Views: 0
Sou um universitário. Mas se há coisa deveras alarmante, hoje, na universidade, é ela ter renunciado completamente à sua natureza e missão, para se dobrar à ideologia da época, uma ideologia empresarial e comercial.
A universidade nasceu, entre os séculos XI e XIII, como a casa do pensamento. Por essa razão, lhe foram cometidas tarefas de investigação e ensino.
Já no nosso tempo, pediu-se à universidade que passasse a incluir na sua missão uma ligação à comunidade.
Depois disso, falou-se na necessidade de uma ligação da universidade às empresas.
Hoje, uma universidade deve ser uma empresa.
Através das tecnologias da informação, as bolsas financeiras foram colocadas em conexão – e foi assim que se criou o mercado global.
Mas, logo se deu mais um passo, porque o próprio mercado acabou por se converter na metáfora a que ficou sujeita toda a vida humana. De facto as tecnologias da informação não param de nos mobilizar, total e infinitamente, para uma qualquer competição e estatística, e um qualquer ranking, empreendedorismo e websummit.
E engana-se, redondamente, quem pensa que o neoliberalismo é uma teoria que se cinge a ordenar, com mão de ferro, as políticas económicas e financeiras. Muito mais do que isso, o neoliberalismo é um modo de vida, que captura, em permanência, toda a existência humana.
Com a mobilização tecnológica, deixámos o regime da palavra e do pensamento e passamos a reger-nos pelos números e pela medida. Mas sem pensamento, o humano deixou de ter fundamento seguro, território conhecido e identidade estável.
Deixando, entretanto, de contar com o pensamento, a universidade está hoje por conta de procedimentos, de matriz tecnológica, que no ensino e na investigação certificam meras rotinas e conformidades.
É sobre os regimes empresariais da “qualidade”, aplicados na universidade ao ensino e à investigação, que escrevi hoje uma crónica no Correio do Minho.
Penso que se a universidade não souber derrotar este regime, não vai sobreviver. A missão da universidade é a da salvaguarda das possibilidades da (a)ventura do pensamento. Cabe-lhe fazer do ensino e da ciência uma ideia, que encarne um princípio de resistência crítica e uma força de dissidência, ambos comandados por “uma justiça do pensamento”. Tudo o resto são passos para o abismo.