125 anos: Autonomia, meio ou fim? SANTOS NARCISO

Views: 0

Nota de Abertura

125 anos: Autonomia, meio ou fim?
Hoje, sim, devia ser o Dia da Autonomia! Que não se pode confundir com o Dia dos Açores. Porque os Açores estão acima de qualquer regime político que escolhemos ou que nos impõem. Agora, em regime autonómico celebramos o Dia dos Açores, na Segunda-feira do Espírito Santo e que poderia até ser noutro. E se nos tornássemos independen- tes, celebraríamos à mesma o Dia dos Açores e acrescen- taríamos um outro dia. Que seria o Dia da Independência. Essencialmente porque consideramos que a Autonomia é um meio, um caminho de progresso e de afirmação e nunca um fim, como querem ver e fazer crer alguns carreiristas políticos.
E por isto mesmo, não nos cansamos de repetir a im- portância de celebrar este dia 2 de Março, como o Dia da Autonomia, um dia marcante e corolário da luta de muitos anos.
Há 125 anos, naquele 2 de Março de 1895, foi assina- do o Decreto que coroou a primeira campanha autonómica dos Açores, a que apenas não aderiu o distrito da Horta. A história está feita, nunca completa, mas suficiente para ser conhecida, ensinada e acima de tudo absorvida como factor de identidade açoriana nos tempos difíceis que vivemos.
Há cento e vinte e cinco anos houve festa, entusiasmo, povo na rua e discursos vibrantes quando chegou o Diário do Governo no 50 onde constava o Decreto que instituía as Juntas Gerais com poderes próprios de administração regio- nal. Hoje está montada uma gigantesca campanha para aca- bar com a Autonomia, tal como a conhecemos há 125 anos, com altos e baixos, mas com afirmação ímpar quando se tornou Constitucional em 1976. Até se pede a um Gabinete de Advogados de Portugal Continental que nos diga como se deve rever a Autonomia.
Os Açores correm sério perigo de se desagregar como unidade política, porque há correntes de pensamento ab- solutamente divisionistas que, a pretexto da deslocação de eixos de influência e de poder, não medem o que pode acon- tecer no futuro. A verdade histórica não pode ser torneada nem burilada. A verdade sobre os Açores é que nunca nada nos foi dado. Tudo foi conquistado. Com muita luta, com muito esforço. Com garra que hoje não existe, essencial- mente porque a política era encarada de forma bem dife- rente de hoje.
Escrevia Aristides Moreira da Mota em 1922, falando sobre as Juntas Gerais de então: “ O que sei é que das mãos de todos os novos homens que têm composto nesta ilha es- sas juntas e câmaras saiu um enorme aleijão. Um aleijão que repugna e amedronta. Está pois verificado que os no- vos homens não têm capacidade, ciência ou habilidade para modelarem a parte que lhes coube no Portugal novo. Sem que se nos meta em cabeça ressuscitar um Portugal velho, empenhemo-nos em que Portugal, velho ou novo, não seja deformado entre nós por tal arte e feitio que se torne um re- fugo de Olaria” (Correio dos Açores, 22 Setembro 1922).
A frase podia ser escrita hoje. Aos sonhadores da Auto- nomia, da unidade insular, da identidade dos Açores como Povo, marcado pelas diferenças insulares mas unido pela necessidade de progresso, sucederam-se os profissionais da política para quem a Autonomia é um modo de vida e não um instrumento de serviço. E daí que hoje tenhamos cada vez menos poder, na razão inversa da falange dos que vivem do poder e da luta pela sua eternização nos lugares onde estão.
O recrudescer dos bairrismos, a confusão entre desen- volvimento harmónico e igualitarismo primário e a ânsia de dividir para reinar, estão a minar os alicerces dos Açores.
Por isso mesmo, a melhor forma de honrar estes 125 anos de Autonomia, nos termos em que a conhecemos, será barrar a onda de destruição da nossa identidade que está em marcha nos Açores.
Santos Narciso

Atlântico Expresso
2 de março de 2029