TRAJETÓRIAS JUDAICAS

prof ª Jane Glasman * enviou:

TRAJETÓRIAS JUDAICAS
A história do povo judeu, com suas diferentes diásporas vividas – e revividas em muitas cerimônias religiosas – é bastante conhecida. Uma dentre essas distintas trajetórias me toca de forma bastante particular, por envolver o ramo paterno da minha própria família. Refiro-me aos judeus que saíram de Jerusalém após a destruição do Primeiro Templo, há aproximadamente vinte e seis séculos, radicando-se na Península Ibérica, a Sefarad dos relatos bíblicos. Juntamente com a fé no Deus único, os judeus que se fixaram no espaço que hoje abriga Portugal e Espanha levaram para a nova terra seus costumes e tradições, com destaque para a alegria de viver e um riquíssimo acervo musical, progressivamente enriquecido com o passar dos séculos. Por intermédio de muitas de suas melodias é possível acompanhar a trajetória percorrida pelas correntes migratórias judaicas a partir de Eretz, ao tempo da conquista de Jerusalém pelas tropas de Nabucodonosor, assim co mo os dois mil anos de permanência na Península Ibérica até à expulsão de 1492 na Espanha e a conversão forçada de 1497 em Portugal. E, também, a dicotomia ocorrida entre os que puderam sair e se fixar na França, Holanda e os territórios do Império Otomano onde continuaram praticando a fé ancestral e os que precisaram ocultá-la para sobreviver durante o longo período de trevas representado pela Inquisição na Espanha, Portugal e suas colônias.
Diásporas Judaicas no Velho Mundo
HAD GADIÁ
Para ilustrar de forma sonora essa longa e tortuosa trajetória selecionamos para os leitores da Rua Judaica uma melodia do cancioneiro israelita que julgamos ser do conhecimento, se não de todos, certamente de uma expressiva maioria. Refiro-me à canção Had Gadiá, entoada durante a cerimônia familiar do Pessach, em suas versões em hebraico e ladino, assim como uma popular melodia do folclore brasileiro nela inspirada. A música começa contando o triste fim de um cabritinho que custou dois levanim, moeda corrente em algum dos diferentes períodos em que essa história, contada e cantada durante o Seder de Pessach, se passa. O cabritinho, coitado, acabou sendo devorado por um gato, apesar da desproporção de tamanho entre um e outro bicho, mas isso não vem ao caso. Gato esse que foi mordido por um cachorro que, por sua vez, foi afugentado por um pedaço de pau, que acabou queimado pelo fogo. O fogo foi apagado pela água, por sinal bebida por um boi q ue acabou sacrificado por um Sochet e assim sucessivamente, até o final que, dependendo da versão, pode ser bastante feliz ou extremamente triste. Já deu para perceber que é uma canção destinada ao entretenimento das crianças na longa celebração da Páscoa Judaica.
Seder de Pessach na Idade Média
Comecemos com a versão original, em hebraico, em um clipping que mostra um afinadíssimo coral feminino de Israel interpretar de forma magistral essa tradicional melodia. Quem assistiu ao filme Free Zone, do controvertido Diretor Amos Gitai, talvez lembre da trilha musical, cantada de forma monocórdica e intencionalmente enfadonha, que contava essa mesma história, enquanto um personagem feminino se desmanchava em lágrimas. Se fosse no Brasil poderíamos dizer que ela estava chorando a morte da bezerra. No caso do filme, o mais acertado seria afirmar que ela também chorava a morte, só que de um cabrito.
O LADINO
Após 1492 os judeus que preferiram deixar seus bens para trás a ter de abandonar a religião ancestral, foram mesclando, à medida que viajavam em busca de um porto seguro, os diferentes dialetos falados na Península Ibérica ao português, francês, italiano, grego e turco, formando o ladino, a primeira forma unificada do castelhano. Nas palavras de uma das maiores autoridade brasileira em ladino, Professora Cecilia Fonseca da Silva, os sefaradis podem ser considerados “A Espanha Itinerante”. E a canção Had Gadiá, agora conhecida como El Kavretiko, continuou a ser entoada em ladino nas cerimônias do Pessach das famílias sefaradis radicadas nos países que compunham o vasto território otomano, para deleite de adultos e crianças. A graça era ir aumentando a velocidade da interpretação, em uma espécie de desafio, para ver quem conseguia chegar até o final sem se confundir com as novas estrofes que íam sendo progressivamente agregadas às iniciais. Par a interpretar El Kavretiko ninguém melhor do que o cantor, ator e parlamentar israelense Yehoram Gaon, cuja primeira língua, o ladino, foi aprendida em casa, com os pais.
A VELHA A FIAR
Se prestarmos atenção à letra do Kavretiko é possível constatar que sete estrofes inteirinhas, sem mexer uma única vírgula nem omitir nenhum dos bichos e elementos, se encaixam como uma luva na brasileiríssima A Velha a Fiar. Pura coincidência? Claro que não. Prova inconteste de que a melodia do folclore nacional descende em linha direta do Had Gadiá – Kavretiko, com alguns pequenos e perceptíveis acréscimos, plenamente justificáveis nos tempos obscuros das perseguições religiosas. Trata-se da inclusão de animais não-kasher, como a aranha, a mosca e o rato, além da própria velha, seguramente para despistar os esbirros da inquisição. É interessante escutar atentamente a versão em português que selecionamos e constatar, pelos próprios ouvidos, a presença da milenar tradição judaica na formação da cultura popular brasileira.

