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Bernardo Alves, Lourenço Gouveia Faria e Miguel Cymbron, alunos do 12º ano da Escola Domingos Rebelo, ficaram em segundo lugar no concurso Astro Pi – Mission Space Lab que envolveu 15 mil concorrentes de 23 países. Trata-se de um projecto escolar, organizado pela Agência Espacial Europeia (ESA) e a Fundação Raspberry Pi, e que permitiu à equipa açoriana Mag-AZ escrever um programa, que foi usado num dos computadores da Estação Espacial Internacional e executado pelos astronautas, para estudar o campo magnético terrestre. O algoritmo criado, que lhes valeu a medalha de prata no concurso, pode ser utilizado para fazer o mesmo tipo de tratamento de dados em qualquer outro planeta ou estrela do Universo.
Os três jovens acreditam que na Região “existem pessoas capazes e com conhecimento e aptidão para colocar os Açores no mapa do sector espacial” e esperam contribuir para esse fim, já que todos pretendem trabalhar no sector espacial.
Obtiveram recentemente o segundo lugar no concurso Astro Pi. Quem faz parte desta equipa?
Somos a equipa Mag-AZ, da Escola Secundária Domingos Rebelo, em Ponta Delgada. Este nome surgiu através da junção das palavras MAGnético e AZores, representando o âmbito do nosso projecto e as nossas origens.
A equipa é constituída por três membros: o Bernardo Alves de 16 anos, o Lourenço Gouveia Faria de 17 anos e o Miguel Cymbron, de 18 anos. Somos todos alunos do 12º ano. Fomos também auxiliados pelo professor Nuno Sá da Universidade dos Açores e pela professora Maria Beatriz Cachim, da nossa escola.
São alunos da Escola Secundária Domingos Rebelo. Em que contexto se inscreveram neste concurso? E porquê?
Após ter conhecimento deste concurso, através da professora Beatriz Cachim, decidimos participar. Embora as razões pelas quais decidimos participar variem individualmente, concordamos que este projecto seria uma boa experiência na área da computação, a qual não temos muitas oportunidades de desenvolver na escola. Também, não podíamos descurar e perder a possibilidade de escrever um código que pudesse ser executado numa estação espacial. É uma oportunidade única. Da mesma forma, julgamos que seria uma mais-valia na obtenção de conhecimento científico e até para o nosso currículo, enquanto estudantes finalistas do ensino secundário.
Já tinham ouvido falar deste concurso/projecto?
Na realidade, foi-nos apresentada uma lista de concursos que a Agência Espacial Europeia estava a organizar, entre os quais o CanSat e o Moon Base Challenge, mas após alguma consideração decidimos participar no projecto Astro Pi. Uma das razões para esta decisão foi o nosso interesse pelas áreas que abrangia. Os projectos da Agência Espacial Europeia são sempre cativantes e este ano o Astro Pi contou com a participação de concorrentes de 23 países (dezoito europeus e cinco de fora da Europa).
Em que consistiu esta vossa participação? O que construíram? Como construíram? Quanto tempo levou a desenvolverem o projecto?
Este projecto foi desenvolvido durante quase todo o ano lectivo (de Outubro até Junho), e foi constituído por quatro fases: desenvolvimento de uma ideia para uma experiência científica; escrita de um ou mais ficheiros em Python (linguagem de programação) com o intuito de controlar o comportamento de um dos computadores a bordo da Estação Espacial Internacional e disponibilizado para o efeito; execução do programa por parte dos astronautas na Estação Espacial Internacional; e por fim, a análise dos dados obtidos.
No nosso caso em particular, decidimos tentar descrever o campo magnético terrestre segundo alguns modelos matemáticos e, através destes, propor as localizações para os pólos magnéticos terrestres. Caso tivéssemos conclusões similares ao modelo IGRF, modelo escolhido para comparação, teríamos um possível indicador para a exactidão que os nossos métodos podem oferecer se fossem utilizados em outros corpos celestes e
com campos magnéticos. Para esta parte mais teórica, o professor Nuno Sá foi uma grande ajuda, o que fez com que conseguíssemos fazer mais em menos tempo.
Em concreto, o que faz o programa que desenvolveram?
Tendo em conta o objectivo do projecto, os ficheiros que escrevemos e programamos em Python tiveram a função de guiar o computador a bordo da Estação Espacial Internacional, e que é usado no concurso, a emitir as instruções necessárias aos sensores.
No nosso caso, recolhemos dados relativos à posição do computador e da intensidade do campo magnético ao longo das órbitas que a Estação Espacial Internacional efectuou. Para a última fase do projecto (análise de dados) criámos também dois ficheiros com o programa Wolfram Mathematica que automatizam todo o processo de criação de recursos visuais para descrever o campo magnético em estudo e cálculo essencial para outras conclusões.
Que resultados obtiveram?
Conseguimos chegar a uma descrição do campo magnético terrestre, embora sem grandes correspondências com o modelo IGRF. Já fora do âmbito do concurso, tentámos utilizar os dados de mais órbitas (disponibilizados no site do concurso) e o modelo obtido melhorou significativamente. Assim, foi concluído que o programa parece funcionar bem, sendo que quantos mais dados se obtiverem, mais exactos e concretos serão os resultados.
Que importância tem, para vocês, terem alcançado o segundo lugar com este projecto em concreto?
Surgimos na segunda posição na lista dos dez vencedores deste ano, de entre mais de 15.000 participantes, em equipa. Estar nesta posição é um grande privilégio e queremos utilizar esta vitória como uma experiência positiva que nos ajudará em projectos de maior dimensão e de maior complexidade.
