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Mês: Janeiro 2022
a crónica de Paula De Sousa Lima
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Aqui vai, AMIGOS, a crónica deste sábado:Acerca das palavras XLI – por excesso ou por e defeitoCaríssimos leitores, já notaram que a nossa língua, qual tudo o que existe sob e sobre a terra, é feita de pormenores? Já li algures, ou inventei, que o pormenor é o dedo de Deus – nisso creio, pelo menos se aplicado à língua e ao seu uso. Quando eu era menina, tempos idos, faziam-se jogos de palavras em que, dependendo da pontuação, o valor das frases mudava. Era uma forma lúdica de nos ensinar que pequenos, para alguns irrisórios, elementos linguísticos têm muitíssimo relevo na comunicação e que a tudo devemos estar atentos, a fim de não fazermos passar mensagens defeituosas.Ocorreu-me, por estes dias, que, por entre os inúmeros pecados cometidos contra o nosso belo idioma, há aqueles que são pecados por excesso e aqueles que o são por defeito – isto é, há quem acrescente elementos completamente desnecessários ao discurso, e esses configuram erros, e há outros que sonegam elementos às frases, e isso também configura erro. Parece(-me) que o justo equilíbrio no falar e no escrever, ou seja, a correção do discurso é muito difícil de encontrar – a razão não a sei exatamente, mas, como já escrevi em crónica, isso deve-se, muito provavelmente, a erróneas aprendizagens, vindas dos mais tenros anos, as quais conformam a chamada gramática implícita, esta que tem a força do uso e que só muito dificilmente é transformável pelo ensino formal.Ora, entre os pormenores que são usados por excesso e também por defeito, destacarei, primeiramente, os respeitantes às preposições. As preposições são – ou não – requeridas em determinadas situações discursivas, coisa que está a ser difícil de compreender por muito utentes da nossa língua. Assim, há muito quem acrescente preposições desnecessárias e erradas às freses, surgindo algumas como estas: “Eu costumo a ver televisão.”, “Tu devias de comer menos.” Credo, digo eu, que faz aquele “a” na primeira frase? Que faz aquele “de” na segunda? A preposição por excesso, vinda sei lá de onde, é medonha, erro crasso e, pelo que fui notando, irremediável, ai. Por outro lado, há também muito quem se “esqueça” das preposições exigidas, como se pode notar nas frases que se seguem: “Esta é a praia que eu tenho saudades.”, “Este é a terra que eu gosto” Jesus, digo eu. É que “saudades” exige a preposição “de” (ter saudades de alguém ou de alguma coisa) e “gostar” também (gostar de alguém ou de alguma coisa), portanto a exclusão da preposição configura erro, sendo as frases corretas as seguintes: “Esta é a praia de que tenho saudades.”, “Esta é a terra de que eu gosto.”Outro pormenor que surge por excesso e por defeito é a vírgula, sinal de pontuação tão necessário e tão subtil e tão maltratado. Vejo escritas frase como esta: “A casa, que eu vi, era linda.” Parece correta, não parece? Mas não está, e isso porque as vírgulas, aqui, não deviam ter sido usadas, e isso dado a segunda oração (que eu vi) não ser subordinada adjetiva relativa explicativa, mas subordinada adjetiva relativa restritiva, pequena diferença que indica ser a dita oração um modificador restritivo de “casa”, pois, de facto, restringe-a, diz que a pessoa viu aquela casa, não outra. Nos antípodas, surgem imensíssimas frases onde as necessárias vírgulas estão ausentes. Neste caso, o pior dos erros por defeito é a falta de vírgula a delimitar o vocativo, tal se vê, a cada passo, na rede social Facebook. E, então, é um tal de escrever coisas assim: “Beijinhos amiga.”, “Amigosparabéns.” Ai, digo eu, então a vírgula? O vocativo? Como já, certamente, sabeis, caríssimos leitores, as frases acima escritas carecem de vírgula: “Beijinhos, amiga.”, “Amigos,
parabéns.”
Tentemos, leitores, leitores, não pecar contra a língua por excesso nem por defeito, usá-la no meio termo exigido, isto é, com correção.Ana Franco, Gabriela Mota Vieira and 31 others
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Francisco Madruga · AS VINHAS VELHAS DA MINHA MÃE!
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AS VINHAS VELHAS DA MINHA MÃE!
A Vida nasce todos os dias.
A Vida renova-se, preserva-se e alimenta-se no conhecimento, no estudo, na prática do quotidiano e na luta por uma sociedade mais justa.
