o grande sismo de 1522

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OPINIÃO de Victor-Hugo Forjaz ,Catedrático de Vulcanologia

DE 1522 A 2016


1 – Os povoadores destas ilhas começaram pela ilha de Stª Maria e depois passaram para a ilha de S.Miguel e seguintes. Não creio que tenham decorrido 12 anos entre aquela e esta ,tal a visibilidade e a curiosidade aventureira desses heróicos desbravadores .E creio ainda,como o afirmam credíveis historiadores, que as seguintes,da Terceira ao Faial,foram circundadas logo a eito e ocupadas conforme as gentes disponíveis , mas rapidamente .
2 – Os povoadores não estranharam Stª Maria porque ali encontraram e começaram a explorar terrenos semelhantes aos de Lisboa, ou seja — calcários com e sem fósseis , argilas e margas plásticas , basaltos anegrados , rijos , como os de Belém e tufos basálticos como os das quintas de Benfica . Em S.Miguel já encontraram ,além dos basaltos e dos tufos avermelhados , outras rochas , bem diferentes, como as importadas da Itália, as pedra-pomes em camadas sobrepostas e as obsidianas ( que chamaram de atabonas) de vidro negro . Nas Furnas descobriram águas quentes e lamas ferventes tais como as de Chaves,no norte de Portugal , onde já se costumava cozinhar carnes e vegetais em sacos grosseiros . E as lamas para doenças da pele também já eram usadas em termas romanas da Ibéria .
3 – Porém á conquista dos novos territórios , embora sem animais perigosos, somaram -se alguns medos , ou seja , as rijas tempestades mas principalmente ….o tremer repentino do chão ! ! Os sismos , os terramotos , raros na terra-mãe . E esse temor pelos horríveis sismos perdurou pelos séculos adiante , até ao presente .E vai prosseguir , independentemente da classe social , da instrução e das aprendizagerns dos que aqui habitam …. Porque se trata de fatalidade freudiana mas também porque os poderes políticos e religiosos não compreendem nem querem compreender as vantagens sociais e económicas de informações sismológicas entendíveis , atempadas ( a tempo ) mais simples e verdadeiras , bem alicerçadas e calmantes , capazes de fazerem regressar a população a um estado normal, destressante.
4 – Por força do destino, comecei por aprender sismologia desde 1958 ( ! ! ) com peritos como José Agostinho e Frederico Machado . Depois fui para o estrangeiro .Ler e interpretar sismogramas . Instalar sismógrafos e respectivos registos em papel , reinterpretar , discutir ,comparar , refazer ,reparar , enfim realizar tarefas banais mas esenciais .Depois , no projecto geotérmico do Vulcão do Fogo,em S.Miguel , participei na compra dos primeiros equipamentos ditos modernos, com um mastodôntico computador HP ,em 1976 , com um disparador automático e registo em banda magnética , uma novidade no País e que funcionou impecavelmente .Com o terramoto de 1.Jan.1980 , foi necessário transportar todo o material para a Terceira , semi-destruida , onde os Técnicos e meus Amigos Edgardo da Silveira , Francisco Rocha , Cassiano Marrana etc, me forneceram uma notável assistência técnica , antes da demorada vinda de equipamento frances ainda mais sofisticado, o do Dr Alfred Hirn . Foram naturalmente corrigidas as localizações norte-americanas dos focos sismogénicos ; pois as informações provinham de equipamentos a milhares de km de distancia.Durante semanas seguimos as migrações dos sismos e respectivas consequencias . Na radio difundiam-se comunicados que eram quase conversas diárias com a população — ainda vive gente que se lembra ….Tais contactos elucidavam os governantes e deram imenso ânimo aos heroicos reconstrutores. Acelerou-se a concretização do Serviço Regional de Protecção Civil . E tudo evoluiu para que se constituisse uma rede de vigilância sísmica dos grupos central e oriental dos Açores .Pelo caminho surgiram mirambolantes guerras , fui removido sem dó ou consideração …. e actualmente existem 2 redes sismográficas — uma , regional , da Universidade mas paga pelo Governo da Região e outra nacional ,do IPMA sustentada por Lisboa (IPMA). Ambas encontram-se bem equipadas e ambas são necessárias embora funcionem seguindo gestões cientifico-administrativas diferentes . Oxalá um dia sejam complementares , portanto convenientemente colocadas quer no terreno quer no alcance das respectivas interpretações geológicas .
5 – Passam-se hoje ,22 de Outubro, 494 anos sobra o cataclismo sísmico de Vila Franca . Ninguém imagina quando se repetirá . Sismos daquela magnitude não são previs´veis mas interessa estudar possíveis cenários de retorno . Em, 1522 coincidiram 5 parâmetros fatais , ou seja , 1)- a fractura geológica onde o fenómeno de gerou , 2) – a enorme energia libertada pelo evento sísmico , 3) – a profundidade onde se processou o hipocentro , 4 ) – as fortes chuvadas que saturaram as vertentes de pedra-pomes, um produto vulcânico muito instável e 5) – a rápida liquefação das inclinadas vertentes de pedra-pomes assim gerando mortíferas e vertiginosas torrentes de lamas misturadas com rochedos que tudo arrasaram á sua frente .Formou-se um tsunami , ainda mal estudado . Bem sei que cada vez se constroem edifícios em locais mais seguros e com materiais mais resistentes .Bem sei que há cada vez mais preocupações quanto á defesa das populações .Mas a modernização viária de S.Miguel também trouxe novos problemas , ou seja, alteraram-se bacias de escoamentos repentinos de águas , existem troços das Scuts que devem ser reformulados quanto a escoamentos superficiais e tenho ainda observado muito lixo , muito entulho , muitos troncos , muitos plásticos espessos de ervas ( entupidores ) em locais preocupantes ,etc, etc. As Juntas das Freguesias e a população em geral devem estar atentos e colaborarem entre si . Porque , desde 1522 até hoje , Santa Bárbara ( e o SRPC…) muitas vezes não bastam ….
————————————————————————–VHForjaz

Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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