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Há algum tempo comprei, num determinado estabelecimento comercial, um relógio de pulso. Tentando explicar ao vendedor o tipo de objecto que me interessava, fui dizendo que de facto não pretendia um relógio Omega (sinónimo de grande qualidade e preço elevado) mas apenas algo que fosse funcional, modesto e de preço módico. De modo muito delicado, usando um tom de voz baixo e suave – decerto no receio de algum melindre – o jovem corrigiu-me: Ómega, minha senhora. Também temos.
Como além de ser provavelmente a única professora de ciências exactas viva (pelo menos nos círculos em que me movimento) que pronuncia nanometro ao invés de nanómetro – e não chego ao extremo de dizer “quilometro” porque ninguém me entenderia, evidentemente; isto muito embora todos entendam “quilograma” e não digam quilógrama – também devo ser das poucas pessoas, nos mesmos círculos, que pronuncia omega e não ómega.
Não aprendi grego, disciplina que no meu tempo já não se considerava como fazendo parte das aprendizagens essenciais que todo o aluno português deveria realizar, nem sequer latim, ambas as línguas fazendo bastante faltinha a um bom domínio do próprio e materno idioma – mas cheguei mais ou menos por conta própria, e por ter tido um pai que muitas e muitas vezes me mandou ir procurar assuntos às gramáticas e dicionários em vez de me dar papinhas feitas, a conhecer o alfabeto grego, bem como algumas palavras e estruturas frásicas simples. E foi assim que aprendi que no dito alfabeto existem dois “os”: um “o” breve, de curta duração pois, chamado omicrón (O, o), Ὀ μικρόν, e um outro “o”, longo, o omega (Ω, ω), Ὠ μέγα, cujo nome tem o significado exacto de “o” grande, no sentido temporal. As pequenas “vírgulas” antes das vogais iniciais são os chamados espíritos fracos, que não são acentos, não afectam a pronúncia nem obrigam a aspirar. Megalito (que alguns também pronunciarão megálito) e megalómano, e até o tão conhecido nos dias de hoje megabyte que nem português é (ainda) mas se percebe perfeitamente, apresentam o mesmo mega, como prefixo, sempre com o significado de “grande”.
Lá vim para casa, de relógio novo no pulso e alguma mágoa no coração, não por ter sido “corrigida” pelo vendedor nem sequer por não trazer comigo um belo relógio Omega em vez de uma cebolita que me custou vinte euros, mas sobretudo por não compreender como é que se instalam estes desacertos, e de tal maneira que enquanto estou a escrever estas linhas o próprio word, com o seu corrector automático, já me alterou a acentuação gráfica várias vezes, no omicrón retirando-a, quando eu quero exibi-la neste momento, e no omega colocando o negregado acento agudo no “o”, que não pretendo pôr, mas o programa entende que deveria.
Lá dei a voltinha às gramáticas de grego, às velhas gramáticas de meu pai, onde confirmei o atrás exposto, e também as dei na internet, onde a maior parte dos sites reza pela mesma cartilha do funcionário da relojoaria, sendo brasileiros grafando até “ômega”, e somente num encontrei tratar-se de palavra paroxítona, omega pois, tal como aprendi.
Vem algum mal ao mundo por se dizer ómega, nanómetro, megálito, leucémia, glicémia e mais umas pérolas assim? Sim, vem, pois revela a superficialidade do nosso ensino.
E aos meus apreciados colegas, professores de grego, latim e português, peço desde já perdão por este meter de foice em seara alheia.
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Maria Antónia Fraga
No entanto já fui proprietária de um belo relógio Omega, que comprei com o meu primeiro ordenado (juntamente com outros objectos muito desejados, como por exemplo o meu primeiro gravador de som. Belos tempos!)
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