Dito isto, esta conquista revela-nos que o trabalho e a persistência são o segredo do sucesso. A natureza deste desafio difere das outras competições que se encontram frequentemente ao nível do ensino básico e secundário, como as olimpíadas, onde os alunos são avaliados no percurso de algumas horas e sendo os seus únicos recursos o seu presente conhecimento e capacidades de resolução de problemas. O Astro Pi, assim como os outros desafios da ESA, obriga os participantes a aprenderem conceitos novos e, independentemente do objectivo e foco do seu projecto, a estudar material que não era esperado ser necessário para a progressão do projecto. Esta experiência pode ser vista como uma pequena simulação para aquilo que um trabalhador das áreas de STEM (ciências, tecnologias, engenharias e matemática) pode ter que passar.
Que visibilidade é que vos pode trazer? E aos Açores?
É muito gratificante o facto de a equipa por detrás do Astro Pi ter considerado o nosso projecto de grande valor científico. Isto, de facto, poderá impulsionar-nos para outros voos em termos de investigação e desenvolvimento científico no que concerne ao mundo da exploração espacial. É uma das áreas em que muito gostaríamos de trabalhar. Esta vitória serve também para demonstrar que temos muito interesse nas áreas de STEM e que tentaremos fazer o que for necessário para chegar a um objectivo em particular.
Quanto à visibilidade regional, demonstrámos, uma vez mais, que o mérito não necessita de vir das regiões mais populosas de um país. Basta haver um grupo de pessoas interessadas e determinadas para fazer um grande trabalho. E nos Açores existem pessoas capazes e com conhecimento e aptidão para colocar os Açores no mapa do sector espacial.
O programa que desenvolveram poderá ter outra aplicação? Esperam que assim seja?
Com mais testes e a generalização dos processos utilizados para as várias situações, dado que cada corpo a ser estudado terá características diferentes, julgamos que os nossos métodos poderiam ser uma possível implementação para satélites que orbitam outros planetas, estrelas, entre outros.
Seria uma forma simples de se ter algum conhecimento acerca do seu campo magnético e sem grandes recursos ao nível de componentes electrónicos – cerca de 80 euros para o conjunto Raspberry Pi + Sense Hat, isto é, computador mais placa de sensores, respectivamente.
A pandemia condicionou de alguma forma a vossa participação no concurso ou o desenvolvimento do projecto?
Embora uma das duas quarentenas a que os alunos do ensino básico e secundário passaram neste ano lectivo 2020/2021 tenha ocorrido numa altura essencial para a segunda fase do projecto, não foi o que nos impediu de trabalhar. Adaptámo-nos rapidamente a este ambiente dada a facilidade com que nos podemos comunicar online e visto que pouca parte de todo o concurso envolveu interacção com ferramentas físicas, como por exemplo o uso do próprio computador que tínhamos que programar.
Foi-nos enviada uma réplica do computador existente a bordo da Estação Espacial Internacional para podermos simular tudo em Terra antes de ir para o espaço. De resto, para termos um local mais adequado para a progressão do projecto, arranjámos, sempre que possível, uma sala/oficina para nós.
Que importância acham que tem este tipo de projecto, para jovens estudantes?
Este tipo de projecto ajuda a dar aos estudantes uma visão para o mundo das aplicações práticas. A escola em si foca-se muito na parte teórica, sendo que é esperado os alunos aplicarem o que lhes é ensinado fora do âmbito escolar (excepto aulas laboratoriais ou similares).
Esta competição, assim como as outras organizadas pela Agência Espacial Europeia, oferecem diferentes experiências e, apesar de haver sempre um objectivo base, há sempre um aspecto onde se tem de aplicar alguma criatividade e originalidade. Mesmo que o estudante interessado ainda não tenha conhecimentos nas áreas requeridas, pode muito bem arranjar uma equipa, participar na mesma e aprender ao seu ritmo. Por outro lado, é um bom exemplo do potencial da escola pública. É também o testemunho de que o empenho, motivação e paixão dos professores pelas matérias que leccionam e a autonomia das escolas podem despertar o interesse e a motivação dos alunos para temas que ultrapassam os currículos e as matérias lectivas em cada ano escolar. Neste caso em concreto, a preciosa ajuda dos professores foi também determinante para o sucesso do projecto.
Vão continuar a seguir esta área de trabalho no futuro? Na Universidade, por exemplo…
O desafio Astro Pi toca em diversas áreas, sendo a física e a computação as principais. O resto depende, em grande parte, do tipo de experiência que se vai realizar. Dito isto, este projecto tem uma forte ligação, em geral, com as engenharias devido à abrangência de conhecimentos que são necessários. As candidaturas ao ensino superior estão agora a decorrer e todos os membros da nossa equipa vão candidatar-se a cursos relacionados com as engenharias. Todos temos muito interesse em trabalhar no sector espacial, área que os desafios da Agência Espacial Europeia acabam sempre por tocar, mas é uma questão de tempo e ver que preferências teremos quando nos especializarmos nas nossas respectivas áreas.
Acham que esta será uma área que terá futuro nos Açores?
Tendo em conta que a Portugal Space foi fundada muito recentemente e vendo as ambições que esta organização tem no que toca ao sector espacial nos Açores, achamos que não existem quaisquer dúvidas em relação ao futuro do sector espacial na região. Quase garantidamente, este sector irá expandir-se, quer na vertente comercial ou de exploração científica. Os Açores poderão muito bem posicionar-se na linha da frente deste novo paradigma espacial e até civilizacional, uma vez que o sector espacial, incluindo as viagens espaciais, a exploração de novas fronteiras e até a colonização de outros planetas farão parte do novo quotidiano a médio e longo prazo.
(Carla Dias – Atlântico Expresso de 30/08/2021)




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- Parabéns aos três! Que consigo alcançar o que ambicionam.