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Casamansa-o crioulo

Casamansa-o crioulo, uma lingua que sintetiza o português e as culturas locais

Do contato com os portugueses do sec XV aos finais do XIX em Casamansa surgiu o crioulo, uma lingua que sintetiza o português e as culturas locais. O crioulo falado em Zinguincho,uma cidade do Senegal localiza-se no sul do país na região de Casamança, é do mesmo tipo que o de Cacheu (Guiné-Bissau, país que fica apenas a poucos km desta cidade), com alguns termos acreolizados do francês, sendo contudo intelegivel mutuamente com os crioulos guinienses e mesmo caboverdianos.

O crioulo da Casamansa provém da língua de Camões e de línguas africanas
A seguir passo o “Pai-Nosso” no crioulo de Casamansa

No Pape ki stana seu
Pa bu nomi santificadu
Pa bu renu thiga
Pa bu bontadi fasidu riba di tera suma na seu
Partinu aos pom di kada dia
Purdanu no pekadus, suma no ta purda kilas ki iara nu
ka bu disanu no kai na tentasom
Ma libranu di mal
Amen

Fonte: Dicionário temático da lusofonia, Fernando Cristóvão,Maria Helena Amorim,Maria Lucia Garcia Marques, Susana Brites Moita

coisa e coisar: PARA APRECIADORES DE QUESTÕES LINGUÍSTICAS

Demasiado importante, para ficar na gaveta!!!!

(PARA APRECIADORES DE QUESTÕES LINGUÍSTICAS)

 

Achei muito bom, procurei autoria, mas…
permanece desconhecido! Vale a pena ler !!!!!!!!

Coisa

A palavra “coisa” é um bombril do idioma. Tem mil e uma utilidades. É aquele tipo de termo-muleta ao qual a gente recorre sempre que nos faltam palavras para exprimir uma idéia. Coisas do português.

A natureza das coisas: gramaticalmente, “coisa” pode ser substantivo, adjetivo, advérbio. Também pode ser verbo: o Houaiss registra a forma “coisificar”. E no Nordeste há “coisar”: “Ô, seu coisinha, você já coisou aquela coisa que eu mandei você coisar?”.

Coisar, em Portugal, equivale ao ato sexual, lembra Josué Machado. Já as “coisas” nordestinas são sinônimas dos órgãos genitais, registra o Aurélio. “E deixava-se possuir pelo amante, que lhe beijava os pés, as coisas, os seios” (Riacho Doce, José Lins do Rego). Na Paraíba e em Pernambuco, “coisa” também é cigarro de maconha.

Em Olinda, o bloco carnavalesco Segura a Coisa tem um baseado como símbolo em seu estandarte. Alceu Valença canta: “Segura a coisa com muito cuidado / Que eu chego já.” E, como em Olinda sempre há bloco mirim equivalente ao de gente grande, há também o Segura a Coisinha.

Na literatura, a “coisa” é coisa antiga. Antiga, mas modernista: Oswald de Andrade escreveu a crônica O Coisa em 1943. A Coisa é título de romance de Stephen King. Simone de Beauvoir escreveu A Força das Coisas, e Michel Foucault, As Palavras e as Coisas.

Em Minas Gerais, todas as coisas são chamadas de trem. Menos o trem, que lá é chamado de “a coisa”. A mãe está com a filha na estação, o trem se aproxima e ela diz: “Minha filha, pega os trem que lá vem a coisa!”.

