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À espera do livro….

**** Que raça de gente a nossa! Que afoiteza!
Ao dedicar algum tempo a uma “limpeza” de ficheiros há muito guardados e tornados inúteis, deparei com uma fotografia um tanto intrigante. Vai junto a este post. Recordei então o local onde obtivera a estranha imagem. Em data que já não sei precisar, eu e a minha mulher decidimos embarcar num cruzeiro ao Alaska na companhia dos nossos amigos Virgínia e Jorge Vieira. Entre as paragens realizadas ao longo da costa, fizemos paragem numa pequena localidade que dá pelo nome de Skagway. Talvez devido à escassez dos atractivos, um dos locais visitados foi o cemitério. Que raio de lembrança! Nas breves deambulações por entre sepulturas, e até mal impressionado com o modo descuidado como o espaço estava mantido, chamou-me a atenção uma sepultura circundada por uma balaustrada em madeira. Constatei então que ali fora sepultada Clara Amelia Patton, nascida em 1875 e falecida 29 anos depois, em 1904. Na altura, o motivo que me levou a fotografar a sepultura prende-se com o nome inscrito na placa. Clara Amelia. Para além de não ser muito frequente nos EUA o uso de dois primeiros nomes, não me saía da cabeça a ideia de que estaria em presença de um nome portuguesíssimo. Agora que tenho a fotografia junto de mim para lhe dar o destino ou arrumação achados mais adequados, sou apanhado numa fase da minha vida em que o estudo e a aprendizagem de temas envolvendo as relações entre os Açores e os EUA, que à data da fotografia (creio que em 2007) conhecia muito superficialmente, permitem aprofundar um pouco mais o que levaria uma mulher portuguesa – admissivelmente natural dos Açores ou descendente de açorianos – a findar os seus dias num lugar do fim do mundo nas terras geladas do Alaska. Para além de estudos dispersos e não muito aprofundados, não dispomos de uma verdadeira história da emigração açoriana. Todavia, quem conheça com algum detalhe a história do envolvimento de gente dos Açores na actividade baleeira dos EUA, em particular como tripulantes a bordo dos navios da frota daquele país, saberá que aqui reside a origem da emigração de gente das nossas ilhas para a América do Norte. Completada a viagem que poderia por vezes ter a duração de três ou quatro anos, muitos fixaram-se nas cidades da costa Leste. Desde finais do século XVIII ali se fixaram milhares de açorianos onde se incluem os familiares que se lhes foram juntando. Somam milhares. Importa no entanto ter em conta que muitos navios, depois de cruzarem o Atlântico, passavam o Cabo Horn e, costa acima, chegavam a S. Francisco. Ao longo do período acima referido, muitos açorianos desembarcaram neste porto, seja por anulação da sua matrícula a bordo dos navios, seja desertando. Quando em 1849 se dá a Gold Rush (1849-18559, muitas tripulações completas, incluindo os oficiais, abandonaram os navios, aliciados pela miragem do ouro. Eram os “fourty niners”que aos milhares ocuparam a Califórnia. Muitos açorianos que se haviam fixado no Leste ali chegaram também por terra atraídos pelo brilho das pepitas, e gente das ilhas emigrou directamente com destino à Califórnia. O meu bisavô paterno, António Rosa Serpa, embarcou no Faial clandestinamente e chegou à Califórnia com 15 anos de idade, no ano de 1852! No entanto é menos referida uma segunda corrida ao ouro – a Klondike Gold Rush. Foi descoberto ouro em 1896 tendo cessado em 1899, na região do Rio Yukon. E cá volto para Skagway. Estava em local estratégico para os prospectores que, idos da Califórnia, se afoitavam na penosa e longa caminhada para chegar ao Yukon e seguir para Klondike. A afluência de prospectores e dos que se lhes juntaram, terá atingido mais de 100.000. A colorir esta afluência, e dependendo das regiões, 8 a 10% seriam mulheres. Algumas chegariam com maridos, outras andariam na busca dos ditos, dado haver quem promovesse a sua ida para casar. Muitas acabariam nos “saloons”, no espectáculo e na prostituição. Num exercício meramente especulativo, as condições descritas a traços largos serão propícias a que uma qualquer Clara Amelia (açoriana ou de família dos Açores?), com um Patton adquirido antes ou depois, jovem recatada ou após ter-se tornado uma pequena bem comportada, se tenha aventurado até às costas de Skagway.
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