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FORTALEZA DE SÃO JOÃO BAPTISTA DE AJUDÁ
Ouidah, Atlantique – Benin
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Ouidah, Atlantique – Benin
A “Fortaleza de São João Baptista de Ajudá”, também referida como “Feitoria de Ajudá” ou simplesmente “Ajudá”, localiza-se na cidade de Ouidah, no Benim, na costa ocidental da África.
São João Baptista d’Ajuda foi um pequeno enclave colonial português com cerca de 4,5 quilómetros quadrados, constituído por uma feitoria e os seus arredores, onde a autoridade era exercida pelo feitor. Constituiu-se no menor território colonial do mundo. (“The Guinness Book of Records“. London: Guinness Superlatives Limited, 1958; S. 81: “The smallest colony in the world is the Portuguese enclave in the French West African Territory of Dahomey consisting of the Fort of St. John the Baptist (S. Joao Batista de Ajuda). This has been occupied since 1680 and is garrisoned by one officer and a few men.”)
História
As costas da Mina e a da Guiné foram percorridas por navegadores portugueses desde o século XV, que, com o tempo, aí passaram a desenvolver importante comércio, principalmente de escravos africanos. É desse período que data a ascensão do antigo reino de Daomé e a importância de sua capital, Abomei (ou Abomé).
Ao final do século XVIII, Pedro II de Portugal (1667-1705) determinou ao Governador de São Tomé e Príncipe, Jacinto de Figueiredo e Abreu, erguer uma fortificação na povoação de Ouidah, para proteger os embarques de escravos (1680 ou 1681). Esta foi construída após a povoação que existia no local ter sido arrasada, por ordem do rei de Ajudá, “(…) fazendo trabalhar mais de 50 vassalos seus com mando a todos que dentro de três dias ficou tudo demolido e desentulhado“. (“Documentos dos Arquivos Portugueses que Importam ao Brasil”, 1946, nrs. 12‐14). Posteriormente abandonado em data incerta, foi sucedido entre 1721 e 1730 por uma nova estrutura, com as obras a cargo do comerciante brasileiro de escravos José de Torres. Sob a invocação de São João Baptista, a construção do forte de Ouidah (Ajudá) foi financiada por capitais levantados pelos comerciantes da capitania da Bahia, mediante a cobrança de um imposto sobre os escravos africanos desembarcados na cidade do Salvador.
Concluído, funcionou como centro comercial para a região, trocando tabaco, búzios e aguardente brasileiros, e mais tarde, quando o esquema do tráfico se alterou, oferecendo produtos manufaturados europeus, contrabandeados do Estado do Brasil, uma vez que a Coroa portuguesa não permitia que tais itens fossem transportados em navios provenientes daquela sua colónia americana. A sua importância era atestada pelo fato de o português ser a única língua estrangeira autorizada pelos reis do Daomé.
Em janeiro de 1722 o pirata Bartholomew Roberts (“Black Bart“) penetrou no seu porto e apresou todas as onze embarcações ali fundeadas.
Encontra-se representada em planta pelo engenheiro militar José António Caldas (“Planta do Forte de S. Joam de Ajudá q’ está situado huma legua pela terra dentro no dominio de El Rei da Homé, cujas canhoneiras sam maneira de portinhólas de navio. Copiada por Joze Antonio Caldas em 15 de Ag.to de 1759.”), que acerca de Ajudá referiu:
“Este porto de Ajudá he avultado em negocio de escravos e mais frequentado de todas as nasoens que navegão para aquela Costa. Nele há tres Fortalezas, a saber Ingleza, Franceza e Portugueza distantes da praia hua legua e por esta razão sugeitas aos insultos do Rei da Homé. Corre a costa a Lesnordeste surgese no dito porto em nove brasas, fundo de lama” (CALDAS, 1951:490)
Com a proibição do tráfico de escravos no Império Britânico (Ato contra o Comércio de Escravos, 1807) e, posteriormente, a abolição da escravatura no Império Português (lei de 25 de fevereiro de 1869), a fortificação começou a perder importância.
Em 1844 ao Governador da Província de São Tomé e Príncipe, José Maria Marques “(…) pesou-lhe como a bom português, que aquele forte estivesse abandonado, e mandou um oficial para comandá-lo e um presbítero para administrá-lo na parte espiritual.” (MENDONÇA, João de. ”Colónias e Possessões Portuguesas’‘. Lisboa, 1877.)
Entre 1858 e 1861 foi abandonado pelos portugueses, vindo a ser cedido pelo soberano do Daomé a missionários franceses que o ocuparam entre 1861 e 1865.
O forte foi reocupado por Portugal em 1865, subordinado à autoridade do governador do arquipélago de São Tomé e Príncipe. Neste momento serviu como base para uma breve tentativa portuguesa para estabelecer um protetorado no reino do Daomé, do qual a cidade de Hweda (Ajudá – Ouidah) foi parte (1885–1887).
O Daomé foi conquistado por forças francesas (1891–1894). No final do século XIX a costa ocidental africana foi ocupada pelos ingleses, que ali estabeleceram importantes entrepostos, que passaram a ser defendidos pelas guarnições das fortificações antes pertencentes a Portugal, entre as quais a de São João Baptista de Ajudá.
Em 1911, após a Proclamação da República Portuguesa, o novo governo mandou retirar permanentemente a guarnição militar destacada para o forte de São João Baptista, substituindo-a pela presença de dois funcionários coloniais. De acordo com os dados do Censo de 1921, havia no enclave, nomeadamente na fortaleza, cinco habitantes.
