aprendizagem na AR por J A Salcedo

Views: 0

 

For my Portuguese friends: Síntese da minha manhã na Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República.

Dos 5 convidados para realizarem intervenções de 15 minutos cada, fui o primeiro a intervir. Como o texto que escrevi (11 páginas), já disponibilizado aqui no FB num post anterior e distribuído antecipadamente na AR, a minha intervenção consistiu em chamar a atenção para alguns pontos específicos, começando pela definição de “Educar” e do seu objectivo: “Formar pessoas capazes de serem autónomas na vida, o que exige terem aprendido a pensar e a criar valor.” Neste sentido, o ensino é irrelevante e o que conta é a aprendizagem.

Fiquei satisfeito pelo facto da maior parte das pessoas, ao longo da sessão, terem deixado de falar em ensino e passado a falar de aprendizagem. Referi ainda o que significa “autonomizar intelectualmente” um pessoa, ou “saber pensar”, e como isso se interliga com o conceito de responsabilidade.

De seguida, iniciei críticas a várias características do sistema de Educação tal como ele existe em Portugal, começando pelo modelo de organização, gestão e controlo, cuja centralização absurda acarreta também uma rigidez inadmissível nos programas, a questão da liberdade de escolha que não existe para pais e famílias escolherem as escolas mais convenientes para os seus filhos, a descentralização medíocre que o Ministério iniciou e que só tem complicado a vida de escolas e professores, a interferência política e partidária inadmissível nas escolhas de quadros para o sistema de Educação, a instabilidade criada pela criatividade de Ministros, e, sobretudo, o que está errado na selecção, formação e avaliação de professores, tendo referido sucintamente o que proponho. Referi ainda o que sugiro quando a exames, incluindo o acesso ao Ensino Superior. Por fim, defendi a extinção das Escolas Superiores de Educação e mencionei que no meu texto propunha um program de projectos-pilotos que poderiam achar interessante.

Propus ainda deixar de resgatar bancos mal geridos e passar a pagar decentemente aos melhores professores, como defendo, correndo com os incompetentes. O representante do Bloco de Esquerda apoia o deixar de resgatar bancos mas quer que esse dinheiro sirva para pagar a todos, competentes e incompetentes.

Houve nítidos protestos quando referi que, se o ensino obrigatório constitui um direito dos cidadãos, o ensino universitário não constitui um direito mas sim um privilégio para quem estiver para aí orientado desde que mereça e trabalhe bem. Parece que a Constituição refere que também é um direito mas eu não concordei com o entendimento dos políticos presentes. Se não merecer e/ou não trabalhar bem, um aluno não deve ser admitido ao ensino universitário ou deve ser expulso.

Pedro Duarte, Director da Microsoft, focou-se na utilização de ferramentas de IT na sala de aula, tendo referido que isto não é uma revolução tecnológica mas social. Chamou também a atenção da necessidade de formar professores no novo paradigma de já não serem eles as fontes de informação mais sim tutores dos alunos no seu processo de aprendizagem. Chamou ainda a atenção para a invasão de Inteligência Artificial.

Maria João Horta, Sub-Directora Geral da Direcção-Geral da Educação, utilizou a minha definição de Educar e salientou experiências-piloto que já estão a fazer com um certo número de escolas que têm autonomia pedagógica. No entanto, admitiu que não têm autonomia administrativa, nem financeira, nem de contratação de professores e de quadros, nem de orçamento.

José Miguel Sousa, Director da EDUFOR, focou a sua apresentação na descrição de novas salas de aula que conceberam no interior no país e que têm funcionado bem para os alunos aprenderem. Gostei muito desta apresentação e dos resultados pedagógicos descritos.

Kyriajos Koursaris focou a sua intervenção no novo paradigma dos professores, como tutores dos alunos no seu processo de aprendizagem.

Os vários representantes dos partidos políticos presentes apresentaram perspectivas sobre vários pontos, mas confesso que não retive nenhum. Fiquei com a impressão de que proferiram palavras mais de circunstância do que de substância.

A minha apreciação global:

1. Estou grato ao Alex Quintanilha, meu antigo vizinho em terras de Califórnia (ele em Berkeley, eu do outro lado da mesma baía de San Francisco, em Stanford) a organização deste evento. É importante discutir Educação com coragem e sem panelinhas nem preconceitos.
2. Embora a minha definição de Educar tenha sido adoptada pelos intervenientes, de um modo geral, a última coisa que o Estado quer é cidadãos com capacidade de pensamento crítico e a saber criar valor. Esse tipo de cidadãos, por definição livres, rapidamente acabaria com as panelas todas do Ministério da Educação e da estrutura da Administração Central. É evidente que o politicamente correcto é uma arma poderosa de defesa e de manipulação para o Estado. Isto não invalida, claro está, que pessoas no Estado pensem e actuem de forma diferente e esclarecida. Simplesmente, não mandam ao ponto que deveriam mandar pelo que o seu alcance é restrito.
3. Os políticos rejeitaram a minha sugestão de que as universidade deveriam seleccionar os alunos que pretendem admitir com inteira liberdade e responsabilidade. Horror! Isso criaria universidades de primeira e de segunda. Eu referi que neste momento as universidade são todas de segunda, pelo que apenas teríamos a ganhar.
4. As pessoas aceitaram a ideia de que é preciso separar a conclusão do 12º ano de uma possível entrada na universidade. Perceberam que o actual sistema é imbecil e injusto para quem não pretende seguir a via universitária, ou seja, a maior parte dos alunos.
5. Ninguém quis discutir a reforma do Estado – em matéria de Educação – como proponho no meu texto e abordei na minha apresentação. Parece haver a consciência de que é impossível alterar seja o que for dada a importância dos sindicatos e os interesses dos partidos políticos.

A minha conclusão:

1. Gostei de ter participado no evento e agradeço a oportunidade.
2. Quem está no Estado procura – na melhor das hipóteses – fazer o que pode mas não consegue ser disruptivo – ou prefere não ser. De referir, no entanto, que muitos dos esforços em curso têm imenso mérito, embora alcance limitado.
3. Nada de substantivo vai mudar em Educação nos próximos anos, por duas razões: (1) Incompetência e parolice do Ministério da Educação, dominado por burocratas e especialistas de Ciências de Educação que se acham o centro do Universo, e (2) O Ministério da Educação prefere formar uma geração de funcionários bem comportados do que de pensadores críticos e criativos, pois caso contrário ficaria ameaçado de morte.
4. Muitas pessoas precisam de levar forte e feio nas orelhas, pois estão a condicionar o futuro do país.