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TEXTO DE HOMENAGEM A HELENA CHRYSTELLO
O seu desaparecimento (Dr.ª Helena Chrystello) do nosso convívio não é substituível. Aliás continuamos a dar pela sua presença através do ambiente de amizade que nos deixou nestes momentos de partilha de saberes e de preocupações culturais.
LEMBRAR A DOUTORA HELENA CHRYSTELLO
Embora me apeteça, não vou entrar numa de fazer emergir a minha profunda saudade pela minha amiga Helena Chrystello. Prefiro lembrá-la como mulher de inteligência abrangente, amante desta nossa açorianidade de especificidades únicas, senhora de generosa partilha de saberes e, sobretudo, capaz de mobilizar outras personalidades e de lhes atribuir, sem pressão de orientações de qualquer espécie, tarefas que visaram o desenvolvimento do que importa dar a conhecer coletivamente.
Ela foi, como todos sabem, a colaboradora principal dos Colóquios da Lusofonia, inspiradora e mentora dos seus conteúdos e dos seus comunicadores. Desde o primeiro Colóquio, que esteve extremamente atenta aos linguistas que se debatiam por um acordo ortográfico o mais consensual possível, pois havia propostas algo confusas nas pessoas que lecionavam a crianças, como era o caso da Professora Helena.
Após a aprovação do «acordo», ela iniciou um programa editorial que veio permitir a divulgação, de forma sucinta, por que selecionada, da produção literária de autores açorianos, organizando com outros voluntários e estudiosos e fazendo publicar antologias de ficção narrativa, nomeadamente contos e textos teatrais. Foram publicações que ficaram como que amadrinhadas por ela, sabendo, por vezes, procurar quem prefaciasse o trabalho de seleção, avalizando a obra que passava a ser pública.
Há que dizer que este trabalho – que nem sempre coincidiu com o melhor estado da sua saúde – era sempre feito no momento da sua apresentação, com grande alegria e desprendimento de pertença. O seu entusiasmo era contagiante e o seu espírito de humor também. Transformava-se, voluntariamente, como uma sombra de si mesma, mas com a boca do coração carregada das palavras certas, chamando a atenção para o que precisava, acima de tudo, ser corrigido.
A sua fragilidade física era-nos um erro de visão. Paradoxalmente, era essa fragilidade que lhe dava uma força absoluta e alegre.
Senhora de elevada cultura e erudição, Helena Chrystello supervisionou a versão francesa de Burra Preta com uma Lágrima, da autoria de Miguel Lopes. A sua revisão, além de me ter proporcionado uma aproximação ao tradutor, deu para usufruir da amizade que me dedicava.
Acrescento que a sua formação académica fê-la desenvolver, profissionalmente, o cargo de Coordenadora do Departamento de Línguas na Escola Básica 2,3 da Maia – S. Miguel. Durante vários anos dedicou-se ao estudo e divulgação de autores açorianos, tendo preparado alguns desses trabalhos em parceria com Maria do Rosário Girão, Professora Associada do Departamento de Estudos Românicos do Instituto de Letras e Ciências Humanas da Universidade do Minho.
Esta referência a parcerias pretende também mostrar a humildade de Helena Chrystello, que apreciava grata a colaboração de outras pessoas nos trabalhos que realizava e aos quais quis emprestar olhares diferentes.
Lugar-comum será afirmar que Helena Chrystello tem feito muita falta não só na preparação e realização dos Colóquios da Lusofonia, como na divulgação da escrita açoriana, nomeadamente, na ficção narrativa. Ela tinha uma forma muito pessoal de incentivar os autores, não os untando com euforias descabidas mas adjetivando assertivamente cada trabalho. Os frequentadores dos Colóquios da Lusofonia sempre encontraram palavras de estímulo e de apreço. O seu desaparecimento do nosso convívio não é substituível. Continuamos a dar pela sua presença através do ambiente de amizade que nos deixou nestes momentos de partilha de saberes e de preocupações culturais.
Na verdade, gostaria muito de lhe falar e de ouvir as suas respostas sobre este momento de largo e taciturno silêncio cultural, que não mostra desenho, nem objetivos e que nos encerra atrás de muralhas inexpressivas, sem portas que conduzam ao dia de amanhã. Estamos literalmente a atravessar o deserto, embora ainda se consigam encontrar alguns brevíssimos oásis.
Com a Helena podíamos, com certeza, dar abrigo e divulgação ao nosso pecúlio cultural. A Professora Helena não deixaria de apaziguar esta minha inconsolável inatividade. E, com o seu sorriso sereno e sincero, dir-me-ia que amanhã poderá ser ainda um dia surpreendente. Ela tinha sempre aberta a janela da esperança.
Não vou dizer saudade, embora me apeteça.
Raminho, maio de 2024
Álamo Oliveira
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