O Daomé tornou-se uma colónia francesa a partir de 1892, obtendo independência em 1 de agosto de 1960, quando se transformou em República do Benim. No ano seguinte, tropas do Benim invadiram Ouidah, então uma dependência da colónia portuguesa de São Tomé e Príncipe, intimando os ocupantes portugueses do forte (à época, apenas dois) a abandoná-lo até 31 de julho do mesmo ano. Sem condições para oferecer resistência, o governo de Oliveira Salazar ordenou aos últimos residentes da praça que a incendiasse antes de a abandonar, o que foi cumprido na data-limite.
Em 1965 foi promovido o encerramento simbólico do forte pelas autoridades do Daomé, vindo as suas dependências a sediar o Museu de História de Ouidah, sob administração da República do Benim (1967).
A anexação só viria a ser formalmente reconhecida por Portugal após a Revolução dos Cravos (1974), tendo os trabalhos de recuperação e restauro sido desenvolvidos em 1987, com orientação e recursos da Fundação Calouste Gulbenkian.
A grande descendência deixada por um dos feitores da fortaleza no século XIX, Francisco Félix de Souza, inspirou um romance do escritor britânico Bruce Chatwin. Espalhados atualmente por toda a África, os De Souza têm dado várias figuras de destaque ao Benim. Uma das grandes avenidas de Cotonou, a capital económica, chama-se Avenida Monsenhor De Souza.
Características
Exemplar de arquitetura militar, abaluartado, implantado numa espécie de plataforma que aproveita uma pequena elevação, sobranceiro ao caminho que se dirige à praia, a cerca de 3 quilómetros, após os obstáculos das formações lagunares paralelas à linha de costa.
De pequenas dimensões, apresenta planta quadrada com baluartes de planta circular nos vértices e muros de barro cozido. Em seu interior, ao centro do terrapleno, ergue-se uma edificação de dois pavimentos, onde se situavam a capela e os quartéis.
Bibliografia
AKINJOGBIN, I.A., Dahomey and its Neighbours 1708-1818, Cambridge (Cambridge University Press) 1967, passim.
CALDAS, José António. “Notícia Geral de toda esta capitania da Bahia desde o seu descobrimento até o presente anno de 1759”. Salvador: Tipografia Beneditina, 1951.
CANTO, Vital de Bettencourt Vasconcellos Corte Real do.. Descripção historica, topographica e ethnographica do districto de S. João Baptista d’Ajudá et do reino de Dahomé na costa da Mina. Lisboa, Typ. Universal, 1869.
CHATWIN, Bruce. The Viceroy of Ouidah (1980). (romance)
MENDONÇA, João de. Colónias e Possessões Portuguesas. Lisboa, 1877.
TAVARES, António José Chrystêllo. São João Baptista de Ajudá face ao conflito Franco-Daomeano de 1892. Ancara: s.e., 1998.
VERGER, Pierre, Le fort St Jean-Baptiste d’Ajuda, Porto Novo (Imprimerie nationale) 1966. Reeks: Mémoire de l’Institut de recherches appliquées du Dahomey, nr.1. (Gedigitaliseerd 2011).
VERGER, Pierre, “Le fort portugais de Ouidah première partie” in: Études dahoméens, n.s., n.d., 4 (1965), pp.5-50; “deuxième partie” in: Études dahoméens, n.s., n.d., 5 (1965), pp. 5-50; “troisième partie” in: Études dahoméens, n.s., n.d., 6-7 (1966), pp. 5-46.
Crónica de viagem: “Ajudá”, onde Salazar mandou incendiar o forte de S. João Baptista
Nova Portugalidade
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Ajudá: a última feitoria
Situada na costa da Mina – actual República do Benim (ex-Daomé) – o lugar era conhecido pelos portugueses desde finais do século XV, que ali demandavam ouro e marfim, mas só no último quartel do século XVII, por força da perda do rosário de feitorias entretanto tomadas pelos holandeses na região, se decidiu Lisboa ali erigir um forte e uma feitoria que passou doravante a possessão da Coroa, tomando o nome de São João Baptista de Ajudá.
Constava a feitoria de uma casa grande de dois andares cercada por um pano de muralha artilhada e de uma vala de protecção. Um feitor, um capitão de ordenanças, um almoxarife e um escrivão respondiam perante o governador de S. Tomé e Príncipe. Em torno da feitoria cresceu e prosperou uma população mestiça que realizou uma curiosa mescla racial, cultural e linguística luso-africana que, de tão impressiva, deixou um crioulo afeiçoado e persistente, bem como vestígios vocabulares ainda hoje em uso na língua Fon do Benim, tais como bastão, moço, piloto, capitão, padre e escrivão. As relações entre as autoridades portuguesas e o vizinho Reino do Daomé eram a todos os títulos amigáveis, conhecendo um momento alto na primeira metade do século XIX quando o Rei Ghezo do Daomé, que ostentava um superlativo título de Guelélé, Manhosé, Quini, Quini, Quini (Senhor poderoso e sem igual, três vezes leão), nomeou um português do Brasil seu Xaxá (conselheiro). O célebre Francisco de Sousa Félix de Sousa acumulou uma fortuna imensa no tráfico negreiro, tendo deixado imensa prole servida por mais de doze mil escravos. Grande protector de portugueses e brasileiros atirados para aquelas plagas desoladas, o aventureiro português deixou como sucessor Isidoro, rapaz crescido e educado na Inglaterra.
Esquecida e longe das preocupações de Lisboa, Ajudá manteve-se portuguesa até 1960. Por ocasião da independência do Daomé – que fora colónia e depois província francesa – São João Baptista foi reclamada pela nova república africana. Lisboa ordenou então ao residente português que a abandonasse sem oferecer resistência, conquanto só o fizesse após atear fogo às instalações. Nos anos 80 do século XX, São João Baptista de Ajudá foi reconstruída pela Fundação Gulbenkian e abriga desde então um museu.
MCB