A minha mãe foi tudo isto e o mais que eu não consigo escrever. Ele há coisas que ficam no nosso íntimo, porque a intimidade é o luto, é o beijo, o abraço, a carícia e o afagar do cabelo. O íntimo é a lágrima, a dor no peito que dói. O íntimo é a merda do Covid que nos isolou e nos privou dos afetos, do colo e do ombro.
A minha mãe nasceu num tempo em que ir à Escola era um luxo!
Não sabia ler nem escrever. Estava escarrapachado no BI “Não sabe assinar”!
Veio Abril e exigiu ser ensinada.
Abriu contas, assinou, esqueceu-se e penitenciava-se por isso.
Participou sempre na luta por uma vida melhor, para ela, para a sua família, mas fundamentalmente para os outros.
Levou ao limite os sacrifícios para dar aos filhos as condições que não teve na vida, nos estudos e na perceção de que era necessário intervir para transformar.
A minha mãe era um exemplo. Foi cinco vezes a Fátima a pé. Uma a pão e água e duas sem falar. Quando lhe perguntávamos por quem eram as promessas ela respondia:
– Prometi, mas não foi por mim!
Grande mãe que eu tive!
Quando lhe chamávamos à atenção para que não necessitava de trabalhar, ela respondia:
– Se não estamos neste mundo para trabalhar então andamos cá a fazer o quê?
Grande mãe que eu tive!
Quando tomou a peito Abril, fez-se militante, participou, influenciou, não falhava uma manif, nem um 25 de Abril ou um 1º de Maio.
Às vezes, não percebíamos se a ida era pelo convívio ou pela convicção. Invariavelmente as caminhadas paravam na Conga ou no Pedro dos Frangos.
Quando lhe perguntávamos sobre as motivações, ela respondia:
– Eu não luto por mim que não preciso, mas pelos que nada têm.
Grande mãe que eu tive!
O padre que fez a cerimónia, disse-me que conhecia muito bem a minha mãe.
– Sabe, ela era muito interventiva. Um dia, eu fazia a apologia da ajuda aos pobres e ela pediu para falar no meio da homilia. Pensei que se estivesse a sentir mal e fui junto dela. Quando lhe dei a mão ela disse-me:
– Senhor Padre, sabe onde estão os pobres? Estão ali no 5 Quinas!
O Sacristão por trás ria-se.
– Eu questionei-o o que era o 5 Quinas, ao que ele respondeu que era o café da esquina.
Mas ela não se calou, insistiu que não via na Igreja pobres e que havia pessoas que até iam de táxi buscar as esmolas.
Olhe, foi a partir daí que tivemos mais cuidado com a distribuição.
Grande mãe que eu tive!
A minha mãe ajudou muita gente. Gente que se pirava de Portugal numa fuga precipitada a caminho de novos mundos ou simplesmente para fugir à Guerra Colonial. A sua casa era o refúgio, a pensão e a escola onde o meu pai ensinava todos os que vinham fazer exame para as forças militarizadas ou para a enfermagem.
A minha mãe deu a mão a sobrinhos, primos e amigos.
Ajudava desinteressadamente, pois sabia que era fundamental as pessoas terem oportunidade de estudar e trabalhar.
Veio o Euro e a minha mãe deu-lhe a volta. Não contava pelos dedos. Tinha uma memória e um cálculo mental que fazia inveja até ao final da sua vida.
Em época de eleições, mesmo quando eu me fazia esquecido, a seguir ao almoço ela perguntava:
– Então hoje não são as eleições? Tenho que ir votar!
– É verdade. São eleições, vamos lá votar!
Vamos tratar as tuas ideias, o teu apego á Liberdade e à Justiça Social com o carinho com que tratamos as tuas vinhas velhas.
Vamos continuar a ajoelhar ao toro das parreiras para as podar com carinho. Vamos limpar-lhe as lágrimas que brotam da enxertia, vamos tratar os freixos e os carvalhos centenários que nos dão o calor e a sombra. Vamos fazer as vindimas e o vinho. Vamos roçar os valados, preservar as paredes erguidas por mãos calejadas e sábias e manter as tradições. Vamos preservar a tua casa e a tua imagem, o teu exemplo e a tua sabedoria.
Vamos contar às novas gerações as tuas histórias e tua história de vida.
Que grande mãe que tive!
Felizes dos que conheceram a minha mãe!
Um obrigado pelas vossas palavras e pela vossa amizade.
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