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511. Nos Açores há alergia à cultura – agosto 2023
o rumo da cultura nos Açores
o rumo da cultura nos Açores
Do latim cultura, culturae, significa “ação de tratar”, “cultivar” ou “cultivar a mente e os conhecimentos”.
Originalmente, a palavra culturae originou-se a partir de outro termo latino: colere, que quer dizer “cultivar as plantas” ou “ato de plantar e desenvolver atividades agrícolas”.
Com o passar do tempo, foi feita uma analogia entre o cuidado na construção e tratamento do plantio, com o desenvolvimento das capacidades intelectuais e educacionais das pessoas.
Trata-se do conjunto de conhecimentos, valores, símbolos, tradições, ideias, costumes e práticas que se tornam caraterísticas de um grupo, seja ele familiar, social, étnico, religioso. Esse conhecimento nem sempre é formal — ninguém precisou de fazer um curso para aprender a cultura do seu próprio povo. Ela foi transmitida para as gerações seguintes no quotidiano: na conversa, nas atividades diárias, nas festas e comemorações, no exemplo das outras pessoas.
Frequentemente, a “cultura” é sinónimo de identidade. Isso ocorre em casos como o da “Kultur” de Herder, ou seja, de afirmação do modo de vida do seu povo em contraposição ao que é considerado dominante. Logo, nesse sentido a “cultura” é um motivo de orgulho e de autoestima para o grupo.
De uma forma completamente diferente do que muitos pensam, não existem pessoas com mais ou menos cultura, ou mesmo culturas inferiores ou superiores. Toda a sociedade possui um conjunto único de valores, que foi construído através da história e deve ser compreendido e respeitado.
O meu pai sempre me disse que era feio pedir ou pedinchar, mas é o que tenho andado a fazer há mais de vinte anos em nome dos Colóquios da Lusofonia, porque vivo num país de ladrões, corruptos e pessoas para quem a bola é quase o único interesse nacional e assuntos da cultura merecem sempre discursos de louvaminha sem resultados práticos financeiros..
Quando se fala de cultura, de literatura, de leitura, todos torcem o nariz dizendo umas patacoadas, na maior parte das vezes, pinoquiadas, pois nunca se editaram tantos livros e nunca houve tão poucos leitores, mesmo entre a classe dos professores, que tem uma aversão generalizada à leitura, quiçá por traumas educacionais antigos.
Nos Açores, a Direção Regional da Educação e Cultura e a Secretaria desses assuntos, debatem-se há anos neste paradigma de falar imenso sobre os apoios que dão, sem mencionarem que não têm verbas para apoiar decentemente seja o que for, se o quisessem fazer, e mesmo isso é matéria de debate.
Dos escassos meios de que dispõem têm de satisfazer clientelas várias entre os votantes e – sem dúvida – a das filarmónicas é a que tem mais votos. Livros, cinema, teatro, artes em geral ou em particular, congressos, colóquios, simpósios só mesmo os estrangeiros com nomes sonantes que para os outros são umas migalhas de centenas de euros ou pouco mais, pois, devem ser atividades elitistas com poucos votos a ganhar na distribuição eleitoral.
Apesar de termos editado livros, antologias, coletâneas, traduzido em 15 línguas autores açorianos, andarmos com eles pelas ilhas e pela Ibéria, Brasil, Galiza e Macau, musicado as suas obras, declamado os seus poemas, a Direção Regional da Cultura só não nos ignora totalmente por parecer mal.
Ainda pensei em fazer uma tourada com poesia declamada na arena, que parecia ser mais do gosto do anterior padre – diretor da cultura – que andava a ferrar touros, mas não havia praça de touros disponível na ilha de São Miguel.
Depois tivemos outro diretor que quando o conheci me augurou não dever resistir até ao verão, e premonitória fora essa declaração.
Seguiram-se meses de silêncio até que descobriram outro, que todos dizem ser um homem de cultura, para ocupar o lugar mas nos meses que já leva do cargo viu-se numa apresentação de um livro seu e pouco mais, pois deve ser tímido ou então, está envergonhado com as parcas (diria mesmo miseráveis) esmolas que prometeu distribuir em junho mas que não chegaram ainda aos profissionais da cultura… Haja paciência, o ano só acaba em dezembro e como os da cultura são uns tontos sempre adiantam uns cobres por conta…em vez de cancelarem as atividades marcadas um ano antes.
Não há dinheiro, não há cultura. Poucos sentiriam a sua falta. Muitos suspirariam satisfeitos. Há assuntos mais prementes a tratar de aviões, a barcos, a aeroportos, vacas, leite, turismo, hotéis, drogas sintéticas, e outros que ciclicamente enchem as parangonas dos jornais. Até poderiam tratar da pobreza que tanto aflige o Joel Neto ou da falta de segurança criada por drogados, delinquentes e pedintes ameaçadores que preocupam uma certa faixa política.
Dada a habitual insuficiência de verbas sugerimos sejam organizados passeios guiados às catacumbas da Direção Regional para apreciação dos projetos indeferidos, e que se excluam desde já todos os projetos que se relacionem com exposições, museus, bibliotecas, congressos e simpósios, pintura, escultura, balé, teatro, cinema, ópera, língua, linguística e literatura ou outras manifestações de cultura dita erudita. Por esse motivo, todas as ONG, associações culturais sem fins lucrativos, entidades de utilidade pública declarada e outras ficam excluídas . Os projetos selecionados serão nomeados para participarem no Orçamento Participativo da Região ou para serem plantados numa horta comunitária.
Chrys Chrystello, Jornalista,Membro Honorário Vitalício nº 297713 [Australian Journalists’ Association – MEEA]drchryschrystello@journalist.com,Diário dos Açores (desde 2018)/ Diário de Trás-os-Montes (2005)/ Tribuna das Ilhas (2019)/ Jornal LusoPress, Québec, Canadá (2020)/ Jornal do Pico (2021) |