Devido lugar: “Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça (…)”. A garota de Ipanema era coisa de fechar o Rio de Janeiro.“Mas se ela voltar, se ela voltar / Que coisa linda / Que coisa louca.” Coisas de Jobim e de Vinicius, que sabiam das coisas.

Sampa também tem dessas coisas (coisa de louco!), seja quando canta “Alguma coisa acontece no meu coração”, de Caetano Veloso, ou quando vê o Show de Calouros, do Silvio Santos (que é coisa nossa).

Coisa não tem sexo: pode ser masculino ou feminino. Coisa-ruim é o capeta. Coisa boa é a Juliana Paes. Nunca vi coisa assim!

Coisa de cinema! A Coisa virou nome de filme de Hollywood, que tinha o seu Coisa no recente Quarteto Fantástico. Extraído dos quadrinhos, na TV o personagem ganhou também desenho animado, nos anos 70. E no programa Casseta e Planeta, Urgente!, Marcelo Madureira faz o personagem “Coisinha de Jesus”.

Coisa também não tem tamanho. Na boca dos exagerados, “coisa nenhuma” vira “coisíssima”. Mas a “coisa” tem história na MPB. No II Festival da Música Popular Brasileira, em 1966, estava na letra das duas vencedoras: Disparada, de Geraldo Vandré (“Prepare seu coração / Pras coisas que eu vou contar”), e A Banda, de Chico Buarque (“Pra ver a banda passar / Cantando coisas de amor”), que acabou de ser relançada num dos CDs triplos do compositor, que a Som Livre remasterizou. Naquele ano do festival, no entanto, a coisa tava preta (ou melhor, verde-oliva). E a turma da Jovem Guarda não tava nem aí com as coisas: “Coisa linda / Coisa que eu adoro”.

Cheio das coisas. As mesmas coisas, Coisa bonita, Coisas do coração, Coisas que não se esquece, Diga-me coisas bonitas, Tem coisas que a gente não tira do coração. Todas essas coisas são títulos de canções interpretadas por Roberto Carlos, o “rei” das coisas. Como ele, uma geração da MPB era preocupada com as coisas.

Para Maria Bethânia, o diminutivo de coisa é uma questão de quantidade (afinal,“são tantas coisinhas miúdas”). Já para Beth Carvalho, é de carinho e intensidade (“ô coisinha tão bonitinha do pai”). Todas as Coisas e Eu é título de CD de Gal. “Esse papo já tá qualquer coisa…Já qualquer coisa doida dentro mexe.” Essa coisa doida é uma citação da música Qualquer Coisa, de Caetano, que canta também: “Alguma coisa está fora da ordem.”

Por essas e por outras, é preciso colocar cada coisa no devido lugar. Uma coisa de cada vez, é claro, pois uma coisa é uma coisa; outra coisa é outra coisa. E tal coisa, e coisa e tal. O cheio de coisas é o indivíduo chato, pleno de não-me-toques. O cheio das coisas, por sua vez, é o sujeito estribado. Gente fina é outra coisa. Para o pobre, a coisa está sempre feia: o salário-mínimo não dá pra coisa nenhuma.

A coisa pública não funciona no Brasil. Desde os tempos de Cabral. Político quando está na oposição é uma coisa, mas, quando assume o poder, a coisa muda de figura. Quando se elege, o eleitor pensa: “Agora a coisa vai.” Coisa nenhuma! A coisa fica na mesma. Uma coisa é falar; outra é fazer. Coisa feia! O eleitor já está cheio dessas coisas!

Coisa à toa. Se você aceita qualquer coisa, logo se torna um coisa qualquer, um coisa-à-toa. Numa crítica feroz a esse estado de coisas, no poema Eu, Etiqueta, Drummond radicaliza: “Meu nome novo é coisa. Eu sou a coisa, coisamente.” E, no verso do poeta, “coisa” vira “cousa”.

Se as pessoas foram feitas para ser amadas e as coisas, para ser usadas, por que então nós amamos tanto as coisas e usamos tanto as pessoas? Bote uma coisa na cabeça: as melhores coisas da vida não são coisas. Há coisas que o dinheiro não compra: paz, saúde, alegria e outras cositas más.

Mas, “deixemos de coisa, cuidemos da vida, senão chega a morte ou coisa parecida”, cantarola Fagner em Canteiros, baseado no poema Marcha, de Cecília Meireles, uma coisa linda. Por isso, faça a coisa certa e não esqueça o grande mandamento: “amarás a Deus sobre todas as coisas”.

ENTENDEU O ESPÍRITO DA COISA????

 

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