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O banco do Antero
Fui conhecendo Antero à medida que crescia. Ouvia falar nele. E começou a formar-se na minha imaginação a figura de um poeta que se matara. Como morava na rua de SantAna ia muitas vezes para o jardim do Colégio com meus pais. E lá via o rosto do poeta e lia os poemas no monumento do Canto da Maya. Até que um dia, ao passar no Campo de São Francisco, meu pai me disse: – Foi aqui que morreu o Antero de Quental. Lá estava o banco de jardim e uma âncora com a palavra Esperança. O banco, a âncora e a palavra Esperança, formavam um conjunto que eu não entendia. Depois fui para o Liceu onde voltei a encontrar o rosto do poeta rodeado de algumas ninfas e a poesia As fadas eu creio nelas… E, finalmente, fui parar às aulas do professor Rui Galvão de Carvalho. Foi ele que, para mim, trouxe o poeta para o mundo dos vivos.
Quando ouço falar em alterações na cidade de Ponta Delgada apanho sempre um susto: O que será desta vez?
Apanho um susto porque já tantas intervenções me deram desgosto que preferia que nada tivesse sido feito, mesmo aquelas que considero boas. Eu sei que a cidade tem de crescer. Mas não era necessário que o fizesse de modo tão agressivo, de modo tão irrecuperável.
Voltando a Antero, aquele banco, a âncora a palavra Esperança, o branco da parede, o desenho da calçada, a história do sítio, são suficientes para criar um lugar com alguma misticidade. Nunca me sentei nesse banco porque seria uma espécie de profanação. É um lugar de sacrifício onde um ser humano, com uma inteligência superior, se imolou à profunda complexidade da existência. É um lugar imaculado que nada deve perturbar. Tudo o que se colocar naquele espaço só irá perturbar a inteligência emotiva que acompanha quem pensar: Foi aqui que Antero morreu.
Li várias sugestões. Algumas interessantes, todas para a glória do poeta. Todas a caracterizarem o lugar com informações para quem dele nada sabe. Quem nada sabe do lugar, se calhar, não precisa saber. Porque o Antero de Quental deve ser conhecido devagar tal como o desabrochar de uma flor.
Nota: Quando puseram a estátua da freira achei um disparate. Não pela escultura em si que não me despertou grande interesse mas, igualmente, nenhuma crítica. Só mais tarde é que soube que o seu autor foi o escultor António Duarte, o mesmo que fez o grupo escultórico do Palácio da Justiça.
Agora que a estátua foi removida, não sei para onde, não vale a pena voltar atrás. Ela até pode ficar no Campo de São Francisco, mas em lugar criteriosamente escolhido. Ou, então, deixá-la onde está.
Quanto a essa outra de que ainda não vi nenhum retrato, e, se calhar é melhor não ver, que seja escondida nalgum recanto do convento.
UMA COISA QUE ERA IMPERIOSO RETIRAR, SE AINDA LÁ ESTIVER, É O CARICATO CANDEEIRO QUE SE ENCONTRA POR CIMA DO CONJUNTO. EM NOME DO BOM SENSO E DO BOM GOSTO. HÁ MUITA MANEIRA DE ILUMINAR O LUGAR DESDE QUE NÃO VENHAM COM AS LUZINHAS NO CHÃO QUE PODEM TER GRANDE EFEITO NOUTROS SÍTIOS MAS NAQUELE NÃO.
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