LUÍS AGUIAR-CONRARIA REFUTA MIGUEL SOUSA TAVARES

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Luís Aguiar-Conraria responde ao artigo de Miguel Sousa Tavares, no Expresso da semana passada.
Na última edição, Miguel Sousa Tavares dedicou a sua coluna às reivindicações dos professores. Deteve-se nos 6 anos, 6 meses e 23 dias de serviço que permanecem por contar e deu voz a muitos portugueses ao dizer que essa reivindicação não faz sentido porque o Estado português foi à falência e porque, na comparação com outros sectores de atividade, os professores não foram particularmente prejudicados.
Sousa Tavares comete alguns erros de pormenor, como dizer que os professores não sofreram cortes salariais — não só sofreram como os cortes foram reforçados com a perda dos subsídios de férias e de Natal, posteriormente consideradas inconstitucionais, mas nunca devolvidos —, ou falar em contagem retroativa do tempo de serviço — não é o caso, exige-se a contagem integral, mas apenas com implicações para o futuro —, mas a sua questão é ética. Argumenta que há um problema de equidade com os restantes funcionários públicos, que também viram as suas carreiras congeladas e não as recuperaram — o que é verdade para algumas carreiras especiais, mas não para a carreira geral, que teve o seu tempo de serviço reposto. Apesar das imprecisões, é verdade que outras classes profissionais sofreram bem mais. Houve quem fosse parar ao desemprego e nunca recuperasse o salário anterior, quem emigrasse, quem fosse à falência, etc. A haver indemnizações, argumenta, estes teriam bem mais direito a elas.
Repor o tempo de serviço dos professores terá um custo anual de €330 milhões. Face ao desencontro entre procura e oferta, é uma bagatela
Entendo a indignação. E junto outra: as greves nas escolas lançaram muitas delas no caos, o que, depois dos anos de pandemia, é um crime sem perdão. São centenas de milhares de crianças com um futuro pior por causa do caos causado.
Mas, por mais questões éticas que levantemos, não se pode querer governar contra a lei da oferta e da procura. Lamento, governar contra ela é como construir aviões sem respeitar a lei da gravidade. Podemos achar pouco ético que os aviões caiam, mas, se a sua conceção e construção não respeitar a lei da gravidade, caem mesmo.
Não há professores suficientes. Há milhares de alunos sem todos os professores. A escassez agravar-se-á com as dezenas de milhares de professores que se reformarão nos próximos anos, porque são poucos os jovens inscritos em mestrados que deem acesso à profissão. Para ver a dimensão do desequilíbrio, basta olhar para a Matemática. Até ao final da década, só para o Ensino Secundário e o terceiro ciclo do Básico, é necessário contratar mais de 1500 professores. No ano passado, inscritos em mestrados que dão acesso à docência de Matemática eram 53. A procura excede não sei quantas vezes a oferta. Por mais considerações éticas e morais que se façam, um desequilíbrio destes só se corrige aumentando os preços, ou seja, os salários. É a TINA: There Is No Alternative to improving the salary conditions of teachers.
Seja porque ensinar se tornou muito desagradável por causa da burocracia absurda a que os professores estão sujeitos, ou porque não estão para ser tratados como tarefeiros nas escolas, ou porque o prestígio da profissão está nas ruas da amargura, ou seja pelo que for, a verdade é que a carreira não atrai ninguém. E precisa de atrair dezenas de milhares de novos docentes para substituir as dezenas de milhares que se reformarão.
Os professores podem estar a perder a opinião pública, permitindo a António Costa não ceder muito sem grandes custos políticos. Mas o problema ficará por resolver. Claro que há outras formas de aumentar a oferta de professores. Pode-se tornar a profissão mais agradável: resolvendo o drama dos que andam de casa às costas durante décadas ou diminuindo a burocracia a que estão sujeitos e os relatórios que têm de fazer, podendo concentrar-se no que gostam, ensinar. Pode-se modificar as qualificações necessárias, por exemplo, deixar de exigir um mestrado em educação, aceitando outros e remetendo a formação pedagógica para as escolas, talvez recuperando os estágios pedagógicos com turma atribuída, que já existiram no passado. Ou até reduzir as qualificações necessárias, o que nem seria inédito — a figura das regentes das escolas primárias foi criada para lidar com a insuficiência de professores no Estado Novo.
Com uma escassez tão grande, é, contudo, muito improvável que medidas como as descritas acima sejam suficientes. As últimas contas indicam que repor o tempo de serviço dos professores terá um custo anual de €330 milhões. Face ao atual desencontro entre procura e oferta, é uma bagatela — tanto assim é que nos Açores e na Madeira o problema está resolvido há muito. Aliás, suspeito que serão mesmo insuficientes. Para as necessidades que temos, ou investimos bem mais nas carreiras dos professores ou mais vale desistir da escola pública. Tem o seu quê de irónico que seja um Governo socialista a fazê-lo. Mas a ironia não resolve nada.
LUÍS AGUIAR-CONRARIA – Professor de Economia da Universidade do Minho
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