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“É possível um outro mundo? Decrescimento e new green deal”
texto de Isabella Roberto publicado no jornal Vida Económica
Artigo de Opinião publicado no semanário Vida Económica
Com raízes no despertar ecologista da década de setenta (André Gorz, Ivan Illich), o decrescimento sustentável começa a conquistar o seu lugar enquanto paradigma alternativo ao crescimento económico. Mas é sobretudo com a eclosão da crise financeira em 2008 e a realização da primeira conferência internacional sobre o decrescimento sustentável, no mesmo ano, que se começa a desenhar uma primeira definição do conceito, tornando-o pertinente no contexto actual. No entanto, a superação do vigente modelo económico assim exigida levanta questões sobre justiça social e ecológica que terão consequências diferentes conforme o país pertencer ao eixo Norte ou Sul. Uma dicotomia que terá levado à criação de um sistema de indicadores de decrescimento sustentável, permitindo a sua aplicação de forma universal com base em 4 dimensões a considerar: económica, ambiental, social e subjectiva (ou felicidade média subjectiva). De todas, é sem dúvida a dimensão ambiental a que atualmente suscita maior preocupação, trazendo para a ordem do dia questões como o pico do petróleo, a acidificação dos oceanos, a erosão dos solos, a perda de biodiversidade, a escassez de água potável, as alterações climáticas… Hoje torna-se impossível esconder o quanto a atividade humana vem destruindo o equilíbrio que permite a própria vida no planeta. O que o decrescimento defende é que o factor económico não pode ser o principal vector de avaliação das nossas sociedades. Consolidar o PIB implica aumentar a produção e o consumo, ou seja, usar mais recursos e espoletar índices mais elevados de poluição. Contudo, uma economia que não cresce vai fazer depender a sua sustentabilidade de um sistema baseado em dívida, um sabor amargo que no Sul da Europa tão bem conhecemos. Dívida para crescer e para pagar mais dívida. Um veneno que com veneno mata. Desacorrentar a sociedade de um tal círculo vicioso e tóxico exige alterações de base profundas para assegurar o bem-estar das populações e, ao mesmo tempo, travar a escalada de produção e de consumo desenfreados.
O decrescimento apela a mudanças individuais, a experiências coletivas e a projetos político-sociais inovadores. O crescimento é elemento sagrado da economia capitalista. Mas para cada vez mais pessoas, nem o crescimento económico pode ser sustentável, nem o capitalismo pode ser verde. Ganha terreno a visão de um futuro em que as sociedades vivam dentro das suas possibilidades ecológicas, com economias abertas, mas localizadas, e em que os recursos sejam distribuídos mais justamente, através de formas outras de instituições democráticas e de organizações sociais que permitam às pessoas viver em comunidade e de modo frugal.
Décroissance, Postwachstum, degrowth, decrecimiento, decrescita seja em que língua for, decrescimento promete tornar-se uma das palavras-chave das próximas décadas.
Dos Estados Unidos à Europa: O Green New Deal
Com as crescentes mobilizações da Greve Climática Estudantil, algumas figuras políticas criaram o movimento por um Green New Deal como estratégia de combate à crise climática instalada e como alternativa viável à economia capitalista assente na produção e consumo ilimitados. Surgido nos EUA, em Março de 2019, o Green New Deal foi o nome dado, por uma determinada ala do partido democrata, a uma série de propostas económicas que visam travar o agravamento das alterações climáticas e das desigualdades sociais, promovendo a transição para uma economia sustentável. O seu nome tem por referência o New Deal de 1933, à época um conjunto de programas económicos aplicados pelo Presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, para combater a Grande Depressão de 1929. Atualmente, O Green New Deal pretende combinar a abordagem económica de Roosevelt com orientações de vertente ambientalista, como a implementação gradual das energias renováveis e a eficiência de recursos. A forma de alcançar estes objetivos seria o princípio do New Deal original: controlo estatal da economia de maneira a favorecer o investimento empresarial em setores como o das energias renováveis.
A proposta também já chegou à Europa, com o partido trabalhista a integrar a sua adesão e, mais recentemente, com Yanis Varoufakis a defender um Green New Deal europeu. O alerta é idêntico: as atividades económicas são cada mais impactantes no ambiente e a sua tendência para o monopólio e a busca incessante por mais lucro só aumentam a destruição do planeta. Ou seja, a configuração atual da economia capitalista é insustentável e qualquer alternativa à mesma terá que ser revolucionária. Para fazer face à crise climática é preciso produzir de acordo com as necessidades do conjunto, tendo em conta os limites do meio ambiente e não apenas o cumprimentos de critérios economicistas. Não há tempo a perder com falsas propostas, urge a transformação total do sistema: sair da sociedade de consumo para uma economia de transição pós-fóssil.
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