Para educar é necessário valorizar mérito. Neste contexto, exames nacionais bem estruturados (no sentido de aferições sérias e úteis para todos) no final de cada ciclo educativo – 3º ciclo básico, 9º ano, e secundário, 12º ano – desempenham um papel essencial.

Os exames devem aferir a verificação das competências mínimas estabelecidas pelo Ministério da Educação para cada ciclo , ou seja, a eficácia da aprendizagem, assim como a forma como o sistema educativo se está a comportar. Defendo que não devem ser atribuídas classificações nestes exames, apenas um certificado de conclusão do ciclo correspondente. Desta forma, desaparece o negócio lucrativo das escolas privadas que dão elevadas classificações a alunos para facilitar o acesso às escolas superiores, frequentemente de forma irresponsável e com prejuízo do cumprimento efetivo dos programas oficiais. Assim, a responsabilidade de seleção dos alunos que pretendem seguir uma via superior, é transferida integralmente para as escolas superiores, onde sempre deveria ter estado. O Ministério da Educação não deve interferir de forma alguma nesta seleção. Se uma escola superior não receber candidatos em número minimamente aceitável, tal deveria /conduzir ao seu encerramento e não à sua subsidiação.

– Considero que as Escolas Superiores de Educação têm desempenhado um papel prejudicial ao país. A fraca qualidade da maioria dos seus alunos conduz a maus professores com frequência excessiva; a agravar, estas escolas não conseguem competir com universidades ou politécnicos no que respeita às condições de formação científica dos seus alunos, o que conduz frequentemente a professores sem as competências necessárias para exercer a sua profissão com a qualidade e responsabilidade que deveriam caracterizar sempre a sua atividade. Na sequência do exposto acima, defendo que estas escolas sejam extintas na totalidade, distribuindo os seus melhores quadros e recursos por um número reduzido de departamentos de Ciências de Educação em universidades, não mais do que 5 em todo o país.

– Assim, proponho o planeamento e a execução de um Programa de projetos-piloto que se poderia intitular “Programa 5” – 5 escolas, 5 anos, 50 milhões de euros, 500 professores e 5.000 alunos.

Neste programa, escolher-se-iam 5 escolas do interior, nenhuma delas reconhecida por ter uma posição elevada em rankings nacionais, cada uma com capacidade e condições para educar 1.000 alunos. Em cada uma dessas escolas implementar-se-ia um projeto-piloto de 5 anos para educar os seus 1.000 alunos, contratando-se um corpo autónomo de professores e de quadros técnicos que cumpram os requisitos e possam trabalhar nos termos e com a orientação estratégica que defendo neste documento. Essas pessoas teriam igualmente a responsabilidade de verificar até onde se consegue ir em termos de aprendizagem se forem cumpridos os princípios que defendo assim como outros que resultem de uma reflexão mais alargada e aprofundada.

A cada escola seria atribuído um orçamento de 10 milhões de euros para o período de 5 anos, para um total de 50 milhões de euros de custo do Programa, um custo modesto. Este Programa permitiria testar metodologias fora das caixas habituais do Ministério, e obter ensinamentos valiosos sobre a melhor forma de estender as melhores práticas a outras escolas. Estou convencido de que os resultados seriam extraordinários.