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Partilha-se o meu artigo de opinião publicado no jornal Diário Insular de Hoje.
A distância social e o COVID-19
Temos que recuar aos anos 20 do século passado para recuperar o Modelo Epidemiológico SIR de Kermacke e McKendrick, para termos uma ferramenta que preveja o desenvolvimento de uma epidemia numa extensa população, à semelhança do que se passa com o COVID-19. As variáveis que aí se encontram permitem-nos entender como a infeção se liga a comportamentos e atitudes dos governos e da população.
A redução da epidemia nesse modelo passa por estabelecer distâncias sociais adequadas e por outro lado tem em conta o número de pessoas que se vão tornando imunes. Isso não é válido neste momento para qualquer lado, exceto China e talvez Itália. Há quem aposte nas duas vertentes, equilibrando o número de infetados com o aumento do resguardo social. A diminuição da taxa de contactos sociais entre indivíduos ocorre normalmente aos fins de semana, onde as famílias estão mais em casa do que durante a semana. No mínimo dos mínimos devemos reduzir os nossos contatos a metade do que era habitual antes desta epidemia.
Temos também que atender à distância mínima que devemos estar das outras pessoas, especialmente, quando tudo é aleatório. Essa distância mínima tem sido considerada de um metro, mas no modelo epidemiológico em análise isso corresponde a uma unidade, unidade essa que ainda não é muito clara. Assumamos então ser razoável no mínimo um metro.
A natureza dos contatos sociais é muito diferente nos diversos grupos etários: Normalmente os mais novos têm maior frequência de contactos do que os mais velhos, daí que juntar mais novos com mais velhos claramente só aumenta a taxa de contacto entre todos os elementos dos grupos.
Com o tempo, tudo isso tenderá para o equilíbrio, pois em média, todos tentarão não ser infetados, mantendo as distâncias de segurança e diminuindo os contactos sociais.
Dependendo da virulência, e neste caso o COVID-19 é mais virulento que a gripe, as regras de higiene permitem não só que um simples indivíduo não fique doente, mas pretende essencialmente que não seja agente de propagação da doença à comunidade. Não é só uma medida de proteção pessoal mas também uma medida que visa diminuir o aumento dos focos. Restringir os contactos às pessoas que se conhecem, retiram dessa equação as infeções aleatórias, que são as mais frequentes.
Havendo várias cadeias de transmissão, o isolamento profilático permite por exemplo que o marido possa acompanhar a esposa se ela ficar infetada, como se prepara para ser ajudado por ela quando ele próprio vier a ser infetado e ela curada, pois a probabilidade de tal acontecimento é mais elevada.
Controlar entradas de pessoas infetadas numa região é aconselhável só até ao momento em que não existam vários focos de infeção num determinado local. Havendo vários focos de transmissão numa comunidade, o controlo de viagens não tem qualquer efeito e o fecho de fronteiras também não, a não ser que se tente evitar contágios noutros locais fora dessa região infetada, e nesse caso é pertinente que as outras regiões não estejam também elas no mesmo grau de infeção. Isso porque até os viajantes querem manter-se em níveis máximos de segurança e reduzem os contactos sociais e aumentam inconscientemente as distâncias de segurança.
Apesar da epidemia estar a crescer em todo o lado, é facto que vai continuar a crescer, se não se mantiverem por alguma razão as distâncias de segurança e não haja uma diminuição do número de contactos. É óbvio que se isso não ocorrer naturalmente os governos vão implementar essas medidas. Os efeitos dessas medidas não se repercutem no imediato, no máximo podem ter efeitos semanas depois.
Separar grupos infetados de não infetados é sem dúvida o procedimento normal, apesar de no grupo de não infetados poderem existir infetados.
Perante o que se expôs, resulta desse modelo que se devem evitar contactos com desconhecidos, pois é aí que não há qualquer controlo de variáveis, mas isso pode implicar apenas e tão só manter-se a uma distância de segurança adequada.
Se o afastamento social implicar um aumento de contactos, esse isolamento social deverá ser evitado e continuar-se com a atividade normal. Vejamos um exemplo: Um agricultor que trabalha apenas com um funcionário durante o dia, e vice-versa, se eles ao estarem em isolamento social estão em contacto com famílias numerosas, tal isolamento não é tão eficaz como se pode pensar. Essa situação é completamente diferente de quem tem contacto permanente com o público. Quem o tem, deve exigir a distância de segurança.
Evitar ajuntamentos é manifestamente adequado, pois diminui drasticamente os contatos sociais e como tal este é um dos fatores mais importantes no controlo de uma epidemia.
O que se passa com as infeções normais onde a taxa de infeção é usualmente 1, ou seja, uma pessoa infeta uma pessoa, o número de casos cresce inevitavelmente. No caso do COVID-19 essa taxa é de 2.2, o que significa uma pessoa infeta em média duas pessoas, implica que o seu crescimento é muito mais acentuado do que vimos nas últimas pandemias.
É baseado neste modelo SIR e no seu número básico de reprodução de 2.2 que se afirma que o COVID-19 infetará 70% da sociedade. Tal cenário não acontecerá porque tal resultado não conta com os comportamentos das pessoas e dos governos, ou seja, assume que perante um cenário de infeção serão apenas algumas pessoas que começarão a assumir algumas distâncias de segurança até que praticamente toda a gente o faça numa situação de equilíbrio.Não conta com medidas políticas que poderão ser capazes de obrigar a que haja uma diminuição das taxas de contactos pessoais ou regras para as distâncias de segurança.
Após contágio, a maioria dos casos manifesta-se em 5,1 dias, mas pode de facto vir a desenvolver-se até aos 14 dias. Por questões de elevado grau de segurança, os governos decretaram a quarentena de 14 dias. Há nesses valores, no primeiro caso, um certo conforto psicológico( 5,1 dias) e no segundo, um pragmatismo importante (14 dias).
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