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rónica publicada no Diário dos Açores de hoje – 20-07-2019
O acelerado plano inclinado da SATA
1. A ultraperiferia é um conceito resultante do centralismo, mas não faz parte do vocabulário dos residentes periféricos.
Para estes a expressão mais vulgarmente usada é :”estamos para aqui abandonados!” Isolados no mundo da Ilha, vizinhos da ilha em frente que, mal clareia o dia, lhes entra pela porta dentro e os acompanha até que a noite fecha.
Nesse horizonte próximo o mar é a estrada aberta à viagem, por vezes sem retorno.
A emigração não aconteceu por causa da periferia, mas devido aos erros e desmandos do centralismo de dentro e de fora.
Durante anos, a economia liberal convenceu as sociedades desenvolvidas que só as centralidades urbanas e industriais promoviam a riqueza porque atraíam gente e, quanto mais gente houvesse, maior era a distribuição da riqueza e do bem-estar.
O resultado foi uma desertificação alarmante que afeta a segurança e o meio ambiente, e acentua as desigualdades e a pobreza num círculo vicioso imparável.
Contra esta quase fatalidade, milhares de açorianos de zonas e ilhas periféricas, afetados pelas centralidades, decidiram procurar vida noutros continentes, consideradas terras do fim do mundo, cujo paradeiro dificilmente se encontraria.
A História da emigração é uma saga resultante da pobreza que ficou para trás e de muitas narrativas pessoais bem sucedidas e pouco conhecidas.
Os que continuaram ou regressaram à ilha tomaram, entretanto, consciência de que a periferia ganhou estatuto que desacredita o desalmado centralismo atrofiante.
É por isso que reclamam, normalmente em surdina, por terem consciência de que o seu poder reivindicativo nada pode fazer contra o domínio de forças políticas, económicas e sociais organizadas, que contam com fortes apoios dos poderes instituídos.
Sempre a lei do mais forte a imperar contra os fracos e periféricos.
2. Um dos problemas que mais afeta a periferia é a mobilidade. Sem ela a ilha fica asfixiada em pouca terra e num mar imenso e profundo que engole sonhos e afunda distâncias.
É por isso que nas “ilhas de baixo” se protesta contra o serviço da SATA, empresa de serviço público de transporte aéreo que tem por incumbência disponibilizar partidas e chegadas em tempo útil, a quem reside na ilha e a quem pretende visitá-la.
A SATA é um agente económico de primordial importância para a criação de riqueza e fixação das pessoas.
Do seu desempenho depende a vida de milhares de pessoas, nomeadamente na época alta do turismo.
Pouco ou nada sei sobre aviação, mas isso não me impede de pronunciar-me sobre o serviço que a Transportadora Aérea Açoriana desenvolve.
Em meu entender, não concebo como é que a Azores Airlines, com uma frota reduzida, se compromete a realizar uma série de ligações para os mais diversos destinos e continentes, sem ter em conta avarias dos equipamentos e falta de pessoal para as operações aéreas.
Teria sido mais prudente, nesta época do ano, ter negociado com a TAP, maioritariamente pública, o reforço das ligações entre Ponta Delgada, Lajes e o Continente, reservando a SATA os equipamentos A 320 para as Ilhas do Triângulo que necessitam de mais ligações com Lisboa para satisfazer a procura crescente.
Assim não entendeu a Administração da empresa, com a anuência da tutela, e os resultados estão à vista.
Aqui no Pico, qualquer cancelamento da Azores Airlines, seja para o Pico, seja para o Faial, causa enormes transtornos aos passageiros e envolve avultados prejuízos para a SATA que todos nós, contribuintes, teremos de pagar.
Se a estas situações recorrentes juntarmos o que se passou na ligação entre Boston e Ponta Delgada com a retenção, por vários dias, de centenas de passageiros, temos de convir que não é só o nome da SATA que se degrada, mas é também o destino Açores e a própria credibilidade do Governo Regional.
A situação na SATA está a prejudicar a economia, os cidadãos das ilhas onde é o único meio de transporte aéreo e a credibilidade do sistema autonómico. Por que não intervém o Presidente da República com a sua magistratura de influência, para se encontrar uma solução nacional?
Essa solução poderia passar pela associação entre a SATA e a TAP, numa complementaridade de serviço público que importa implementar e salvaguardar.
Num plano inclinado, bastante acelerado em que se movimenta aquela empresa, haja quem pare o descalabro e lhe dê um novo rumo.
É o que mais desejam os açorianos.
José Gabriel Ávila
jornalista c.p. 239 A
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