URBANO B LEMBRA TEXTO DE LEONARDO

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Porque gosto muito deste texto do Leonardo.
E lê-lo faz-me ainda ouvir o eco de outras vozes que por aqui passam.

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Leonardo Sousa

se a verdade não chegar por fases, há-de chegar por fezes.
há-de entrar pelo lameiro, cair nos canais do saneamento (por acidente e compromisso), escorregar pelas secreções e chegar a mar alto – dá tempo de lavar a cara antes de chegar à tona. depois, manter o ritmo, aliviar para baixo, olhar para cima. disfarçar o caso. «né, filho?»
para-para-parasite? não, não, um tentáculo que lhes toca no pé: ó diabo!
desde os bastidores submersos. terra abençoada, deixas sempre um rastro para a gruta do negócio. a uma profundidade em que nada é audível e te esguicham tinta para os olhos, manchetes, letras muito gordas a palrar. oposição, tubarões-baleia, tanto faz. alimentam-se de restos, levam os cardumes à campanha, mas ficam sempre lá ao fundo, em águas morninhas, que o que se quer é paz e sossego. e ali, nas bóias da moderação: umas caras perfeitas, que dantes até tinham alergias ao sistema, comichões muito ruidosas: que davam entrevistas em forma de borbulhas e indignação. agora agentes publicitários, até creme hidratante passam no que dizem, não vá a colheita do rendimento secar antes da época. e ainda a juventude, tão adulta, tão sensata, fazendo cálculos ao futuro e cartazes à medida – capaz, com um só nó ao pescoço, de preparar o discurso, a carreira e a forca. junta-te à juventude, filho – preferes um tacho na política ou nas artes?
plástico debaixo da terra? esgotos atolados debaixo de água? pobreza? desemprego? a cultura nas olimpíadas da esmola? tudo cocó de gaivota!
soltem os touros no aeroporto! abaixo os turistas com adn de corona e de gaivota – e sobretudo «não se fala de boca cheia», como dizia meu pai: esse mesmo que foi silenciosamente comido pelos vermes.