escravos à porta da Europa

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“Às portas da Europa”… e dentro de casa da África. Onde é que está a União Africana (UA)?

«(…) “Todos os dias chegavam homens árabes, às vezes com guarda-costas, e então nos levavam ao pátio. Ali tínhamos de nos sentar assim –Abou se senta no chão, com as pernas abertas–, em fila, cada um entre as pernas do que estava atrás. Era como um trem que formávamos no chão.” Abou retorna à sua cadeira e continua o relato: “O homem árabe passeava entre nós e escolhia alguns. Escolhia os fortes, os que não pareciam que iriam morrer em dois dias. Ele os escolhia como quando você escolhe manga no mercado de frutas. Depois pagava às pessoas do gueto e os levavam. Todo dia chegavam homens árabes para nos comprar”.
Abou foi vendido depois de dois meses. “Não sei quanto pagaram por mim. Diante de nós não falavam de dinheiro, iam negociar os preços num canto.” Abou fica em silêncio. Com o olhar perdido. Depois, diz: “O gueto de Ali é o lugar que você imagina quando te falam de um mercado de escravos”. Um mercado de escravos no século XXI, em uma cidade até há pouco tempo relativamente turística e em um país a 400 quilômetros da Europa.
O buraco líbio

Abou Bacar, nascido em Gambia, foi vendido em um mercado de escravos da cidade libia de Sabha.ALFONS RODRÍGUEZ
Antes da guerra —o conflito irrompeu no âmbito da Primavera Árabe, em 2011–, a Líbia era uma das várias rotas imigratórias em direção à Europa. As máfias optavam às vezes por transportar os imigrantes à Mauritânia e dali alcançar em caiaque as Ilhas Canárias; ou atravessar a Argélia para chegar a Marrocos e saltar a cerca de Melilla; ou cruzar a Líbia e tentar navegar em balsa até a ilha italiana de Lampedusa.
Hoje, a Líbia se perfila quase como a única rota: o caos ali é tamanho que as máfias e os traficantes de pessoas movimentam-se sem empecilhos, ao contrário das vigiadas fronteiras dos demais países. Cada vilarejo e cidade da Líbia pertence a uma milícia diferente. E nessa bagunça os imigrantes tentam se meter para cruzar o mar. Estima-se que, atualmente, cerca de 330.000 imigrantes estejam bloqueados na Líbia, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
O problema é que esta violenta anarquia tem reverso: milhares de homens e mulheres estão sendo sequestrados, aproveitando a falta de controle. Os sequestros, já há alguns meses, foram um passo além: cada vez é maior o número de escravos.

Em abril a OIM, agência vinculada às Nações Unidas, publicou um relatório no qual denunciava que na Líbia existem, há meses, mercados de escravos. Lugares em que os imigrantes são vendidos para serem usados como mão de obra, como criados ou escravos sexuais.
Giuseppe Loprete, chefe da missão da OIM no Níger, explica em seu escritório em Niamey que “os imigrantes que voltam da Líbia nos contam histórias terríveis. Falam de licitações, de leilões, de compra e venda de escravos”. Um macabro retrocesso no tempo do outro lado do Mediterrâneo. O gueto de Ali, onde Abou foi vendido, é um desses mercados.
Não se trata de sequestros em que se pede um resgate. Não se trata de condições de exploração. Não se trata de poder pagar pela sua liberdade. Trata-se de um tráfico de escravos em que moradores da Líbia compram subsaarianos para que trabalhem em suas casas, fazendas ou plantações sem salário de tipo algum –nada além de teto e comida– e sob um regime de violência.(…)»

BRASIL.ELPAIS.COM
Licitações, chicotadas e correntes. EL PAÍS mostra casos reais, como os denunciados pela ONU cada vez mais imigrantes estão sendo vendidos como escravos em mercados da Líbia

Sobre CHRYS CHRYSTELLO

Chrys Chrystello jornalista, tradutor e presidente da direção da AICL
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